09 Outubro 2025
Conflito prolongado colapsa sistema de saúde e dificulta atendimento médico em todo o território.
A reportagem é de Gustavo Kaye, publicada por Agenda do Poder, 02-10-2025.
A guerra em Gaza deixou mais de 167 mil pessoas feridas desde o início do conflito entre Israel e o grupo Hamas, há quase dois anos. Entre elas, pelo menos 42 mil — incluindo 10 mil crianças — sofreram ferimentos que mudaram suas vidas, segundo relatório divulgado nesta quinta-feira pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A crise expõe um sistema de saúde já precário, marcado pela superlotação, destruição de unidades e bloqueios à entrada de suprimentos médicos.
Lesões e amputações
O maior grupo de feridos apresenta traumas nos braços ou pernas, com mais de 22 mil casos. Queimaduras graves afetam 3,3 mil pessoas, enquanto danos na coluna vertebral e no cérebro atingem 2 mil e 1,3 mil pacientes, respectivamente. Pelo menos 5 mil indivíduos tiveram membros amputados. O número de fisioterapeutas também despencou: dos 1,3 mil profissionais em Gaza, muitos foram deslocados e ao menos 42 morreram. Atualmente, o enclave conta apenas com oito técnicos especializados em próteses.
Falta de recursos essenciais
A OMS alerta para a escassez crítica de itens hospitalares como curativos e luvas, dificultando o atendimento a pacientes com traumas complexos, especialmente ferimentos no rosto e nos olhos. O acesso de suprimentos ao território continua bloqueado, agravando a crise humanitária.
Hospitais à beira do colapso
Nenhuma das 36 unidades de saúde de Gaza está plenamente funcional. Apenas 14 permanecem parcialmente ativas. No Hospital Nasser, maior unidade ainda em operação parcial, a situação é descrita como “catastrófica”: incubadoras projetadas para 17 recém-nascidos abrigam hoje 26 bebês, que compartilham o mesmo equipamento. “A situação nos hospitais passou da guerra ao inferno”, afirmou Rik Peeperkorn, representante da OMS para os territórios palestinos. Rafah, cidade do sul, perdeu totalmente suas três unidades hospitalares, tornando-se uma zona militarizada sem infraestrutura médica.
Impactos a longo prazo
Relatório anterior da OMS indicava que ao menos um quarto dos feridos precisariam de reabilitação de longo prazo ou vitalícia. Além disso, estima-se que mais de 1 milhão de palestinos — metade da população de Gaza — apresente algum grau de sofrimento psicológico devido ao conflito. Segundo Peeperkorn, “a rapidez com que o sistema de saúde colapsou foi chocante. Gaza tinha indicadores de saúde melhores do que muitos de seus vizinhos antes da guerra”.
Dificuldades na evacuação
Cerca de 7,8 mil pacientes foram removidos do território desde o início da guerra, mas a demanda é muito maior: pelo menos 15,6 mil pessoas precisam de atendimento especializado fora de Gaza, incluindo 3,8 mil crianças. A OMS alerta que a eletricidade cortada e a impossibilidade de acesso de profissionais e suprimentos transformam hospitais parcialmente funcionais em unidades mínimas ou totalmente inoperantes. “Pacientes e profissionais de saúde não deveriam ser atacados”, concluiu Peeperkorn.
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