Ataque vaticano e raiva espanhola: a tensa reunião dos bispos após o encontro com Francisco

Foto: Vatican Media

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11 Mai 2024

O ataque ocorreu logo depois de o papa sair da porta da sala e não teve como alvo a gestão errática e errada dos abusos – incluindo o relatório Cremades –, de cuja relutância com esse assunto todos estão conscientes em Roma. Os ataques a que os espanhóis bispos foram submetidos se baseavam no relatório elaborado pelos visitadores apostólicos.

A reportagem é de José Lorenzo, publicada em Religión Digital, 09-05-2024. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Os bispos começam a se mexer desconfortavelmente em seus assentos. Uns mais do que outros, é verdade. Não entendem por que esse documento não lhes foi entregue antes, ou pelo menos que o secretário – o prefeito não fala espanhol nem italiano, enfatizam outras fontes presenciais – tivesse lhes dado um resumo. O que ouvem “é uma descrição desastrosa” dos seminários espanhóis.

Um dos seminários que aparece com mais destaque é o de Toledo, o que teria causado a ira do arcebispo da sé primal. Mas naquele momento – o encontro com o dicastério durou apenas uma hora e meia – já havia muitos bispos espanhóis “irritados”.

“Com termos de ordem e de comando, chegam a dizer que é preciso mudar um sistema de formação que só consegue fazer padres para a sacristia e que é preciso pôr fim também à ‘fuga’ de seminaristas para os centros de formação com os quais os candidatos ao sacerdócio sentem mais afinidade, como o de Toledo ou o de Bidasoa, do Opus Dei.”

“O papa não puxou as nossas orelhas.” Foi com esse resumo que o então presidente da Conferência Episcopal Espanhola (CEE), Juan José Omella, resolveu com seu sorriso de sempre as especulações sobre o insólito encontro que todos os bispos espanhóis haviam acabado de ter com o Papa Francisco no Vaticano, no dia 28 de novembro passado, após o apelo de Roma para abordar a questão dos seminários maiores espanhóis e o relatório elaborado após a visita apostólica realizada por dois bispos uruguaios a todas as dioceses durante os meses de janeiro e fevereiro de 2023.

E, embora boa parte da imprensa que comparecia naquele dia no Pontifício Colégio Espanhol San José, em Roma, não conseguia acreditar nas explicações da cúpula da CEE, o cardeal arcebispo de Barcelona não mentia. Ou, pelo menos, não dizia toda a verdade: não houve uma repreensão em relação à questão dos abusos sexuais, como havia sido comentado diante do precedente dos bispos chilenos, também convocados de forma expressa e que deixaram o Vaticano com o pedido de renúncia de. todos eles por sua nefasta gestão dos abusos na Igreja.

O ataque ocorreu logo depois de o papa sair da porta da sala e não teve como alvo a gestão errática e errada dos abusos – incluindo o relatório Cremades –, de cuja relutância com esse assunto todos estão conscientes em Roma. Os ataques a que os espanhóis bispos foram submetidos se baseavam no relatório elaborado pelos visitadores apostólicos, e parece que eles não gostaram muito do que puderam ver.

Muitos bispos começavam a respirar aliviados, passada a tensão de nem sequer saberem realmente para que tinham sido convocados e temendo, sim, no fundo, “a bronca” sobre a política antiabusos da CEE.

“O papa ficou menos de uma hora, cerca de 50 minutos, e, com o tom cordial de sempre, falando do papel dos sacerdotes, que devem se formar para estar no meio do mundo e não na sacristia… Convidando a falar e a dialogar com ele. Foi tudo muito amável”, disseram fontes com conhecimento de primeira mão do que aconteceu naquela manhã histórica para a Igreja espanhola.

Depois de um intervalo de meia hora para o café, ao entrarem novamente na sala, os bispos espanhóis ficaram a sós com o prefeito do Dicastério para o Clero, o cardeal sul-coreano Lazzaro You Heung-sik, e seu secretário, o chileno Andrés Gabriel Ferrada Moreira. Um documento de cerca de 30 páginas foi distribuído aos prelados e começou a ser lida, por províncias eclesiásticas, uma análise do que Roma entende que está acontecendo nos seminários espanhóis.

Os bispos começam a se mexer desconfortavelmente em seus assentos. Uns mais do que outros, é verdade. Não entendem por que esse documento não lhes foi entregue antes, ou pelo menos que o secretário – o prefeito não fala espanhol nem italiano, enfatizam outras fontes presenciais – tivesse lhes dado um resumo. O que ouvem “é uma descrição desastrosa” dos seminários espanhóis.

Um dos seminários que mais aparece no relatório é o de Toledo – conforme indicado ao Religión Digital –, o que teria causado a ira do arcebispo da sé primal, e, além disso, no ano em que se comemora o 50º aniversário da carta pastoral com a qual o emblemático cardeal Marcelo González refundou o seminário da arquidiocese.

Mas naquele momento – a reunião com o dicastério durou apenas uma hora e meia – já havia muitos bispos espanhóis “irritados”.

O cardeal e o secretário do dicastério os exortaram a implementar as reformas à luz da Ratio fundamentalis institutionis sacerdotalis, aprovada pela Santa Sé em 2016, e da Ratio nationalis aprovada pela plenária da CEE em 2019, e que é uma cópia da romana, feita conjuntamente com os responsáveis anteriores do órgão vaticano, o cardeal Stella e o arcebispo Patrón Wong.

“Com termos de ordem e de comando, chegam a dizer que é preciso mudar um sistema de formação que só consegue fazer padres para a sacristia e que é preciso pôr fim também à ‘fuga’ de seminaristas para os centros de formação com os quais os candidatos ao sacerdócio sentem mais afinidade, como o de Toledo ou o de Bidasoa, do Opus Dei.”

Nesse contexto, também veio à tona o chamativo florescimento dos seminários Redemptoris Mater, do Caminho Neocatecumenal, com estatutos particulares. “Os kikos estão muito indignados – asseguram as fontes consultadas –, seus seminaristas vivem em uma espécie de cápsula do Caminho Neocatecumenal, e temos problemas com os que ficam na diocese, à espera de irem embora para as missões”, afirma uma das fontes.

Mas não eram os únicos incomodados, como o Religión Digital chegou a comprovar, sobretudo – atesta um bispo – pelo tom, a tal ponto que o cardeal Omella teve que intervir para tentar amenizar o escândalo e garantir que as medidas que estavam sendo postas sobre a mesa pelos responsáveis vaticanos “serão implementadas por nós”.

“Tremendo, saímos de lá com uma raiva generalizada por parte de toda a Conferência Episcopal”, assinala um deles, e nem é um dos mais afetados, muito pelo contrário.

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