15 Dezembro 2025
Nada pode ser proposto agora que não seja para a maior glória do presidente e para proteger exclusivamente os interesses dos Estados Unidos.
A reportagem é de Lluís Bassets, publicada por El País, 14-12-2025.
Donald Trump já alcançou seu objetivo em menos de um ano na Casa Branca. Ele é como um monarca absoluto; exatamente o que os idealizadores da Constituição buscavam evitar em 1787. Acadêmicos renomados em democracias reconhecem a regressão em direção a uma forma de autoritarismo semelhante à da Hungria, Venezuela ou Turquia. A liderança do mundo livre da qual ele tanto se vangloriava está se inclinando para um estilo autoritário e proselitista, como evidenciado pela nova Estratégia de Segurança Nacional com a qual Trump pretende moldar todo o cenário internacional a seu bel-prazer.
Para os americanos Steven Levitsky, Lucan A. Way e Daniel Ziblatt, trata-se de uma forma de "autoritarismo competitivo", "na qual os partidos competem nas eleições, mas os governantes rotineiramente abusam do poder para punir os críticos e desequilibrar o jogo contra a oposição". Embora encontrem em suas formas de expressão até mesmo "reminiscências das ditaduras militares da década de 1970", eles ainda acreditam que a ofensiva autoritária é reversível.
A Casa Branca agora não dá nenhum passo sem colocar o autoritarismo em primeiro plano. Ao contrário de estratégias semelhantes de presidentes anteriores, nada pode ser proposto agora que não seja para a maior glória de Trump e unicamente para proteger os interesses dos EUA. O mundo exterior é visto como um campo para a expansão autoritária, governada pelo ganho econômico e até mesmo pela ganância pessoal. Tudo o mais, sejam direitos humanos ou o tipo de regime político, é irrelevante.
No mundo de Trump, regido pela lei da força, apenas três homens fortes importam. Eles negociam entre si, dividem os despojos e comandam o mundo. São eles Xi Jinping, Vladimir Putin e ele próprio. Inspirado, no seu caso, pela Doutrina Monroe ("América para os americanos"), ele reserva para si todo o continente americano, tratando-o como um território doméstico e soberano, para acabar com a imigração, reprimir o tráfico de drogas, manter a ordem, controlar recursos estratégicos e impedir a entrada de concorrentes vindos de fora de suas fronteiras.
Trump se vê como o sucessor do presidente Theodore Roosevelt, que emprestou seu nome em 1904 ao Corolário da Doutrina Monroe, o qual ele usa para justificar a interferência nos assuntos internos de países latino-americanos. Se Roosevelt inspirou o intervencionismo político e militar ao longo do século XX, agora o Corolário Trump promove uma rede de regimes amigáveis e complacentes com as políticas de Trump e a máxima pressão, inclusive militar, sobre aqueles que discordam. Somando-se aos seus impulsos anexacionistas em relação ao Canadá e à Groenlândia, o quintal que Trump vislumbra está se expandindo e promete lucros enormes.
No Oriente Médio, um problema constante para todos os presidentes, o objetivo é manter a segurança em mãos locais e garantir negócios lucrativos, muitas vezes em parceria com os déspotas locais. Da mesma forma, na África, o objetivo não é intimidar os governantes locais, nem se preocupar em expandir os valores liberais ou manter a ajuda ao desenvolvimento, mas sim obter oportunidades de negócios, recursos minerais e parceiros confiáveis, mantendo também os rebeldes sob controle.
No resto do mundo, existe apenas um inimigo estratégico digno de ser designado. Não é a Rússia, nem a China. Não é a Coreia do Norte, nem o Irã. É a Europa. Este documento foi bem recebido tanto em Moscou quanto em Pequim, ao contrário da indignação que provocou na maioria dos europeus. No caso russo, tendo a guerra na Ucrânia como pano de fundo, há particular júbilo com a acusação de que os europeus, fracos, estão consentindo com o "apagamento" de sua civilização. A China, declarada rival econômica e tecnológica com quem se pretende estabelecer "relações mutuamente vantajosas", também tem motivos para se orgulhar.
Diante das ambições da China em relação a Taiwan, Trump defende o status quo, assim como fizeram governos anteriores que se opuseram tanto à anexação quanto à independência, mas expressa isso como uma rejeição a qualquer iniciativa unilateral. Conhecendo sua inconstância, seu desprezo pela democracia e sua abordagem mercantilista às negociações, ele poderia facilmente aceitar a anexação da ilha se obtivesse concessões favoráveis. Por ora, ele já demonstrou sinais de fraqueza na guerra comercial e em gestos de apaziguamento em relação a Xi Jinping.
O trumpismo e o putinismo praticamente não diferem em nada. Compartilham o desprezo pela Europa, a predileção por Estados-nação que zelam zelosamente por sua soberania e fronteiras, a promoção do populismo supremacista de extrema-direita, objetivos destrutivos em relação à UE e até mesmo a rejeição de seu poder normativo. A Rússia, uma potência perigosa na estratégia anterior de Trump, não é mencionada no documento e só é citada agora porque muitos europeus a consideram uma ameaça existencial.
Uma única frase do laureado com o Prêmio Nobel de Economia, Paul Krugman, ilumina o mistério de tanto antieuropeísmo raivoso: "Trump e seus seguidores odeiam a Europa, e a odeiam porque ela ainda honra os ideais que eles estão abandonando nos Estados Unidos".
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