21 Janeiro 2019
'Submissão a uma instituição não é o que distingue uma ciência. Pelo contrário, dificulta'.
Um dos principais estudiosos litúrgicos da Alemanha alertou que quaisquer tentativas do Vaticano ou da hierarquia católica de tentar "domesticar" a pesquisa teológica só vão corroer a credibilidade da Igreja.
"Principalmente nesse momento de crise de abusos, a Igreja necessita de uma teologia crítica", disse o professor Benedikt Kranemann, vice-presidente para a pesquisa na Universidade de Erfurt, na Alemanha Central.
"A submissão (Ergebenheit) a uma instituição não é o que distingue uma ciência. Pelo contrário, dificulta", disse Kranemann em entrevista publicada no dia 8 de janeiro no Süddeutsche Zeitung.
A reportagem é de Christa Pongratz-Lippitt, publicada por La Croix International, 17-01-2019. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
O leigo de 59 anos, que também é conselheiro da Conferência Episcopal alemã, disse que a teologia não deve ser "domesticada."
"Quem ignora e não aceita a liberdade da ciência, causa grandes males à Igreja", observou.
Segundo Kranemann, o reconhecimento de que a doutrina católica pode mudar deve-se ao Papa Francisco. Por exemplo, ele citou a recente revisão do Papa do Catecismo da Igreja Católica, que João Paulo II promulgou em 1992, sobre a questão da pena de morte.
Francisco decretou que a formulação do catecismo reflita a evolução na compreensão e na doutrina da Igreja sobre a pena de morte, passando a afirmar que "é inadmissível porque é um atentado à inviolabilidade e à dignidade da pessoa".
"Até então, a doutrina da Igreja era diferente", disse Kranemann.
Desde a promulgação do Catecismo de João Paulo II, a seção sobre a pena capital foi revisada duas vezes.
A primeira vez foi em 1997, com o reconhecimento da legitimidade da prática em circunstâncias extremamente limitadas. As modificações mais recentes afirmam que não existe justificação moral para o uso da pena de morte.
Desta forma, de acordo com Kranemann, o Papa Francisco mostrou que o catecismo não é "rígido".
Para o professor alemão, à medida que os teólogos têm novas ideias sobre o desenvolvimento histórico dos ritos litúrgicos, as doutrinas ou as declarações de fé, eles são obrigados a levantar novas questões.
"Perspectivas teológicas mudam com o progresso da ciência e também com a mentalidade da época", disse.
"As tradições devem ser analisadas de forma diferente hoje e é preciso ser crítico sobre o estado atual da pesquisa."
"Esse processo de disputa permanente pode levar a uma visão mais crítica, mas também pode trazer uma nova visão e a tradição de apreciação", argumentou.
Kranemann disse que a maioria dos teólogos alemães apoia a compreensão do Papa Francisco sobre o papel da teologia, que "obviamente espera abordar os problemas teológicos sem preconceitos".
Disse, ainda, que não se sabe até que ponto a discussão teológica aberta será tolerada pela hierarquia.
"O fato de que os teólogos ainda têm problemas com autoridades do Vaticano não é compatível com uma teologia que precisa trabalhar livremente", observou Kranemann, que já tinha expressado sua preocupação sobre os esforços das autoridades romanas para limitar os teólogos acadêmicos em novembro do ano passado.
"Se houver desânimo porque os teólogos têm medo de Roma e de serem atacados pelo que o magistério ensina – o que acontece com os jovens teólogos há muito tempo –, só se prejudica a reputação da teologia como ciência", afirmou, em uma palestra celebrando os 15 anos da faculdade de teologia católica da Universidade de Erfurt. Ele lembrou que na Constituição Apostólica de 2018 sobre as universidades católicas, Veritatis gaudium, o Papa Francisco entende teologia como um "laboratório cultural do presente."
Mas argumentou que, se a teologia for um laboratório como esse, é absolutamente essencial pensar abertamente. Para ele, a teologia não deve se fechar totalmente nem permitir que as autoridades eclesiásticas o façam.
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Vaticano não deve tentar limitar a teologia crítica, diz estudioso alemão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU