14 Julho 2016
“Foi uma grande briga para chegar até o acordo de Paris, em 2015, e finalmente, pela primeira vez, todos os países, desenvolvidos ou em desenvolvimento, concordaram em fazer alguma coisa. Entretanto, embora esse tenha sido um grande avanço, ainda não é suficiente para chegar a uma temperatura bem abaixo dos 2ºC”, adverte o pesquisador.
Foto: meioambiente.culturamix.com |
Se “os países se limitarem a fazer aquilo com que eles estão se comprometendo, de maneira alguma estaremos caminhando para um mundo com temperaturas abaixo de 2ºC; muito pelo contrário, dependendo da probabilidade do acerto que se gostaria de ter, grosso modo, as INDCs levariam o mundo a temperaturas, ao final do século, variando entre 2,9ºC e 3,9ºC, ou seja, uma temperatura mais alta do que era a temperatura média do planeta na era pré-industrial”, diz Roberto Schaeffer à IHU On-Line.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone, Schaeffer comenta as metas nacionais de países como China, Índia, Brasil, União Europeia e Estados Unidos e pontua que algumas, a exemplo da chinesa, são muito vagas e pouco contribuirão para resolver o problema das emissões de gases de efeito estufa. “O que chama a atenção no caso da China é que ela não tem meta absoluta, mas está se propondo a chegar a um pico de emissão em 2030, mas isso não significa nada. Se de agora até 2030 a China aumentar sua emissão em 10 vezes, e a partir de 2031, as emissões começarem a cair 1%, a China cumpriu a sua meta e isso não serviu para nada, porque o país não parou de aumentar sua emissão. Como a meta chinesa chegará a um pico em 2030, não fala o acontecerá em 2031, ou seja, vai chegar a um pico em 2030 e continuará nesse patamar pelos próximos 10 mil anos?”, questiona.
Na avaliação dele, o Brasil, entre os membros da Conferência do Clima, é o país que apresentou a meta mais “honesta”, mas a partir desse momento, pontua, todos os países precisam “detalhar melhor” como suas metas serão alcançadas: “será pela eficiência energética no setor de transportes ou através de mais fontes renováveis de energia ou mais ou menos desmatamento?”.
Diante dos desafios, Roberto Schaeffer faz uma avaliação positiva e frisa que o Acordo de Paris, embora “frágil”, é um avanço em relação ao Protocolo de Kyoto, que “jamais iria funcionar”. Ele lembra que “boa parte do cumprimento do Protocolo de Kyoto pela União Europeia e pelo próprio Japão” foi possível porque eles transferiram “parte de suas indústrias para os países que não estavam no acordo, de maneira que o Japão emitia menos porque passou a importar mais produtos da China, que emitia mais para fazer produtos para o próprio Japão. Então, não é verdade que o Protocolo de Kyoto e que os países do Anexo I cumpriram suas metas de redução de emissão, porque eles simplesmente transferiram suas emissões para outros países que não tinham compromisso”.
Roberto Schaeffer é doutor em Política Energética pela University of Pennsylvania e atualmente leciona Economia da Energia na Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, e atua no Programa de Planejamento Energético da COPPE. Foi Membro do Painel Metodológico em Linhas de Base e Monitoramento do Mecanismo do Desenvolvimento Limpo das Nações Unidas (UNFCCC CDM-Meth Panel) desde sua criação, em 2002, até 2011. Desde 1998 é membro do Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima (IPCC) das Nações Unidas.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Qual é o problema que identifica, em geral, com as metas nacionais [Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida – INDC, na sigla em inglês] dos países que participaram da COP-21? Quais são as evidências de que as metas nacionais assumidas na COP-21 não serão suficientes para garantir uma elevação da temperatura média da Terra em menos de 2ºC?
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Roberto Schaeffer – A dificuldade está na própria estrutura das INDCs, ou seja, no modo como elas foram pensadas, porque são metas voluntárias que os países anunciaram. Dado que houve uma liberdade total em como os países poderiam decidir acerca de suas metas, cada um escolheu uma maneira para realizá-las. Por exemplo, a meta dos chineses está muito ligada a atingir um pico de emissão de CO2 até 2030 e começar a reduzi-la a partir dessa data. Então, essa meta não é facilmente traduzível no sentido de sabermos ou evidenciarmos que tipo de ambição ela representa à medida que não fornece informações acerca de qual será o tamanho desse pico.
No caso da Índia, as metas eram muito ligadas a uma redução da intensidade de carbono da economia, o que significa que a partir de 2020 e 2030, cada dólar de PIB da Índia, por exemplo, emitirá menos carbono, mas não se fala como o PIB da Índia se comportará; portanto, essa meta também não significa muita coisa. Ou seja, com isso a Índia está apenas falando que vai continuar a aumentar suas emissões, mas será mais eficiente na maneira com que sua economia usará a energia. Portanto, essa é uma das grandes dificuldades das INDCs. Ao mesmo tempo, esse foi o acordo possível naquele momento da COP-21.
A partir das definições das metas dos países, eu e outros pesquisadores começamos a fazer alguns estudos e a nos perguntarmos o que as INDCs significariam em termos de aumento da temperatura do planeta até o final do século. No paper recente que publicamos na Nature, mostramos que se, de fato, os países se limitarem a fazer aquilo com que eles estão se comprometendo, de maneira alguma estaremos caminhando para um mundo com temperaturas abaixo de 2ºC; muito pelo contrário, dependendo da probabilidade do acerto que se gostaria de ter, grosso modo, as INDCs levariam o mundo a temperaturas, ao final do século, variando entre 2,9ºC e 3,9ºC, ou seja, uma temperatura mais alta do que era a temperatura média do planeta na era pré-industrial.
Apesar disso, o Acordo de Paris foi importante porque foi a primeira vez na história em que todos os países passaram a ter metas de redução de emissão, situação bastante diferente daquela em que se tratou do Protocolo de Kyoto, em 1997. Naquele momento, por exemplo, alguns países passaram a ter compromisso, mas, por outro lado, se optou por dividir o mundo entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, onde os ditos países desenvolvidos – chamados “Países Anexo I” - tinham um compromisso de redução de emissão, e os países em desenvolvimento, como o Brasil, Índia e China, não tinham compromisso. Foi uma grande briga para chegar até o acordo de Paris, em 2015, e finalmente, pela primeira vez, todos os países, desenvolvidos ou em desenvolvimento, concordaram em fazer alguma coisa.
Entretanto, embora esse tenha sido um grande avanço, ainda não é suficiente para chegar a uma temperatura bem abaixo dos 2ºC. Agora estamos entrando em um novo ciclo, no qual já a partir de 2018 se teria uma nova primeira rodada de negociações, com intervalos não superiores a cinco anos, em que os países terão que anunciar novas metas, as quais deverão ser sempre mais ambiciosas do que as metas anteriores. Provavelmente se isso for levado a sério, espero que os países possam convergir e ir em direção a um mundo com temperaturas abaixo dos 2ºC. Mas, nesse momento, as INDCs em si e o Acordo de Paris não foram suficientes para chegarmos lá.
"O próprio Acordo de Paris tem uma fragilidade no sentido de que irá entrar em vigor em 2020, mas ainda estamos em 2016, e não há por que não começarmos a fazer alguma coisa antes." |
IHU On-Line – De todo modo, foi um avanço passar de um acordo centralizado, como o de Kyoto, para um tipo de acordo em que cada país tenha autonomia para decidir com quais metas pode se comprometer?
Roberto Schaeffer – Sim, a minha avalição é muito positiva. O Protocolo de Kyoto jamais iria funcionar, porque, dado que o problema das emissões é mundial, de nada adianta a União Europeia ou o Japão, ou quem quer que seja, ter uma meta de redução se outros países não têm, e foi isso o que aconteceu com Kyoto. Boa parte do cumprimento do Protocolo de Kyoto pela União Europeia e pelo próprio Japão se deu porque eles transferiram parte de suas indústrias para os países que não estavam no acordo; dessa maneira, o Japão emitia menos porque passou a importar mais produtos da China, que emitia mais para fazer produtos para o próprio Japão. Então, não é verdade que o Protocolo de Kyoto e que os países do Anexo I cumpriram suas metas de redução de emissão, porque eles simplesmente transferiram suas emissões para outros países que não tinham esse compromisso. Esse modelo que hoje divide o mundo entre aqueles que têm compromisso e os que não têm jamais vai funcionar, porque os que têm compromissos empurraram suas emissões para os que não têm e parece que está tudo bem, mas não está.
Nesse sentido o Acordo de Paris é mais inteligente, porque colocou no “mesmo saco” todos os países. Então, a partir de agora todos têm obrigação de reduzir as emissões. O que ele não fez e, talvez, não teria como fazer nesse momento, foi chegar a um compromisso igual para todo mundo, mas isso é impossível dado que os países são diferentes. É como se brincássemos: eu finjo que sou muito gordo e você que é muito magra, e se falarmos que cada um tem que emagrecer 10 quilos, não faz sentido. Do mesmo modo, estamos falando de países muito ricos e muito pobres, países com muito recurso natural e outros com pouco recurso natural, países com muita população e outros com pouca população, países de clima quente e de clima frio, ou seja, são tantas diferenças que não tem como chegar a uma métrica comum.
Se não for possível chegar a um acordo ainda mais ousado, o que provavelmente acontecerá – e já se discute nos bastidores – é que apesar do Acordo de Paris comportar todos os países da Convenção do Clima – cerca de 195 –, no fundo não são mais do que nove ou dez países ou dez grupos de países que realmente são importantes nesta negociação. Isto é, quem realmente é importante nessa história não são os 195 países, mas União Europeia, Estados Unidos, Japão, Índia, China, Brasil, México, África do Sul e Canadá. Se em algum momento os 195 países não chegarem a metas que permitam que a temperatura permaneça em 2ºC, provavelmente alguns desses que mencionei irão tomar uma decisão acerca do que fazer, porque não faz diferença se Zimbabwe ou se Paraguai reduzem suas emissões; quem faz diferença são os grandes, que, a princípio, estão motivados ou interessados em resolver esse problema.
Redução de emissões nos setores de aviação e navegação
O próprio Acordo de Paris tem uma fragilidade no sentido de que irá entrar em vigor em 2020, mas ainda estamos em 2016, e não há por que não começarmos a fazer alguma coisa antes. Além disso, o Acordo de Paris não contempla todos os setores da economia. Há alguns setores que, historicamente, não fazem parte das “contabilidades mundiais das emissões”. Só para citar um exemplo, as emissões dos setores de aviação internacional e de navegação internacional, que não são pequenas, não fazem parte da responsabilidade de nenhum país do mundo. As emissões de um voo que sai do Rio de Janeiro para Paris pertencem ao Brasil ou à França? E se esse voo parar em Miami, as emissões também pertencem aos Estados Unidos? O mesmo ocorre com a navegação: se um navio sai do Porto de Santos, vai para Miami, depois vai para Roterdã, depois para Xangai, como se aloca a emissão desse navio? Ela será um pouco chinesa, brasileira e americana? Ou a contabilidade, no caso dos navios, deve ser feita por tonelagem dos produtos que os navios transportam e desembarcam no porto A, B ou C?
Apesar de as emissões desses setores não fazerem parte de país nenhum, são setores relativamente organizados. Então a organização de navegação mundial já está pensando, enquanto organização internacional, a começar a se autoimpor metas de redução de emissão. O mesmo ocorre com o setor de aviação internacional. Ainda que a emissão do avião que vai do Rio de Janeiro a Paris não seja nem brasileira nem francesa, há órgãos internacionais que fiscalizam e que regulam o setor de aviação internacional, por isso nada impediria que um setor como esse dissesse que tem como meta, a cada ano, reduzir as emissões em 5%, 10% ou 20%.
As reuniões da Convenção do Clima, por exemplo, são reuniões dos governos federais dos países, mas muitas dessas ações não pertencem exatamente a governos federais. Por exemplo, tem a chamada C-40, que é uma organização que congrega as 40 maiores cidades do mundo. Então se os prefeitos das 40 maiores cidades do mundo falarem que a partir de agora é preciso criar um programa muito inteligente de transporte público, limitar o uso de automóveis e taxar o carbono, essas medidas poderiam ser implementadas, porque estão um pouco além dos governos federais. Com esse tipo de discussão, seria possível criar governos “subnacionais”, que também poderiam se envolver nesse esforço e começar a desenvolver ações que também levariam à redução de emissões, sobre as quais os governos federais não têm tanto controle.
Nos bastidores esse tipo de proposta começa a surgir. Por isso não sou pessimista, acho que vamos chegar lá; talvez cheguemos muito tarde, mas estamos nos movendo na direção correta. Tem muita política por trás dessas negociações, então, quem nunca se envolveu em processo político, não entende como as negociações não andam rápido. Nesse sentido, o Acordo de Paris não poderia ter sido mais ambicioso, porque se fosse, não teria permitido com que 195 países concordassem com algo.
"Considero pura 'picaretagem' o que foi feito no Protocolo de Kyoto" |
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IHU On-Line – Nesse sentido, como avalia a proposta defendida por alguns, de que a negociação sobre o clima deveria ser feita no G-20 e não numa assembleia com 195 países?
Roberto Schaeffer – Isso acabará acontecendo, mas não dentro do âmbito da Convenção do Clima, porque Convenção do Clima, por definição, é a Convenção dos 195 países que viraram sócios dessa Convenção na Rio 92. Então, nada impede, por exemplo, que Brasil e Estados Unidos façam um acordo comercial bilateral e determinem que qualquer produto importado para os EUA pagará alíquota zero de importação, desde que esse produto use a melhor tecnologia possível em termos de redução de emissão. O mesmo poderá ocorrer com outros países.
O que começará a acontecer são negociações bilaterais e trilaterais. Assim como o Brasil ajudou a criar o Mercosul, que cria tarifas diferenciadas para os países do Conesul, nada impede esses países de criarem um “Mercosul do Clima” e determinarem que a troca de produtos entre esses países terá um tratamento privilegiado, desde que reduzam suas emissões em 10%, 20% ou 50%. É isso que vai acontecer e nesse sentido já começam a ocorrer negociações nos bastidores. No ano passado, antes de a presidente Dilma visitar o Obama na Casa Branca, onde uma das questões discutidas foi a do clima, eu tive várias conversas com o pessoal da Casa Branca, sobre como Brasil e Estados Unidos poderiam ou não fazer acordos bilaterais nesse sentido.
IHU On-Line – Quais dos países assumiram metas mais audaciosas após a COP-21?
Roberto Schaeffer – A mais interessante e a mais honesta de todas é a brasileira, porque diz claramente aonde queremos chegar, ou seja, não esconde números, como faz a China. Analisando a meta chinesa, não sabemos aonde ela chegará, nem qual será seu PIB. Além disso, a proposta chinesa não é sobre gases de efeito estufa, mas só sobre CO2, então dizer que haverá um pico de redução das emissões de CO2 em 2030 não significa nada. Portanto, as metas da China e da Índia são um horror, assim como a maior parte das propostas apresentadas pelos países.
Em valores absolutos também não tem nenhuma meta igual à brasileira, que é maior que a americana e que a europeia. Podem falar que isso ocorre porque a meta brasileira tem a ver com o desmatamento, mas o fato é que quando os outros países do mundo escolheram certos anos para referenciar suas metas, também o fizeram por alguma razão. Quando o Protocolo de Kyoto escolheu o ano de 1990 como referência na redução de emissão, foi pura “picaretagem”, porque o ano de 1990 foi justamente o ano em que começou a entrar gás natural no Reino Unido. Logo, eles estavam num momento de transição do carvão para o gás, e o ano seguinte foi o ano da queda do Muro de Berlim, onde as duas Alemanhas se unificaram e praticamente fecharam todas as fábricas da Alemanha Oriental, e com isso as emissões cairiam de qualquer maneira. Por isso considero pura “picaretagem” o que foi feito no Protocolo de Kyoto.
IHU On-Line – Com que metas o Brasil se comprometeu?
Roberto Schaeffer – O Brasil se compromete em tudo. A meta apresentada diz respeito à redução absoluta de emissão e o quantitativo disso é o maior do mundo. Os Estados Unidos também usam como referência para sua meta o ano de 2005, assim como o Brasil; no entanto, se bem recordo, a meta norte-americana propõe a redução das emissões entre 2025, da ordem de 27%, enquanto a meta do Brasil é de 37%. O próprio Brasil, que é um país em desenvolvimento, está se propondo a reduzir mais emissões do que os Estados Unidos. A meta brasileira é tão ambiciosa que, antes de o Brasil anunciá-la, várias ONGs nem acreditavam que o Brasil iria propor isso. Nos bastidores, as ONGs elogiaram a meta brasileira, mas para imprensa, falaram mal; faz parte de uma ONG reclamar em público, mas longe do público a meta brasileira foi bastante elogiada.
IHU On-Line – O senhor comentou rapidamente sobre a meta chinesa. Pode explicitar melhor quais são os problemas que evidencia com a meta chinesa e também com a europeia e a norte-americana?
Roberto Schaeffer – O que chama a atenção no caso da China é que ela não tem meta absoluta, mas está se propondo a chegar a um pico de emissão em 2030, mas isso não significa nada. Se de agora até 2030 a China aumentar sua emissão em 10 vezes, e a partir de 2031 as emissões começarem a cair 1%, a China cumpriu a sua meta e isso não serviu para nada, porque o país não parou de aumentar sua emissão. Como a meta chinesa chegará a um pico em 2030, não fala o acontecerá em 2031, ou seja, vai chegar a um pico em 2030 e continuará nesse patamar pelos próximos 10 mil anos? Portanto, a proposta da China não serve para nada, só serve no sentido de que, pela primeira vez, a China aceitou começar a falar em clima.
A média europeia não tem nada de surpreendente e não tem como ser diferente também porque a população da Europa não cresce mais – fora a questão da imigração -, a economia europeia está envelhecida, os europeus estão ficando velhos e com isso eles andam menos de carro, saem menos, compram menos roupas, ou seja, consomem menos. Logo, a indústria europeia por definição é uma indústria que está morrendo, assim como o seu setor de transporte, pois pessoas idosas não se deslocam tanto, com isso as emissões do setor de transporte vão cair. Portanto, nada de surpreendente que a emissão europeia caia com o passar do tempo.
Surpreendente é o Brasil, um país com população que cresce e está se desenvolvendo, propor reduzir emissões. O caso americano está um pouco entre a situação do Brasil e da União Europeia, isto é, a economia americana ainda tem certa pujança, ainda é uma economia de pessoas jovens, até pela questão de imigração, por isso não seria absurdo os Estados Unidos continuarem a aumentar suas emissões, mas a meta absoluta deles, em termos de redução de emissões, é menos ambiciosa que a brasileira.
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"Surpreendente é o Brasil, um país com população que cresce e está se desenvolvendo, propor reduzir emissões" |
IHU On-Line - Quais foram os demais países ou grupo de países que apresentaram metas abaixo do que se esperava ou do que poderiam ter apresentado?
Roberto Schaeffer – É muito difícil avaliar se a meta de alguns países é baixa ou não. Não tenho como falar se a meta do Malawi, na África, é ambiciosa ou não, porque não conheço o Malawi. Nesses casos, caímos novamente na questão dos nove ou dez países mais importantes do mundo. De fato, é possível avaliar a situação desses países. Eu tenho condições de avaliar uma meta canadense, uma meta europeia, uma meta do México, eventualmente, até da Indonésia. Mas países como Filipinas e Vietnã são difíceis de avaliar, porque são realidades tão diferentes, são países tão miseráveis, que estão se industrializando agora.
Só para termos uma ideia, hoje mais de um bilhão de pessoas no mundo ainda não têm acesso à energia elétrica, e a maior parte desse pessoal vive no Sul da Ásia e da África. Então, como um país que ainda não tem escola, comida, hospital, transporte, energia elétrica, lâmpada, rádio, ou seja, como um país que está nessas condições vai falar em meta de redução de emissões? Por isso não devemos criticar esses países menores, porque eles estão em outro momento do seu desenvolvimento. Em ano de Convenção do Clima, é importante que todos estejam no barco, mas, ao pé da letra, a análise final das metas deveria se fixar apenas nesses nove ou dez países.
IHU On-Line – Qual sua expectativa para a próxima Conferência do Clima?
Roberto Schaeffer – Apesar de eu ter elogiado a meta brasileira, não quer dizer que o Brasil não poderia fazer mais; poderia sim. E, de fato, a meta brasileira representa apenas alguns números e o Brasil ainda tem que fazer o dever de casa. De todo modo, está faltando ao Brasil e a outros países detalhar melhor como a meta será alcançada: será pela eficiência energética no setor de transportes ou através de mais fontes renováveis de energia ou mais ou menos desmatamento? O dever de casa dos países é detalhar isso.
Para o mundo como um todo, o importante é não deixar esse "espírito de Paris" morrer, ou seja, essa previsão de que a cada cinco anos será possível rever as metas e sempre revê-las para baixo; é isso que esperamos ver nas próximas Conferências das Partes. No máximo a cada cinco anos os países têm que submeter novas metas, mas isso não significa que elas não possam ser revistas a cada um ou dois anos. Estou acreditando que se os países assinaram suas metas, eles de fato querem e vão cumpri-las. Para isso acontecer não dá para ficar apenas em cima das metas anunciadas, porque como falei no começo da conversa, essas não nos levarão para os 2ºC, mas sim para 2,9ºC e 3,9ºC. Então, todos têm que arregaçar as mangas; os mecanismos e as possibilidades estão aí.
Por Patricia Fachin
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Da “picaretagem” do Protocolo de Kyoto às fragilidades do Acordo de Paris: temperatura climática pode chegar a 3,9ºC. Entrevista especial com Roberto Schaeffer - Instituto Humanitas Unisinos - IHU