12 Junho 2017
Miguel d'Escoto faleceu na quinta-feira, exercendo novamente as suas funções sacerdotais tal como ele desejava, com a revogação de sua antiga suspensão a divinis. Ele tinha 84 anos e uma vida integrada com as fileiras da revolução desde a sua juventude. Participou da insurreição sandinista, na Nicarágua, em julho de 1979, sendo o sacerdote de Maryknoll, onde foi ordenado em 1961, precisamente no mesmo ano que surgiu a Frente Sandinista de Libertação Nacional, cujas fileiras ele militou desde o princípio. Logo após, quando a revolução derrubou ao último Somoza, Anastasio, ele fez parte do primeiro governo sandinista como ministro das Relações Exteriores e continuou depois com várias responsabilidades políticas nacionais nos governos liderados por Daniel Ortega, de 1979 até 1990. Isso lhe rendeu uma advertência e posteriormente uma suspensão a divinis, aplicada pelo cardeal Ratzinger na qualidade de prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, durante o papado de João Paulo II, no dia 5 janeiro de 1985.
A reportagem é de Alver Metalli , publicada por Tierra de América, 10-06-2017. A tradução é de Henrique Denis Lucas.
D'Escoto celebra a sua primeira missa depois da
suspensão canônica imposta pelo Papa Francisco em
14 de agosto de 2014 | Foto: Tierras de América
A recordação do dedo em riste do pontífice polonês repreendendo-o diante dos padres sandinistas no aeroporto Augusto César Sandino, de Manágua, ficou muito longínqua no tempo, nos anos que eram gritados "entre sandinistas e a revolução, não há contradição", em coro e a plenos pulmões na praça de Manágua, durante a celebração de João Paulo II, em seu quarto ano de pontificado. Mas, também muito longe da mentalidade daqueles que receberam aquela censura e, como no caso de d'Escoto, sofreram a excomunhão eclesiástica e buscaram no silêncio a reconciliação.
A última imagem de d'Escoto mostra-o em primeiro plano, atrás do altar, enquanto preside a primeira celebração eucarística, depois que a suspensão a divinis foi revogada, em 14 de Agosto de 2014. Junto a ele, sentado e portando alguns ornamentos coloridos, ou outro rosto familiar da iconografia Sandinista, o sacerdote franciscano Uriel Molina Oliú, fundador do Centro Antonio Valdivieso, uma das forças motrizes da Teologia da Libertação na América Central. A fotografia foi feita pelo fotógrafo do portal do governo da Nicarágua, "El 19 digital", e mostra d'Escoto ancião e sério, solene e ao mesmo tempo feliz pela celebração que finalmente estava presidindo.
"Estou feliz e grato ao Santo Padre por ter retirado esta suspensão a divinis que me impedia de celebrar missas", disse ele emocionado ao cronista do site oficial quando terminou a missa. Depois, ele explicou que a proibição canônica havia sido revogada pelo Papa Francisco em resposta a sua carta em que pedia que houvesse uma permissão para que ele pudesse celebrar missas novamente "antes de morrer".
Quando ele recebeu a notícia de que a suspensão havia sido revogada, o sacerdote reconheceu que havia chorado e acrescentou que Deus havia lhe dado a graça de carregar aquele peso, sem remorso ou ressentimento contra aqueles que haviam imposto a punição, "com muito amor à Igreja; sem celebrar a Santa Missa, mas vivendo uma espiritualidade eucarística".
O portal Sandinista "El 19 digital", da Nicarágua, que havia dado a notícia da revogação da suspensão, anunciou ontem o desaparecimento de d'Escoto dizendo que ele "Partia para outro plano de vida".
Dos sacerdotes que participaram no governo resta vivo apenas o poeta Ernesto Cardenal, com posições muito críticas a respeito de seus antigos companheiros, Daniel Ortega e sua esposa Rosario Murillo, principalmente. Fernando Cardenal, que foi Ministro da Educação entre 1984 e 1990, e não tem laços familiares com Ernesto, embora eles compartilhem do mesmo sobrenome, faleceu no dia 20 de fevereiro de 2016.
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Nicarágua. Reconciliação e morte de um padre-ministro. Miguel d'Escoto inaugurou a era dos sacerdotes no governo sandinista - Instituto Humanitas Unisinos - IHU