22 Agosto 2024
O governo Lula não sabe o que fazer com o antigo presidente de extrema-direita, que continua livre e ativo apesar das múltiplas acusações que enfrenta.
O artigo é de Juan Arias, jornalista, publicado por El País, 22-08-2024.
O novo governo progressista de centro-esquerda do Brasil não sabe o que fazer com o ultradireitista Jair Bolsonaro, que, com quinze graves acusações atrás de si, permanece livre e ativo apoiando os seus candidatos nas emblemáticas eleições municipais de outubro próximo. Estas eleições são consideradas fundamentais para as eleições presidenciais de 2026, pois serão o primeiro teste à real força política da direita nos municípios onde o verdadeiro poder está concentrado.
Se quisesse, o governo Lula poderia tentar prender o seu antecessor, já que tem a maioria a seu favor dos membros do STF que deveriam condená-lo. Não o faz por medo, dizem nos meios políticos, de transformá-lo num mártir da extrema-direita que, mesmo derrotada nas eleições presidenciais, continua viva e bem e preparando os seus possíveis candidatos nas próximas eleições presidenciais.
Bolsonaro e seus acólitos sabem das dúvidas do governo sobre prender ou libertar o líder de direita. Até quando? O líder da extrema-direita está ciente das hesitações da justiça com ele e até permitiu que organizassem um evento público de massa em São Paulo contra o Supremo Tribunal no dia 7 de setembro, Dia da Independência da República, para medir a verdadeira força da direita.
Lula, com seu senso político de tantos anos de luta e de governo, deixa Bolsonaro por enquanto não apenas livre, mas atuante e até desafiante à esquerda. E o líder da direita derrotado nas urnas continua distribuindo a amigos e até chefes de Estado (o último, ao argentino Javier Milei) a medalha que mandou cunhar com os três "eus": imortal, imbrochavel (que nunca falha sexualmente) e incomível, por ser difícil.
Um curioso incidente ocorrido dias atrás no sul do país durante um comício, enquanto andava em um caminhão com alto-falantes, acabou adquirindo conotações políticas. De repente, enquanto Bolsonaro discursava aos seus seguidores, um enxame de abelhas pousou em seu rosto. Em vão tentou se livrar dos insetos que o assediavam e saiu correndo do caminhão enquanto o locutor aproveitava para parar o tiro e gritar no alto-falante que Bolsonaro é “tão doce que as abelhas tentaram comê-lo”.
A verdade é que entre a piada e a seriedade, a dúvida do governo sobre o que fazer com a extrema-direita, que continua a liderar a direita de todos os matizes, não é pequena. E é possível que se a ostentação de Bolsonaro revelar nas próximas eleições municipais que ainda tem um verdadeiro exército a seu favor, Lula terá que tomar alguma decisão tendo em vista as eleições presidenciais em que, por enquanto, ninguém de esquerda ou centro é capaz de derrotar a direita como um todo.
Talvez por isso Lula, que conhece muito bem a chita, apareça tão atuante até na política mundial que o fortalece em sua possível nova e quarta disputa presidencial em sua longa história política. Quantos anos ele terá em 2026, mais de 80 anos? Ele não está preocupado. Ele já avisou: “Já disse a Deus que vou viver 120 anos”. Se algo não falta naquele que o antigo presidente dos EUA, Barack Obama, certa vez chamou de “o político mais popular do mundo”, é o otimismo político. Talvez por causa desse otimismo ele continue deixando Bolsonaro vivo e bem. Ele não parece temê-lo. Contudo, as pesquisas de outubro começarão a decifrar esse não pequeno enigma político brasileiro.
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A extrema-direita brasileira. Bolsonaro e o enxame de abelhas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU