22 Mai 2019
Na semana passada, o estuário onde a política e a religião se misturam foi dominado pelas discussões sobre o aborto (...). Hoje, gostaria de me concentrar no lançamento pelo presidente Donald Trump de uma nova abordagem à política de imigração. Um dos objetivos centrais da proposta política será implementar um sistema “baseado no mérito” para a admissão legal de imigrantes, em vez do atual sistema que prioriza os membros da família daqueles que já estão no país.
A reportagem é de Michael Sean Winters, publicada por National Catholic Reporter, 20-05-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ironicamente, Trump confiou o lançamento da política no Capitólio a um membro da sua própria família, Jared Kushner, que se reuniu com os senadores no dia 16 de maio e que os deixou com a impressão de que ele não tem nem ideia do assunto. O Washington Post citou um indivíduo “familiarizado com o encontro” que disse: “Ele está em seu próprio mundinho. Ele não deu muitos detalhes sobre o que estava em seu plano. E houve vários momentos em que as pessoas tiveram que intervir e responder a perguntas, porque ele não conseguia”. Talvez o jovem Kushner devesse voltar a fazer as pazes no Oriente Médio.
A ideia de recorrer a um sistema “baseado no mérito” que priorize os migrantes com habilidades especiais e altos níveis de instrução já é apoiada por alguns senadores republicanos da linha dura. O senador Tom Cotton, do Arkansas, David Perdue, da Geórgia, e Josh Hawley, do Missouri, apresentaram o RAISE Act no mês passado. A proposta deles também reduzia a imigração legal ao longo do tempo, algo que Trump aparentemente não quer fazer neste momento. Mas a ideia central é a mesma.
“O nosso atual sistema de imigração está quebrado e não está atendendo às necessidades da nossa economia em crescimento”, disse Perdue em um comunicado de imprensa anunciando a introdução da legislação. “Se queremos continuar sendo o líder econômico global, temos que dar as boas-vindas aos melhores e mais brilhantes de todo o mundo que desejam vir legalmente para os Estados Unidos para trabalhar e levar uma vida melhor para eles mesmos. Isso exigirá um sistema baseado em habilidades que seja pró-crescimento e pró-trabalhador. Está comprovado que o RAISE Act funciona e ainda é o único plano que responde às necessidades da nossa economia, preservando empregos de qualidade e salários para os trabalhadores norte-americanos.”
Veja, as necessidades da “economia” são mais importantes do que as necessidades de quaisquer famílias que desejem se reunir. Ou assim afirmam esses senadores “pró-família”, dois dos quais receberam 100% de avaliação positiva por parte do Family Research Council no ano passado. Hawley ainda não era senador, mas eu estaria disposto a apostar que ele receberia 100% nesta sessão.
Um dos pilares da doutrina social católica é que a família e seus direitos precedem o Estado e seus direitos. De fato, todos os quatro pilares da doutrina social católica – a dignidade humana, o bem comum, a solidariedade e a subsidiariedade – aumentam ou diminuem com base em como uma sociedade promove a vida familiar.
Não há nenhuma exigência constitucional de que uma política pública tenha coerência com o ensino moral católico, sem dúvida. Mas chamemos esse sistema “baseado no mérito” pelo que ele é: eugenia para imigrantes. Em sua iteração anterior, a eugenia tinha como objetivo evitar que aqueles que eram considerados desprovidos de “mérito” procriassem. “Três gerações de imbecis são suficientes”, trovejou o juiz Oliver Wendell Holmes Jr., da Suprema Corte, em 1927, antes que a eugenia alcançasse uma má reputação em Auschwitz.
Agora, as corporações dos EUA chegam a desempenhar o papel de decidir quem é ou não tratado com a mesma dignidade humana, que o Evangelho e a Constituição assumem como sua premissa mais básica. As corporações dos EUA dizem ao governo que tipo de trabalhadores estrangeiros elas precisam, e o governo permite que esses trabalhadores vão para o início da fila. Por que as necessidades da “economia” impessoal ou as necessidades dos titãs corporativos que se escondem atrás das teorias econômicas têm a precedência sobre os nossos valores morais?
A teologia moral cristã reconhece que as pessoas com o maior direito de voz em relação à sociedade e ao governo são aquelas em necessidade, não aquelas com habilidades especiais. Um imigrante é uma pessoa humana. O presidente e seu partido estão dizendo que a avaliação apropriada do “mérito” é uma avaliação econômica e não moral? E um filho imigrante nascituro? Ele não tem o “mérito” que a dignidade humana confere?
Os bispos dos EUA foram rápidos em publicar uma carta, assinada por quatro proeminentes presidentes de comissão, expressando sua oposição a um projeto de lei que conferiria direitos iguais aos membros da comunidade LGBT. A declaração que eles emitiram é totalmente inadequada [disponível aqui, em espanhol].
“Embora apreciemos que o presidente esteja tentando enfrentar os problemas em nosso sistema de imigração, opomo-nos às propostas que buscam reduzir a imigração baseada na família e criar um sistema de imigração em grande parte ‘baseado no mérito’”, disse o cardeal Daniel DiNardo, presidente da Conferência dos Bispos dos EUA. “As famílias são a base da nossa fé, da nossa sociedade, da nossa história e do nosso sistema de imigração. Como assinala o Papa Francisco, ‘a família é o lugar onde nos formamos como pessoas. Cada família é um tijolo que constrói a sociedade’”.
Não me lembro de eles terem reconhecido a boa-fé daqueles que apoiam a Lei da Igualdade. E, realmente, o que há para “apreciar” em relação às tentativas do presidente de “enfrentar os problemas em nosso sistema de imigração”? Afinal, ele é forte em racismo e, nesse caso, provavelmente afetará principalmente os nossos correligionários da América Central. Muitos católicos vão a Washington todo mês de janeiro para protestar contra o caso Roe vs. Wade [que reconheceu o direito ao aborto]. Eles irão a Washington em números semelhantes para protestar contra esse darwinismo social?
É até esperado esse tipo de comportamento moralmente asinino do presidente, mas eu confesso que estou surpreso que tantos membros conservadores do Congresso apoiem esse tipo de sistema de imigração “baseado no mérito”. Eles não são pessoas estúpidas. Não são pessoas imorais. São pessoas para quem um compromisso com a fé cristã e os valores que fluem dela tem sido descontroladamente distorcido pelo seu envolvimento com o Partido Republicano. Eles são igualmente uma ameaça para o que há de melhor no nosso experimento norte-americano e para aquilo que há de mais precioso sobre a nossa herança cristã. Essa adoção da eugenia para os imigrantes é apenas a mais recente evidência de como essa ameaça é grande.
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Nova política do governo Trump é eugenia contra imigrantes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU