28 Novembro 2006
IHU On-Line – Qual sua perspectiva em relação ao novo governo do Estado?
André Marenco – Acho que este governo passará por uma situação muito delicada do ponto de vista financeiro e do ponto de vista político. É a questão financeira que vai definir a política a ser adotada pelo novo Governo. A governadora Yeda precisa organizar a grande dívida que o Estado possui. Para isso necessitará de uma maioria capaz de aprovar suas propostas de redução de gastos, sobretudo no funcionalismo. A grande questão colocada é: como construir coalizões de governo capazes de dar eficiência na aprovação de suas propostas? Yeda tem ainda uma dificuldade adicional, pois terá que compor uma coalizão relativamente ampla, pois ela não faz parte do maior partido do governo e isso faz com que o controle que ela terá sobre a máquina seja menor. Isso introduz um elemento de perda de uniformidade relativamente grande. Outro problema é o controle sobre gastos, em função da dívida do Estado, e, sobretudo da relação com o judiciário. A governadora precisará de um compromisso muito forte da base de governo em termos da disposição de enfrentar o poder judiciário. A interrogação que fica é esta: Em que medida todos os partidos que fazem parte da base da governadora Yeda tem essa disposição? PMDB, PTB e PP estarão dispostos a ir com Yeda até o fim nesta batalha?
IHU On-Line – Que tipo de mudanças podemos esperar do governo Yeda?
André Marenco – O que se anuncia é uma agenda prioritariamente voltada para a área financeira. O que se pode esperar é uma redução de gastos públicos, uma redução de investimentos, uma redução de gastos de custeio. Um tipo de programa mais liberal de gestão, mais acentuado do que foi no governo Rigotto.
IHU On-Line – Surpreendeu o fato de o governador Germano Rigotto não chegar ao segundo turno?
André Marenco – Não esperava que isso fosse acontecer. Avaliava que a situação do governador Germano Rigotto era uma situação, do ponto de vista eleitoral, relativamente cômoda. Por ser uma posição mais de centro, ele teria uma chance alta de reeleição. Há dois fatores que explicam porque isso não ocorreu: um que vai se apresentando desde o início da campanha e outro no final. Foi uma campanha que acabou se nacionalizando, em grande parte o início da ascensão de Yeda tem a ver com a ascensão de Alckmin no Estado e isso nos dá uma pista para entender o que ocorreu. O PMDB pagou o preço de ter ficado de fora da disputa nacional. A campanha presidencial foi um fator importante para polarizar a campanha aqui no estado. O outro fator é o deslocamento de uma parte do PMDB, e de seus eleitores, de Rigotto para Yeda. Uma parte de eleitores do PMDB viu no cenário apresentado pelas pesquisas a possibilidade de fazer uma espécie de voto útil em Yeda. Então, uma parte migrou para Yeda pensando numa exclusão de Olívio e numa disputa no segundo turno entre suas duas preferências. O que aconteceu é que o contingente de eleitores que fizeram isso foi maior e terminou levando Yeda contra Olívio. Mas é provável também que uma parte do PMDB tenha feito esse movimento. É possível que uma parte do PMDB tenha deixado Rigotto na mão durante a campanha.
IHU On-Line – Não foi isso que ocorreu com Alckmin?
André Marenco – Foi um pouco diferente, pois o PSDB não apoiou outro candidato. O que aconteceu foi uma espécie de corpo mole com o Aécio de um lado, com o Serra de outro em função das perspectivas para 2010. Eles provavelmente avaliaram que a melhor situação seria a derrota de Alckmin. Então, não houve um empenho a fundo na campanha do Alckmin, sobretudo por parte do Aécio. Mas não podemos dizer que eles tenham apoiado outro candidato ou que sua base tenha apoiado outro candidato. Tanto Aécio quanto Serra já estão em campanha para 2010 e por isso não seria interessante uma vitória do Alckmin agora, pois se ele ganhasse, poderia ser candidato a reeleição em 2010. O que poderia ser ruim por dois fatores: ou o governo seria ruim e aí dificilmente o PSDB ganharia novamente e a chance de Aécio ou Serra diminuiriam ou Alckmin iria muito bem e seria o candidato natural do PSDB. Por isso não houve empenho, mas eu não chegaria a dizer que eles tenham apoiado Lula.
IHU On-Line – Podemos esperar cooperação entre o Estado e o governo Federal? Quais são as maiores dificuldades que encontraremos com essa diferença ideológica?
André Marenco – Em alguma medida sim, mas eles têm agendas diferentes. Há questões que não são tão simples de resolver que envolvem assuntos como reforma tributária, guerra fiscal, quadro financeiro. O Rio Grande do Sul, junto com Alagoas, tem uma situação financeira bastante complicada. Eu não sei até que ponto o Governo Federal será leniente às dividas dos governos dos Estados ou a renegociação de dívidas. Há certo limite para essa cooperação. Não sei se há muita margem para renegociação de dívida e algum tipo de novo compromisso.
IHU On-Line – O Estado cobrou muito do Governo Federal, sobretudo nesta última eleição, que suas questões prioritárias não tinham a mesma importância na agenda do presidente. Como o senhor acha que essas questões serão tratadas agora?
André Marenco – É a primeira derrota de Lula no Rio Grande do Sul, desde 1989. Mesmo quando ele perdia nacionalmente, ele ganhava aqui. Isso pode certamente levar a uma preocupação em recuperar esse terreno perdido do PT aqui no Estado. Também acredito que na agenda do Governo Federal a agricultura deverá ocupar um lugar importante. Porque ele não só perde aqui, mas perde em todos os Estados do Sul e centro-oeste que têm a agricultura e o agronegócio como questões prioritárias. Imagino que via algumas políticas federais, sobretudo na área cambial e na área agrícola, possam dar uma perspectiva positiva para o Rio Grande do Sul.
IHU On-Line – Como o senhor avalia essa nova bancada dos deputados estaduais?
André Marenco – 40% da bancada foi renovada. Esse percentual tem se apresentado desde 1994. Comparada com outras democracias do mundo, é alta. Comparada com democracias da América Latina, ela é média. Ou seja, é uma renovação normal levando em conta também que essa foi a média de outros estados. Houve uma ligeira mudança em termos de correlação de forças. O PT perdeu cadeiras, o PSDB e o PFL cresceram um pouco, mas a mudança partidária não chegou a ser muito significativa. Uma curiosidade é o caso do Paulo Borges, do PFL, mas é um caso excepcional. Os padrões de recrutamento do legislativo do Rio Grande do Sul são muito convencionais. Deputados eleitos, em geral, e acho que essa legislatura manteve esse padrão, são deputados com razoável experiência política e partidária, que vem com uma trajetória de política local. Salvo casos excepcionais, o padrão se manteve.
IHU On-Line – Vimos alguns candidatos sem história política serem eleitos com considerável número de votos, como foi o caso de Paulo Borges eleito com mais de 113 mil votos. Como a imagem pública dos candidatos influenciam no voto final?
André Marenco – O primeiro aspecto é que essa é uma eleição que ocorre dentro de um período de crise tendo como epicentro o poder legislativo. O segundo aspecto é que eleições legislativas têm um problema de informação, o número de candidatos é muito maior do que para o executivo e a atenção que é dada a ela, pelos meios de comunicação, é muito menor. Para um contingente significativo de eleitores a escolha por um candidato é difícil. Nós tivemos mais de 500 candidatos a deputado estadual. O tempo necessário para o eleitor dedicar a essa escolha seria absurdo. Para uma parte do eleitorado, sobretudo os mais céticos e descrentes, a opção é alguém sem histórico político e que conhece pela TV. Ou seja, uma parte do eleitor que está mais afastado da política vai fazer esse tipo de opção. O mais importante é que isso é um fenômeno residual em relação àqueles que têm uma trajetória mais política.
IHU On-Line – Em entrevista, o senhor afirmou que a grande quantidade de candidatos e o fato de eleições de deputados ficarem em segundo plano confundem os eleitores. Quais as principais conseqüências destas características nas eleições?
André Marenco – Começamos por lembrar que o candidato apresenta-se no horário eleitoral gratuito, ou seja, ele disputa espaço com os candidatos ao executivo a partir daí. A visibilidade de um candidato ao executivo é maior também porque suas ações têm impacto direto na vida das pessoas. O legislativo é o contrário, para um deputado, por exemplo, é muito mais difícil aprovar um projeto, pois ele tem limites muito maior para sua ação e que foram determinadas pela Constituição. Acrescente-se a isso o grande número de candidatos a deputado, o que faz com que para o eleitor seja muito mais difícil avaliar todos os candidatos. Isso ajuda a entender como candidatos conseguem fazer mais de cem mil votos, como foi o caso do Paulo Borges. O atalho que o eleitor toma é a visibilidade pública que o candidato tem.
IHU On-Line – Como o senhor avalia os novos candidatos, sem esse histórico político, que foram eleitos?
André Marenco – Numa sociedade tão complexa e diversificada, não só por razões de natureza ideológica, mas por toda uma multiplicidade de identidade de demandas que existem na sociedade, é positivo que exista algum tipo de representação dessa dissemelhança. Melhor ainda se houver competição pela representação das mulheres, dos jovens, dos negros, etc. na bancada. O sistema eleitoral brasileiro permite isso, uma combinação de uma representação partidária, na qual teremos programas políticos sendo representados através de bancadas que tenham uma representação de grupos com interesses particulares. Isso não é negativo, isso qualifica a democracia. As melhores democracias valorizam as representações.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A delicada situação financeira e política do governo Yeda Crusius. Entrevista especial com André Marenco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU