26 Setembro 2024
"Nestes dias de encontro também confirmamos as lutas de resistência que as mulheres indígenas realizam com a ternura da nossa rebelião que continua apontando a injustiça que nos destrói e tenta nos exterminar. Mas neste caminho temos a força da espiritualidade que nossos antepassados nos deixaram. É uma espiritualidade que está viva e nos fala de forma imperativa para despertar as nossas consciências e nos dá a ternura para nos comprometermos com esta luta comum dos povos indígenas que querem construir um outro mundo possível para as nossas filhas e os nossos filhos", afirma a mensagem final do Encontro da Rede de Solidariedade e Apostolado Indígena da Conferência dos Provinciais da América Latina e do Caribe (CPAL) da Companhia de Jesus.
Com mais de 65 participantes, entre lideranças indígenas e jesuítas da América Latina, o encontro aconteceu em Manaus, de 16 a 20 de setembro 2024, na Casa de Retiros Irmão Vicente Cañas e teve como tema "Abya Yala: extrativismo, mulher e resistências". A mensagem foi publicada no dia 25-09 pela CPAL.
– Ah, filhos nossos! Partimos, voltamos; recomendações saudáveis e sábios conselhos lhes deixamos. E vocês também, que vieram de nossa pátria distante, “ó esposas nossas!”, contaram às suas esposas e se despediram de cada uma delas. Voltamo-nos para o nosso povo, Nosso Senhor dos Cervos já está no seu lugar, manifesto está no céu. Vamos começar o regresso, cumprimos a nossa missão, os nossos dias acabaram. Então pensem em nós, não nos apaguem da sua memória, nem nos esqueçam. Voltem a ver nossos lares e suas montanhas, estabeleçam-se aí e que assim seja! Continuem seu caminho e verão novamente o lugar de onde viemos. (Popol Wuj)
Reunimo-nos irmãs e irmãos das nações indígenas Wapichana, Warao, Apurinã, Omagua Kambeba e Sateré-Mawé do Brasil, Awajún, Wampís, Ashaninka e Quechua do Peru; Aimará e Quechua da Bolívia; Kichwa do Equador; Mapuche do Chile e Argentina; Guarani do Paraguai; Wayuu da Venezuela; Wapichana e Arawak da Guiana; Mestiço do Panamá; Maias Mam e K’iche’ da Guatemala; Rarámuri, Otomí-Ñuhü, Popoluca, Tzeltal e Nahuatl do México; Jesuítas que caminham com esses povos e organizações aliadas como Canadian Jesuits International (CJI) e Alboan, no encontro dos rios Negro e Solimões de Manaus - Brasil, onde duas correntes se unem para conceber a grande irmã Amazonas que dá vida a todas e todos. Desta forma também unimos os nossos pensamentos e os nossos corações para tocar as feridas que as empresas estrangeiras continuam a causar às nossas culturas e à nossa Mãe Terra com os seus projetos extrativistas de morte. Feridas ainda mais dolorosas devido à coalizão dos nossos próprios governos corruptos, líderes esgotados e igrejas insensíveis à dor do nosso povo e da nossa Casa Comum. Acima de tudo, são as mulheres que sofrem diferentes formas de violência, desde a participação limitada na tomada de decisões das suas próprias comunidades, até à perda de vidas para defender os seus territórios. Da mesma forma, vemos com preocupação a ausência de representantes dos povos indígenas nos congressos que discutem políticas públicas, com impactos na vida de suas comunidades.
Fomos formados no mesmo ventre de nossa Mãe Abya Yala, temos cordões umbilicais comuns que nos unem a uma espiritualidade que nos ordena a ver, saborear e tocar a vida do nosso povo, não apenas ouvindo e falando, mas abraçados ao nosso corações, ao nosso ser corpo e ao nosso ser terra e água. Por isso reafirmamos nosso compromisso de tornar visíveis as lutas e resistências das mulheres indígenas porque nossas selvas e montanhas, nossos territórios e nossas águas têm o rosto de uma mulher que resiste sabiamente a todos os ataques das estruturas de dominação, violência e injustiça.
Nestes dias de encontro também confirmamos as lutas de resistência que as mulheres indígenas realizam com a ternura da nossa rebelião que continua apontando a injustiça que nos destrói e tenta nos exterminar. Mas neste caminho temos a força da espiritualidade que nossos antepassados nos deixaram. É uma espiritualidade que está viva e nos fala de forma imperativa para despertar as nossas consciências e nos dá a ternura para nos comprometermos com esta luta comum dos povos indígenas que querem construir um outro mundo possível para as nossas filhas e os nossos filhos. É o que nos guia nos processos da nossa resistência. Ela nos comanda e ordena que ouçamos, acompanhemos e nos deixemos acompanhar pelo nosso povo. Ordena-nos fortalecer as nossas articulações com redes e organizações, fazendo alianças como a grande nação Abya Yala para defender os nossos territórios e a Mãe Natureza que neles vive. A nossa espiritualidade é também como a voz dos nossos avós que nos falam com ternura e carinho, dão-nos força e energia para continuar a lutar por Sumak Kawsay, dão-nos Sabedoria para que, com um único pensamento, uma única voz e um só coração lutemos por resistir e persistir para sobreviver como nações originárias.
E encerramos a nossa reunião atendendo aos mandatos de ouvir e dar espaço às mulheres. Comprometemo-nos como povos indígenas a manter viva a nossa visão de mundo, abraçar a nossa espiritualidade para não sermos derrotados, acompanhar-nos nas lutas sem deixar as mulheres de lado, continuar a luta pela defesa e demarcação dos nossos territórios como salvaguarda contra as ameaças de extrativismo.
Jallalla Povos Originários…! Jallalla Povos de Abya Yala…!
Casa de Retiros Irmão Vicente Cañas, SJ, Manaus, Brasil. 20 de setembro de 2024.
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Abya Yala: extrativismo, mulher e resistências. "Continuar a luta pela defesa e demarcação dos nossos territórios contra as ameaças de extrativismo" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU