09 Janeiro 2018
Pouco mais de um ano atrás, fiz uma série de ensaios de três partes avaliando a oposição ao Papa Francisco. No primeiro ensaio da série, afirmei que a raiz da oposição a Francisco era uma falsa concepção sobre a recepção do Concílio Vaticano II e, de fato, o próprio Concílio.
Continuo fazendo essa avaliação, mas está cada vez mais claro que a oposição a Francisco vem não apenas de falsas concepções sobre o Vaticano II, mas a uma hostilidade real ao Concílio e todos os papas desde então. Em suma, a situação é ainda pior do que eu suspeitava.
O comentário é de Michael Sean Winters, publicado por National Catholic Reporter, 08-01-2018. A tradução é de Luisa Flores Somavilla.
A evidência mais recente vem de um livro de E.M. Radaelli que coloca grande parte da culpa do que ele discerne como modernismo quase herético na Igreja sobre os ombros de Joseph Ratzinger! Andrea Tornielli caracteriza este novo volume da seguinte maneira:
O livro tem como objetivo "convencer o velho professor, na época papa, agora cardeal novamente, a rejeitar, pública, completa e imediatamente, todos os "conceitos impróprios da obra ‘Introdução ao Cristianismo’" que "infectam as páginas do livro, antes que seja tarde demais para ele". E quer "demonstrar a tantos leitores quanto possível o quão falsas e enganosas são todas as doutrinas ensinadas, para ajudar a Igreja a retornar à solidez de sua fé para sempre."
A ironia é enorme. Eu li o livro Introdução ao Cristianismo, de Ratzinger, há anos - e adorei. Quando meus amigos liberais atacavam Ratzinger, ficava claro que eles não tinham lido seu trabalho, não tinham entendido ou estavam condicionados por não gostar de algumas de suas ações como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé sobre as quais não conseguiam ver ou não viam a preciosidade de sua teologia.
A ironia continua. Radaelli também critica a "teologia progressiva" de Karl Rahner, Hans Urs von Balthasar e Henri de Lubac. Seria uma surpresa para muitos críticos e defensores de Balthasar e DeLubac vê-los na categoria de "teologia progressista" ao lado de Rahner.
Outro livro, O Papa Ditador, tem circulado entre a mídia e as organizações conservadoras. Publicado de forma anônima, o jornal Catholic Herald aparentemente sabe quem é o autor porque o editor Dan Hitchens o entrevistou. Não confio em livros publicados sob pseudônimo, e grande parte das queixas — que o Papa é rígido, que promove seus aliados e não os que se opõem a ele — poderia ser dita a respeito de qualquer papa. Realmente, chama a atenção que Francisco não demitiu mais cardeais e funcionários da Cúria que ficaram lá desde outros pontificados.
Isso não impediu que pessoas como o Pe. John Zuhlsdorf e o Pe. John Hunwicke promovessem o livro em seus sites.
Zuhlsdorf e Edward Pentin reportaram, no National Catholic Register, uma declaração de três bispos no Cazaquistão que desafia Amoris Laetitia de forma direta. Não quero criticar por pouca coisa, mas a forma de Pentin contar as alegações dos bispos do Cazaquistão é significativa. Por exemplo:
Em face da "confusão cada vez maior" na Igreja, os bispos reafirmam o ensinamento da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimônio, argumentando que admitir à Sagrada Comunhão divorciados “que se casaram novamente” sem uma anulação, e não viver em continência, equivale a uma "espécie de introdução do divórcio na vida da Igreja".
Não faz sentido que os bispos cazaques estejam aqui afirmando um ponto controverso, sem "o que eles alegam é o ensinamento da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimônio", sem introdução de um adjetivo como "suposto" para deixar claro que se tratam de alegações, não fatos. É difícil saber onde os bispos terminam e onde Pentin começa.
Além disso, após a decisão do Papa de postar a declaração dos bispos de Buenos Aires, Argentina, e sua resposta na Acta Apostolicae Sedis, será que ainda há motivos para "confusão"? Os bispos cazaques (incluindo Pentin) podem não gostar da interpretação definitiva dada pelo Papa, mas já não há razão para confusão.
Está claro que o volume da oposição a Francisco não está diminuindo, embora eu ainda me pergunte até que ponto é generalizada. Na edição atual do The Tablet, o Vaticanista Marco Politi declara:
A oposição radical a Francisco escolheu uma escalada desenfreada de hostilidade ao Papa, usando a exortação pós-sinodal Amoris Laetitia como sua plataforma. Houve petições organizadas para o Colégio dos Cardeais, a dubia ("dúvidas teológicas") assinada por quatro cardeais — Raymond Burke, Walter Brandmüller, Carlo Caffarra e Joachim Meisner, os dois últimos já falecidos —, um falso Osservatore Romano zombando de Bergoglio e cartazes insultando-o nas paredes do centro de Roma, onde foram vistos por milhares de turistas e romanos. E também uma guerra implacável contra ele em sites ultraconservadores.”
Muito som e fúria, certamente, mas será que significa alguma coisa? Significa apenas que há pessoas na Igreja que nunca aceitaram o Concílio Vaticano II, que aprovaram o Papa João Paulo II e o Papa Bento XVI apenas enquanto pareciam estar segurando as reformas do Concílio, e que agora, confrontados com um Papa que está determinado a soltar, não controlar, as reformas que o Concílio pediu, foram expulsos das gaiolas pré-Vaticano II.
Como aqueles que imediatamente se opuseram ao Concílio, confundem o modo como era a Igreja durante o reinado de Pio IX com o modo como a Igreja sempre foi. O Concílio exortou a Igreja a retornar às fontes, não para adotar a modernidade por bem ou por mal. E também é isso que Francisco está pedindo, até mesmo o seu desejo de uma Igreja pobre para os pobres.
Não há nada de século XIX em seu papado, e isso os deixa furiosos. Há um quê de século I sobre este papado: deixar os corações ardentes com o Evangelho.
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A Hostilidade desenfreada pelos críticos do Papa Francisco ao Concílio Vaticano II - Instituto Humanitas Unisinos - IHU