25 Novembro 2024
Anna Foa, historiadora e ex-professora da Universidade La Sapienza, há muito tempo estuda a história dos judeus na Europa e na Itália. Em seu último ensaio, Il suicidio de Israele (O suicídio de Israel), ela argumenta que a única chave para o futuro é renovar a ideia de um Israel que acabe com a ocupação, favoreça a criação de um Estado palestino e reafirme a igualdade entre seus cidadãos. Uma política a ser contraposta ao “supremacismo judaico” do atual governo.
A entrevista é de Lara Crinò, publicada por La Repubblica, 24-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Esperava o mandado de prisão contra Netanyahu emitido pelo Tribunal Penal Internacional em Haia?
Uma decisão tinha que ser tomada, já que havia um julgamento pendente. É interessante que a acusação não seja de genocídio, mas de crimes contra a humanidade e crimes de guerra. E vamos refletir sobre o fato de que o massacre de civis é suficiente para se enquadrar nesses casos. Em Israel está se intensificando o clima de "estamos sendo perseguidos, só podemos nos fechar em nossa bolha e continuar fazendo o que estamos fazendo sem questionar nada". Espero que seja apenas a reação da direita e do governo, mas no momento também tem efeitos sobre a esquerda.
Por quê?
O trauma de 7 de outubro afiou as unhas da oposição. A decisão do Tribunal pode levar a uma retração sobre si mesmos.
Il suicidio de Israele, de Anna Foa (Foto: Divulgação)
O que pensa que Netanyahu vai fazer?
Declarar que os juízes são antissemitas consolida a imagem interna de um país cercado de inimigos. No momento, o governo é bastante sólido e ele pode pressionar sobre a hipótese de anexação dos assentamentos israelenses na Cisjordânia. Ou seja, algo que ponha fim a qualquer tentativa de criar um Estado palestino.
Você diz que Israel se fechou em uma bolha. Em vez disso, na diáspora, na Europa e nos EUA, o que está acontecendo?
Nas comunidades judaicas europeias, as vozes de oposição à linha de Netanyahu são bastante fracas. Os judeus europeus estão alinhados com o governo israelense com base na chantagem da sobrevivência de Israel e por causa do medo do aumento do antissemitismo. Nos Estados Unidos, a situação é mais instável, as oposições internas à comunidade judaica são mais ativas. Em geral, há um questionamento do direito internacional, das forças e dos princípios que foram criados para tornar as guerras menos atrozes e para evitar que atingissem os civis. Os tribunais internacionais são vistos como a longa manus do antissemitismo terceiro-mundista.
A declaração do Papa sobre genocídio também foi lida sob uma perspectiva antissemita.
O Papa disse que devemos avaliar se o que está acontecendo em Gaza é ou não genocídio. Acho que ele fez seu trabalho como líder de uma religião universal e muito ampla. Precisamente porque o antissemitismo existe, precisamos ter os critérios para distingui-lo, para estabelecer parâmetros. Certamente é antissemitismo afirmar que os judeus devem ser jogados ao mar e que Israel deve desaparecer. Mas como devemos julgar aqueles que dizem que os palestinos devem ser expulsos e que o que deveria se tornar o Estado palestino deve ser considerado Israel?
Existe uma saída para o fato de Israel não dialogar mais com os Estados que poderiam ser seus interlocutores?
O governo só reforça o isolamento em que Israel está preso. Somente com dois governos diferentes, tanto em Israel quanto nos Territórios Autônomos Palestinos, pode haver alguma esperança. Além disso, há as forças internacionais que devem intervir e planejar a reconstrução de Gaza. Mas tudo isso parece difícil de implementar.
A quem e a que se se deveria apelar para reiniciar uma esperança para o futuro?
Acredito que as forças de uma possível mudança, apesar de tudo, sejam mais fortes em Israel do que em qualquer outro lugar. Lembremos que houve uma forte oposição e que precisa ser retomada. Espero que, diante de coisas inenarráveis, como a possibilidade de uma anexação da Cisjordânia, retome vigor. Depois disso, acredito que a diáspora deveria apoiar a oposição e que deveria haver uma unidade do mundo judaico para que Israel mude de política. Essa é a única salvação. Talvez não desmorone como Estado, mas se não mudar de rumo, Israel perderá sua alma, força e capacidade de interpretar o mundo e viver nele.
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“Criticar Netanyahu não é um ato de antissemitismo. Ou o país muda ou ficará sozinho”. Entrevista com Anna Foa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU