05 Dezembro 2023
"Trata-se de estar convencidos de que a polis, a communitas, não é possível sem a contribuição de bens comuns materiais e imateriais; que não é verdade que a boa vida de uma sociedade se realiza graças à autorregularão dos mercados; e que a expressão “bem comum” deve voltar a ser um “norte” para todos os membros da sociedade", escreve Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, membro da comunidade Casa Madia, em artigo publicado por La Repubblica, 04-12-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Para onde foi a noção de bem comum? Que fim levou?
Bem comum é um conceito essencial para a convivência, para a qualidade de vida na polis.
A expressão é composta por duas palavras: “bem” e “comum”. “Bem” significa o que gostaríamos e o que desejamos para as pessoas às quais estamos ligados. O bonum, o bem é o que os homens e as mulheres desejam para viver bem e em plenitude. “Comum” deriva do latim communis, que indica uma tarefa realizada juntos e também um dom partilhado. Bem comum, portanto, não é simplesmente um patrimônio comum, algo material ou imaterial possuído juntos, mas é o conjunto das condições de vida que favorecem o bem-estar, a humanização de todos: a democracia, a cultura, etc. também são um bem comum.
Bonum commune é um conceito formulado no momento em que estava emergindo o Ocidente, no século XIII. Seguindo Aristóteles, foi Tomás de Aquino quem observou que, tal como a sociedade, a rede das relações, é anterior ao indivíduo-pessoa, assim como a unidade do corpo é anterior aos membros que o compõem. Então o bem de cada um precisa do bem comum que o precede e no qual possa se definir. Nos séculos seguintes esse conceito de bem comum foi posto de lado em favor da concepção individualista e utilitarista da sociedade, e se impôs a ideia segundo a qual a organização política da sociedade se justifica pelo fato de garantir aos seus membros os direitos individuais de que seriam dotados antes de sua existência social.
Na atual crise em nível mundial, está voltando a investigação sobre o bem comum. Ser humanos junto é o elemento vital, indispensável à nossa existência como pessoas.
Estar entre os homens, viver as relações não é apenas o que nos humanizou, mas é também a primeira forma do bem que os homens conhecem, um bem comum. Sem um ecossistema relacional não há caminho de humanização. Eis então o bem comum acima dos interesses particulares e dos egoísmos competitivos.
Existem bens comuns que pertencem à coletividade, úteis a toda a sociedade, bens tangíveis como a água, o ar, a terra, os monumentos, a paisagem: são bens comuns essenciais para alcançar “o bem comum”. Na Constituição italiana não se fala em “bem comum”, mas expressões como “utilidade social” (art. 41) e “utilidade geral” (art. 43) indicam que há um transcender o interesse privado em nome da communitas, da sociedade. A communitas, a polis, tem direitos de propriedade que criam bens comuns, retirados da prerrogativa dos indivíduos: esses bens instauram outra forma de possuir, que ajuda o bonum commune.
Trata-se de estar convencidos de que a polis, a communitas, não é possível sem a contribuição de bens comuns materiais e imateriais; que não é verdade que a boa vida de uma sociedade se realiza graças à autorregularão dos mercados; e que a expressão “bem comum” deve voltar a ser um “norte” para todos os membros da sociedade.
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Paixão pelo bem comum. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU