17 Outubro 2023
As mudanças climáticas têm impactos diferentes sobre homens e mulheres, especialmente no Sul global.
A reportagem é de Andi Misbahul Pratiwi, doutoranda na Universidade de Leeds, publicada por The Conversation, 12-10-2023. A tradução é do Cepat.
Essas diferenças se devem à cultura patriarcal. As mulheres com frequência não estão envolvidas na elaboração de respostas para os problemas ambientais. São muitas vezes excluídas dos debates sobre as soluções para a crise climática.
Deixar as mulheres de lado na elaboração de soluções ambientais coloca-as em posições mais vulneráveis. Quando ocorrem fenômenos relacionados às mudanças climáticas – tais como condições meteorológicas mais extremas, incêndios florestais ou inundações – as mulheres e as meninas suportam um fardo mais pesado e sofrem impactos mais severos. A violência contra as mulheres também está aumentando devido ao aquecimento global.
No entanto, temos de mudar a narrativa de que as mulheres são meras “vítimas” da crise climática. Na realidade, as mulheres nos países do Sul global também possuem a capacidade e a força para proteger o ambiente. E demonstram-no através de diversas ações, tanto formais como informais, tanto individuais como coletivas.
Historicamente, as mulheres desempenharam um papel importante na proteção ambiental nos países asiáticos e sul-americanos.
Um exemplo é o movimento ambientalista Chipko na Índia, na década de 1970. A sua atividade começou em 1974, quando as mulheres e a comunidade indígena da aldeia de Reni lutaram para salvar a floresta da exploração madeireira que ameaçava a sua subsistência. Elas agiram coletivamente protegendo e abraçando as árvores para afastar os empreiteiros e evitar o desmatamento. A sua luta tornou-se global, causando um grande impacto em todo o mundo.
Durante a Conferência de Nairobi de 1985 sobre as conquistas da Década das Nações Unidas para as Mulheres, foi sublinhada a importância da conservação da natureza e das ações ambientais das mulheres. Nesta conferência foram discutidos testemunhos do movimento Chipko e de movimentos de mulheres semelhantes em outros países.
Além do movimento Chipko, há um exemplo recente em Zapotalito, cidade localizada na região do Parque Nacional Laguna Chacahua-Pastoría, no sul do México.
Zapotalito sofreu uma série de problemas ambientais, incluindo mortes em massa de peixes, um cheiro horrível de amônia e deterioração da qualidade do ar e da água. Tudo isso em consequência de um projeto de barragem e da contaminação de uma fábrica de óleo de limão.
Pois bem, as mulheres de Zapotalito trabalharam juntas para limpar o canal natural do manguezal de Oaxaca. Usaram pás e enxadas para realizar limpezas regulares em 2016. E mesmo enquanto lutavam por mudanças, continuaram com suas rotinas diárias. Cozinhavam, faziam tortilhas, limpavam as casas, cuidavam das crianças, cuidavam dos animais de estimação e das plantas e pescavam para consumo das famílias, mesmo em condições ambientais precárias.
Por outro lado, o movimento de mulheres em Chiquiacá, na Bolívia, protege desde 2017 a Reserva Nacional de Flora e Fauna de Tariquía contra a expansão das empresas de petróleo e gás na área.
Em 2019, bloquearam a entrada da área de conservação durante cinco meses para impedir a introdução de equipamentos de perfuração. As mulheres de Chiquiacá também protestaram nas ruas, impedindo ativamente qualquer desenvolvimento em suas terras. O que começou como um movimento local tornou-se uma poderosa ação coletiva que ainda está ativa e ganhou o apoio de milhares de pessoas na Bolívia.
Na Indonésia, as pescadoras de Java Central têm trabalhado para manter a sua comunidade em meio às mudanças climáticas desde 2020. A subida do nível do mar fez aumentar o risco de inundações nos seus bairros, forçando-as a tomar medidas através da colaboração com os políticos, aumentando a sensibilização e angariando fundos para a construção de pontes.
Infelizmente, as mulheres destes movimentos enfrentam com frequência ameaças, intimidações e violências. Os seus inimigos tentaram minar as suas ações, salientando que “as mulheres deveriam ficar quietas em casa e cuidar da cozinha”. Algumas delas chegaram inclusive a receber ameaças de morte.
No entanto, apesar destes desafios, elas continuam a lutar para proteger as suas terras.
As histórias acima demonstram que as mulheres são capazes de fazer a diferença no ativismo ambiental, desde as suas casas e comunidades até o cenário nacional.
A comunidade internacional também reconhece cada vez mais os seus esforços. Desde a década de 1990, cada vez mais políticas internacionais enfatizam a questão de gênero como um elemento crucial para a conservação da natureza e o desenvolvimento sustentável.
Por exemplo, a Declaração do Rio de Janeiro sobre Ambiente e Desenvolvimento de 1992 reconhece o papel vital das mulheres na gestão ambiental e no desenvolvimento.
A Plataforma de Ação de Pequim, criada em 1995, é uma resolução que apoia a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres em todo o mundo.
Os relatórios da Reunião Intergovernamental de Alto Nível sobre a Plataforma de Ação de Pequim na Ásia e no Pacífico destacam o vínculo fundamental entre as mudanças ambientais e o papel das mulheres como gestoras e fornecedoras de recursos naturais.
Há também a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação, de 2004, que destaca o papel crucial das mulheres nas áreas afetadas pela seca, especialmente nas regiões rurais dos países em desenvolvimento.
Documentos recentes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) destacam o papel fundamental dos movimentos locais de mulheres e das mulheres indígenas na definição de políticas e ações climáticas.
Numerosas políticas também promovem a participação das mulheres na agenda do desenvolvimento sustentável, embora, infelizmente, nem todos os países as adotem.
Apesar de serem severamente afetadas pelos danos ambientais, as mulheres continuam a demonstrar a sua capacidade de resistência e seus conhecimentos para enfrentar as mudanças climáticas.
Para potencializar o ativismo das mulheres, os governos de todo o mundo deveriam formular políticas que integrem o papel das mulheres nas estratégias de conservação e de desenvolvimento sustentável nas suas próprias nações.
É também crucial documentar o ativismo das mulheres. Tanto as medidas governamentais como as sociais são essenciais para evitar a simplificação excessiva das experiências das mulheres em vários países e para ir além da narrativa que as retrata apenas como vítimas. Levar em consideração as mulheres é um primeiro passo para encontrar novas e melhores soluções para os problemas ambientais.
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Como o ativismo ambiental das mulheres no Sul global pode criar um mundo melhor - Instituto Humanitas Unisinos - IHU