09 Junho 2023
Quando encontrei em seu consultório o professor Massimo Ammaniti, um dos mais atentos analistas da condição mental dos jovens, ainda não tinha saído o relatório da mais alta autoridade sanitária estadunidense que declarava corajosamente: “O uso excessivo de plataformas está aumentando os diagnósticos clínicos de ansiedade e depressão entre os adolescentes e os atendimentos nos prontos socorros devidos a autolesões e intenções suicidas: no início da adolescência, quando a identidade e o sentido de autoestima estão sendo formados, o desenvolvimento do cérebro é particularmente suscetível a pressões sociais, opiniões dos pares e comparação entre pares".
Ammaniti, que fala diariamente como psicanalista com cinco ou seis jovens, faz uma análise não menos alarmante do que aquela vinda dos EUA. Desde os tempos do lockdown, neste jornal tentamos chamar a atenção das autoridades e da sociedade civil para os efeitos que o “colapso” global teria sobre os mais jovens.
Ammaniti me fala. “De acordo com um estudo internacional com adolescentes, os transtornos de ansiedade passaram de 11 para 21% e de 10 para 23 os sintomas depressivos. Isso significa que um jovem em cada quatro está mal. É positivo que pais, professores e autoridades saibam disso. Um em cada quatro. Distúrbios alimentares e os fenômenos de autolesão se multiplicaram. E isso acontece especialmente entre as garotas e principalmente no início da adolescência. Há fenômenos de afastamento das escolas. No Japão nasceu o fenômeno dos Hikikomori, garotos que só saem à noite para não se encontrar com ninguém, que fecham as janelas, que se afastam do mundo”.
A entrevista com Massimo Ammaniti, professor no Departamento de Psicologia e Dinâmica Clínica da Universidade La Sapienza/Roma, é de Walter Veltroni, publicada por Corriere della Sera, 02-06-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Esses são os efeitos, multiplicados pela pandemia, mas quais são as causas?
O dado novo, pouco discutido, é a preponderância do grupo sobre a família. Os adolescentes são analisados com a abordagem do passado. Pensa-se, com Freud, que a adolescência seja o momento de uma pura revivescência de tipo edipiano. Ou seja, que o eixo seja a contestação do poder parental e a afirmação da própria autonomia através da explosão do desejo e das fantasias sexuais que contêm um efeito libertador e introduzem à dimensão do prazer a ser vivido. Naquele passado era na família que a socialização acontecia: almoços, passeios, partilha de experiências como ir ao cinema ou a um museu.
A relação tinha uma sua dimensão vertical. Era uma jaula a ser rompida, mas também aquela necessidade de liberdade era vital, natural, era uma forma de energia. Agora o grupo de pares é a academia onde se treina para a vida, aquela em que se molda o próprio self, a própria identidade, no fogo de uma relação de confronto com outros pares que te julgam, te acolhem ou te rejeitam. Mas tudo acontece, diferentemente do passado, numa dimensão pública, na fornalha das redes sociais que são impiedosas e competitivas.
É a sociedade sem pai, a sociedade dos irmãos...
Sim, mas os irmãos, os verdadeiros, não existem mais. Se você tem filho, já é muito. Isso aumenta a sensação de solidão. E assim tudo se desloca para a dimensão do grupo, em que prevalece constantemente a comparação com os outros, o medo de um julgamento que agora circula rápida e universalmente.
O adolescente espera reconhecimento do grupo e na forma como os outros olham para ele percebe a sua própria imagem. Mas no grupo, inevitavelmente, há competição, ciúme, às vezes subjugação e até mesmo a tendência a se tornar cúmplices. O grupo pode virar alcateia e muitas vezes a coesão, garantida por um chefe que tem a "manha oportunista", se dá pela violência contra garotas ou quem é mais fraco, seja um imigrante ou um marginalizado que dorme na rodoviária. Ninguém pensa que, no fundo, é como antes.
Se tem uma coisa que não se deve fazer é justamente isso. Identificar a experiência e o sofrimento dos jovens com a forma como seus pais passaram, no passado, aquela época da vida. ‘Quando eu tinha a sua idade...’ é a frase que mais os ofende, que mais faz com que se sintam ignorados, que acentua a sua solidão.
Quanto pesam as redes sociais nesta dimensão inédita do mal-estar juvenil?
As mídias sociais comportam muitas coisas que nenhuma geração conheceu antes. É preciso se autodefinir, é preciso colocar cara e corpo à mostra, se mede quantos lhe seguem. É muito fácil se tornar um perdedor ou ser marcado. É o pesadelo mais difundido. E de qualquer maneira se alimenta, no fundo, o medo de ser julgado pelos outros.
Cada um, por causa das redes sociais, tem ou pensa ter seu próprio público, mas aos 16 anos não se tem estrutura para suportar as tensões da exposição permanente...
Isso mesmo, isso desenvolve um medo paranoico dos outros e de seu julgamento, como se se estivesse sempre sob a espada de um tribunal permanente que pode ferir, até mesmo gravemente. Vamos pensar sobre os efeitos da pornografia de vingança para as garotas. Avalanches que podem destruir vidas em um momento, como o bullying nas redes sociais.
A perda da esperança também conta? Guerra, crise climática, incerteza para o trabalho. Como os jovens podem ver a luz no fim do túnel?
Por tudo isso e pela crise dos grandes sonhos coletivos, desapareceu a dimensão do projeto. Tudo é vivido no imediato, tudo é aqui e agora. Não existe ontem e não existe amanhã. E, além disso, não existem mais grandes referências, sonhos que inflamem o coração. A única foi Greta Thunberg, mas mesmo a sua mensagem corajosa e maravilhosa fala de um medo, mais do que de uma esperança.
Parece-me que este tempo seja dominada por uma palavra: ansiedade...
Existia também antes, claro. Mas era direcionada: o voto, o trabalho a encontrar, o amor a escolher. Agora é um sentimento generalizado e permanente, alimentado pela escuridão histórica e pela exposição permanente. A adolescência agora dura um tempo infinito.
Eu vejo até cinquentões que não aceitam que não são mais jovens. A saída daquela época da vida é acompanhada por uma plena assunção de responsabilidade individual e social. Agora chega tarde demais.
E também há poucas crianças. Fico triste ao pensar na véspera de Natal nas casas italianas. Vive-se mais e, portanto, há avôs, quando não bisavôs, pais e aí apenas uma criança, sobre a qual se derrama toda a atenção e que se torna central muito cedo, torna-se, e talvez permanecerá, todo-poderosa.
O que pais e professores devem fazer?
Eu entendo sua desorientação. Muitas vezes a família explodiu e os filhos têm que conviver com conflitos e distâncias. Os professores foram privados de seu papel social e contestados – pensamos nos terríveis chats de classe – até deslegitimar seu papel em homenagem à cruzada permanente contra a competência. Mas, no entanto, para um adolescente encontrar um professor entusiasmado, capaz de motivar e escutar, é um conforto enorme.
Os pais muitas vezes exageram, tentam ser amigos, até mesmo confidentes e depois facilmente perdem a paciência. Não devem ser intrusivos, mas precisam definir, tentando compartilhá-las, algumas regras. Eles não devem se deixar subjugar pela ansiedade, não devem pedir e dar demasiadas explicações, devem evitar um excesso de psicologização do desconforto.
Devem fazer com que se tenha vontade de falar e, para isso, devem estar dispostos a escutar.
Com que idade é correto que as crianças tenham um celular e é oportuno fixar regras para tempos de uso?
Agora as tecnologias muitas vezes funcionam como babás. As crianças são colocadas na frente de um vídeo para poder ficar em paz. Mas na minha opinião não é correto entregar um celular antes dos doze anos, não é certo que o usem depois das 21h30, e, sinceramente, também acho que na sala de aula se deveria ficar sem essas ferramentas que estão se tornando um membro mais que um meio de comunicação.
Restituir aos jovens, a possibilidade de desfrutar o tempo sem a segmentação típica das mídias sociais significa aumentar o limiar de sua possível concentração e propiciar tempo e liberdade para sua fantasia.
Outra palavra-chave, não apenas para adolescentes, é autoestima. Parece-me que há em toda parte uma necessidade frenética e frágil de certificação de si...
É também isso fruto da exposição precoce e selvagem de si mesmos em público. É um aspecto narcisista. Mas é toda a sociedade que cultiva a egolatria. Estamos sempre e apenas focados em nós mesmos, nos ensinam que o outro é um concorrente ou um perigo.
O que se deveria fazer perceber é que a autoestima não está ligada apenas ao julgamento dos outros ou do grupo, mas é resultado da superação dos próprios limites, da capacidade de se colocar à prova, da disponibilidade de perder para depois, quem sabe, vencer.
Uma última pergunta: em sua longa carreira de psicanalista, pensando nas diferentes épocas em que se encontrou com jovens neste consultório, já se deparou com uma situação tão dolorosa?
(O professor Ammaniti olha para mim e balança a cabeça): Antes o desconforto dos jovens era uma exceção, agora é uma epidemia. Deveríamos nos dar conta disso, a tempo. Há trabalho a ser feito, mas não se pode esperar.
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Crianças vítimas de ansiedade: 1 em cada 4 sente-se mal. Os celulares? Depois dos 12 anos. Entrevista com Massimo Ammaniti - Instituto Humanitas Unisinos - IHU