07 Novembro 2025
João XXIII. O 'Papa Bom' queria celebrar o Concílio Vaticano II não no Vaticano, mas em São João de Latrão, a fim de descentralizar a Igreja e dar-lhe, pelo menos simbolicamente, um significado mais pastoral em sua catedral de Latrão.
O artigo é de Tomás Muro Ugalde, teólogo basco, publicado por Religión Digital, 03-11-2025.
Eis o artigo.
Basílica de São João de Latrão
A Basílica de São João de Latrão é a catedral da Diocese de Roma (a catedral de Roma não é o Vaticano, mas sim a Basílica de São João de Latrão). E possui um certo ar bucólico.
Há uma anedota simbolicamente importante sobre João XXIII. O "Papa Bom" queria que o Concílio Vaticano II fosse realizado não no Vaticano, mas na Basílica de São João de Latrão, para "descentralizar" a Igreja e conferir-lhe, ao menos simbolicamente, um significado mais pastoral em "sua catedral", a Basílica de Latrão. No entanto, o protocolo, a Cúria e os cardeais intervieram e "não consentiram" que a ideia de João XXIII fosse levada adiante.
O templo
O Templo em Jerusalém era o centro da vida do povo de Israel. A Arca da Aliança era guardada no Templo; era o lugar da presença de Deus entre o seu povo. Era também como um banco, razão pela qual se tornou um "covil de ladrões".
Hoje lemos o texto de João que narra a expulsão dos mercadores e cambistas do Templo.
A Páscoa judaica
A Páscoa judaica estava sendo celebrada… A passagem do Evangelho de hoje começa com estas palavras: “A Páscoa dos judeus estava se aproximando” (v. 13). Não se refere mais à Páscoa do Êxodo, à Páscoa do Senhor libertador, muito menos à Páscoa de Jesus Cristo. Era a Páscoa de uma rede político-religiosa, econômica e comercial…
A libertação divina tornou-se uma comercialização religiosa
Além disso, os “judeus” no quarto Evangelho não são tanto um grupo étnico, mas sim um conceito negativo. Coloquialmente, poderíamos dizer que “esta é a sua Páscoa, a Páscoa judaica”, não a Páscoa libertadora do Êxodo, e certamente não a Páscoa de Jesus Cristo.
Jesus expulsa os mercadores no início de sua missão
Os Evangelhos Sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas) situam a cena da expulsão dos mercadores do templo no fim do ministério público de Jesus, perto de sua morte. São João, porém, coloca essa cena no início de seu Evangelho, no capítulo 2. Essa passagem, esse gesto, constitui um programa para a vida e a atividade de Jesus. Jesus nos conduzirá a um tipo diferente de adoração, uma adoração sem comercialização, vendedores ou cambistas.
Portanto, segundo São João, Jesus está condenado à morte desde o início de sua vida pública.
Jesus usa gestos e palavras fortes. O chicote era um sinal do que o Messias carregaria. A expressão “covil de ladrões” já havia sido usada pelo profeta Jeremias (Jeremias 7,11).
Cristo é o novo templo. Purificação da adoração
Destruam este templo e eu o reconstruirei em três dias.
O Templo agora será Jesus Cristo: quem me vê, vê a Deus Pai, e, se seguirmos os princípios cristãos, o Templo são os pobres. Vocês me veem nos pobres, nos famintos, nos doentes, nos presos …
Dois capítulos depois, em João 4, no encontro de Jesus com a mulher samaritana, ela lhe pergunta: "Onde devemos adorar a Deus, neste templo de Samaria, Gerizim, ou lá embaixo no Templo de Jerusalém?" Jesus lhe responde.
Deus é adorado em espírito e em verdade. O templo e a adoração do cristão são a vida honesta, a integridade e a conduta justa na vida. A breve obra de Teilhard de Chardin ressoa: Missa sobre o Mundo… O Templo de Deus é Jesus Cristo, são os pobres, é o universo, a criação.
Os templos são o local de sepultamento de Deus ?
É uma daquelas afirmações contundentes de Nietzsche (1844-1900): "Deus está morto e os templos são seu túmulo."
Jesus não disse isso, mas questionou o sistema do templo, a comercialização do templo, a manipulação da religião, em maior ou menor grau, em benefício próprio, os sacramentos, etc. O templo é o lugar da comunidade que se reúne em torno do Senhor, mas pode acabar se tornando um empreendimento comercial. "Destruam esse templo, esse tipo de culto, e não transformem a casa de meu Pai em um mercado."
Os templos de pedra
A construção de templos é necessária (não podemos viver nossa fé ao ar livre) e, se os templos forem belos, melhor ainda (a estética é uma condição humana). Mas os templos não devem ser lugares mágicos que fomentam superstições religiosas ou mesmo artísticas. Os templos são valiosos se nos ajudam a reunir, celebrar e orar.
Além disso, São Paulo nos disse que o templo cristão é o próprio ser humano: “Acaso vocês não sabem que o corpo de vocês é santuário do Espírito Santo que lhes foi dado por Deus e que habita em vocês?” (1 Coríntios 6,19). O edifício-templo só tem significado se as pessoas se reunirem nele.
O templo é valioso se canalizar água
Muitos canos e pouca água. Ezequiel nos ofereceu uma visão poética de um templo que carrega e transmite água viva.
O templo, as estruturas eclesiásticas, podem ter acabado se tornando escritórios, cúrias ou meros encanamentos que não transportam água. Um templo, essas estruturas, são valiosas se permitirem e trabalharem para garantir que a água da vida eterna flua e alcance a todos.
Oramos no salmo de hoje: a água corrente nos canais de irrigação traz alegria à cidade de Deus.
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