Liturgia do Dia Mundial de Oração gera desconforto na Alemanha

Foto: Jack Sharp | Unsplash

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20 Fevereiro 2024

A guerra em Gaza extrapolou o conflito bélico e adentrou no campo litúrgico provocando fissuras inesperadas. O Comitê Nacional do Dia Mundial de Oração da Alemanha censurou o programa celebrativo preparado por mulheres palestinas, modificando-a ao excluir qualquer menção a nakba, que, em árabe, significa catástrofe, remetendo ao êxodo forçado de palestinos em 1948.

A reportagem é de Edelberto Behs.

Para o comitê alemão, a palavra é “politicamente carregada, polissêmica e ambígua”, e está “intimamente ligada ao completo questionamento do Estado de Israel”. A liturgia do Dia Mundial de Oração gerou forte reação na Alemanha, tanto que o comitê decidiu alterar o programa litúrgico.

O Dia Mundial de Oração foi introduzido em 1887 por mulheres cristãs dos Estados Unidos. Atualmente, ele é celebrado todos os anos na primeira sexta-feira de março em mais de 120 países. A escolha das palestinas para a elaboração do programa litúrgico do Dia Mundial de Oração para 2024 foi definida há dois anos, muito antes, portanto, do ataque do Hamas em 7 de outubro passado.

Também na Suíça, assim que foi divulgado que a liturgia do Dia Mundial de Oração 2024 foi elaborada por mulheres palestinas, “entramos na mira dos círculos cristãos pró-israelenses”, confidenciou a presidenta do Comitê suíço, Vroni Peterhans, à repórter Anne-Sylvie Sprenger, do Portal ProtestInfo, da Igreja Reformada Suíça.

Mas o comitê suíço manteve o texto original. “Optamos por confiar nas mulheres dos grupos de preparação locais”, relatou a representante do Comitê para a Suíça francófona, Carola Kneubühler.

A Igreja Evangélica Reformada da Suíça (EERS) decidiu publicar “recomendações” às comunidades, sublinhando que o Dia Mundial de Oração é uma iniciativa ecumênica independente. “Há 30 anos, a Palestina já era um país organizador, causando muitos debates acalorados nas igrejas e, em alguns casos, tensões significativas”, o que se verifica mais uma vez neste ano, gerando “uma polêmica que não poupa a nossa própria comunidade eclesial”, diz o documento dos reformados.

 “Querer celebrar a nossa solidariedade com os nossos irmãos e irmãs na Palestina, evitando a palavra nakba, esvazia essa solidariedade de significado e equivale a trair um elemento da liturgia que é essencial para elas”, expressou-se nas redes sociais o ex-secretário executivo do Conselho Mundial de Igrejas no período 1978-2004, Hubert van Beek.

As mulheres palestinas não deixaram por menos. Em carta dirigida ao Comitê do Dia Mundial de Oração da Alemanha, elas lembraram que a essência desse Dia reside na celebração da diversidade. “No entanto, a sua decisão de modificar unilateralmente a nossa liturgia mina os princípios fundamentais que este evento global pretende alcançar”.

As mulheres alemãs do Comitê do Dia alegaram que não se trata de censurar o texto preparado pelas palestinas, mas é apenas uma “contextualização da situação particular da Alemanha”. Argumentaram, ainda, que “o terror do Hamas de 7 de outubro e a guerra em Gaza reduziram ainda mais a vontade de muitas pessoas na Alemanha de acolher as experiências palestinas”.

A presidenta do Comitê francês, Christiane Brinkert, afiançou que não vão alterar o texto das palestinas. Ela apontou que não dá para confundir Palestina com o Hamas. “O conflito no Oriente Médio atinge duramente a Alemanha. Por causa do seu passado, os alemães sentem-se um pouco obrigados a apoiar mais Israel”, alfinetou.

A pastora luterana Sally Azar, presidenta do comitê palestino, frisou que “o apoio à Palestina na sua busca por justiça e paz não deve ser equiparado ao antissemitismo ou à rejeição de um grupo específico. Nosso apelo à humanidade e à compaixão transcende a religião ou as afiliações políticas”.

O Comitê Internacional do Dia Mundial de Oração, com sede em Nova Iorque, não aprovou a modificação introduzida pelas alemãs. “Estamos empenhadas em estar ao lado das nossas irmãs na Palestina. A sua liturgia foi desenvolvida seguindo um processo rigoroso envolvendo o nosso comitê executivo e finalizada em setembro de 2022”, historiou a sua presidenta executiva, Katie Reimer.

Ela destacou:

Não recomendamos nenhuma mudança nessa liturgia. Como todos os anos, pedimos aos comitês nacionais que honrem as vozes das mulheres que nos convidam a rezar com elas.

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