22 Julho 2025
O exército israelense reiterou a proibição de acesso ao mar aos pescadores de Gaza no dia 12 de julho, aumentando a ameaça de fome aos sobreviventes que se acumulam nas praias do território palestino. Quem não obedece é alvo de tiros. Nesse domingo (20), tiros do exército israelense teriam deixado ao menos 93 pessoas mortas em local de distribuição de ajuda humanitária. Israel contestou a informação.
A reportagem é de Rami El Meghari, publicada por Rfi, 21-07-2025.
Na praia de Gaza, as barracas substituíram há muito tempo os guarda-sóis. Elas abrigam centenas de famílias, cada dia mais numerosas obrigadas a se refugiar no litoral do território. Hussein Abou Hussein é um desses refugiados. “Era uma área turística aqui. Agora, é proibido ir no mar e vemos os pescadores sendo alvo de tiros”, descreve ele.
No dia 12 de julho, um porta-voz do exército israelense, Avichay Adraee, reiterou em uma mensagem em árabe no X a proibição de acesso ao mar em toda a faixa de Gaza. O comunicado visava os “pescadores, nadadores e mergulhadores”.
“Entrar no mar pela praia de toda a faixa de Gaza coloca suas vidas em perigo”, advertiu o texto. Mesmo antes do novo anúncio do exército israelense, o mar já era um cemitério para os pescadores palestinos.
"Atiram contra nós todos os dias"
“Como ontem, todos os dias atiram contra nós”, lamenta Mohamed El Hessi, 73 anos. O ex-dirigente do sindicato dos pescadores local não tem coragem de ir muito longe com as pequenas embarcações que ainda tem.
Outros pescadores correm riscos mortais.
“Eles tentam trazer peixes, não têm escolha”, afirma. “Eles pensam que se for para ser morto, que seja tentando sobreviver. Como você pode ver, nos hospitais há pessoas que morrem de fome por falta de comida”, completa
Ser pescador em Gaza é ver seu horizonte se reduzir, guerra após guerra. O filho de Mohamed, Hazem, herdou a determinação do pai e continua a tradição familiar.
“Eu continuo fiel à minha profissão. Eles podem proibir, assediar quanto quiserem, nós continuaremos, pois não temos outra opção”, afirma.
Assim, apesar do medo e das centenas de mortos no mar, pai e filho continuam na praia consertando suas redes de pesca para não desaparecerem completamente.
Dezenas de mortos em local de distribuição alimentar
Nesse domingo, pelo menos 93 pessoas morreram no norte da faixa de Gaza, enquanto tentavam buscar alimentos, relatou o Ministério da Saúde do território. Segundo essa fonte, as mortes foram provocadas por tiros do exército israelense, que contestou a informação. Um comunicado militar afirmou que estava no local protegendo um comboio humanitário de um ataque.
Desta vez, as mortes não aconteceram perto de um dos pontos de distribuição da Fundação Humanitária de Gaza (GHF), mas no norte do enclave, perto do ponto de passagem de Zikim. A GHF, administrada por Israel com o apoio dos Estados Unidos e encarregada das distribuições de alimentos na faixa de Gaza, nega qualquer envolvimento.
De acordo com a mídia e hospitais locais, as vítimas aguardavam a passagem de caminhões de ajuda humanitária. Testemunhas relatam que o exército israelense disparou contra a multidão que esperava a chegada do comboio.
Segundo a ONU, 25 caminhões deveriam entrar em Gaza no domingo para responder à urgência da ameaça de fome no território. A organização internacional condenou a violência inaceitável contra pessoas famintas.
Exército israelense afirma ter protegido o comboio humanitário
O exército israelense reconheceu ter atirado, mas apenas com o objetivo de proteger o comboio e em resposta a uma ameaça de ataque. Os militares também contestam o pesado balanço de mortos e indicam que os detalhes do incidente ainda estão sendo investigados.
Também nesse domingo, as forças israelenses ordenaram a evacuação do centro de Gaza, incluindo toda a zona sul de Deir al Balah, até então poupada das ofensivas terrestres.
O porta-voz do exército israelense mandou a população se dirigir à zona de Mawasi, na costa sul, designada como zona humanitária por Israel. No entanto, essa área não está isenta dos bombardeios israelenses, ressalta a enviada especial da RFI Aabla Jounaïdi.
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