06 Setembro 2024
"Para garantir o futuro da humanidade e da própria biosfera, precisa triunfar um consenso mínimo de natureza ética: o conjunto de visões, valores e princípios que mais congregam pessoas e melhor projetam um horizonte de vida e de esperança para todos", escreve Leonardo Boff, teólogo, filósofo e escritor.
Leonardo Boff escreveu Habitar a Terra: qual o caminho para a fraternidade universal (Vozes, 2022) e Como cuidar da Casa comum I: pistas para protelar o fim do mundo (Vozes, 2024).
Há uma percepção mais ou menos generalizada de que a vida humana no planeta Terra assim como se apresenta não pode continuar. Na verdade, ela se encontra numa encruzilhada: ou muda ou corre o risco de ir ao encontro de uma incomensurável tragédia ecológico-social. Há indicadores inegáveis. O mais sensível é o acelerado aquecimento global. Só em 2023 foram lançadas na atmosfera perto de 40 milhões de toneladas de CO2 que permanece na atmosfera por cerca de cem anos. O aquecimento até 1,5ºC projetado para 2030 foi antecipado.
Das nove fronteiras planetárias (Planetary Boundries: desde as mudanças climáticas até os microplásticos) seis já foram rompidas. Cientistas afirmam que se rompermos a sétima e a oitava pode ocorrer um desastre sistêmico, capaz de ameaçar a civilização. A disputa pelo domínio geopolítico do mundo entre os EUA, a Rússia e a China pode culminar numa hecatombe nuclear, deixando o céu branco pelas partículas atômicas, introduzindo uma nova era glacial, extinguindo grande parte da humanidade e da biosfera, tornando miserável da vida dos sobreviventes. E outras mais como a grave escassez de água potável.
Se quisermos sobreviver sobre o planeta Terra precisamos fazer várias travessias inevitáveis.
Essa é a grande “conversão ecológica global” exigida pelo Papa Francisco em sua encíclica Sobre o cuidado da Casa Comum (2015, n. 5). Em outro lugar diz: ”estamos no mesmo barco, ou nos salvamos todos ou ninguém se salva”.
Para garantir o futuro da humanidade e da própria biosfera, precisa triunfar um consenso mínimo de natureza ética: o conjunto de visões, valores e princípios que mais congregam pessoas e melhor projetam um horizonte de vida e de esperança para todos.
Seria a já denominada biocivilização ou a Terra da Boa Esperança que corresponde à Noosfera sonhada já em 1933 lá no deserto de Gobi na China por Pierre Teilhard de Chardin. Quer dizer, a esfera nova na qual mentes e corações convergem numa consciência coletiva de espécie, habitando a única Terra que temos.
Essa biocivilização é viável e está dentro das possibilidades humanas construí-la na observância da ética da Terra, feita de cuidado, de responsabilidade universal, de acolhida de todas as diferenças e do sentimento de habitarmos uma Casa Comum junto com com toda a comunidade terrenal e a comunidade de vida, sob o olhar benevolente do Criador “que ama tudo o que criou e que não odeia nada do que fez porque é “o soberano amante da vida” (Sab 11,24-26).
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Travessias necessárias para uma sociedade biocentrada. Artigo de Leonardo Boff - Instituto Humanitas Unisinos - IHU