23 Março 2023
Dezoito anos depois de defender o mandante do assassinato de Dorothy Stang, o advogado paraense Américo Leal volta à banca de acusados de outro crime bárbaro: o duplo homicídio do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips. Ele integra a equipe de defesa de Amarildo da Costa Oliveira (“Pelado”), Oseney da Costa Oliveira (“Dos Santos”) e Jefferson da Silva Lima, (“Pelado da Dinha”), pescadores que foram denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) por matarem Bruno e Dom em uma emboscada em 5 de junho de 2022.
A reportagem é de Cícero Pedrosa Neto, publicada por Amazônia Real, 22-03-2023.
Américo Leal, no caso de Dorothy Stang, ficou conhecido por culpar a missionária norte-americana pela sua morte. “Ela veio a morrer fruto da própria violência que propagou em Anapu”, disse ele, em trecho reproduzido pela Folha de S. Paulo. Dorothy foi morta por um pistoleiro, na cidade de Anapu, Pará, em 2005. Segundo a justiça, o crime teve por mentor intelectual e mandante o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura (o “Bida”), cliente do advogado. Bida acabou sentenciado a 30 anos pelo crime.
Em 19 de setembro de 2013, durante uma audiência em que prometia “mostrar uma prova contundente” ao Ministério Público do Pará que poderia inocentar seu cliente, Leal chegou a insinuar, entre risos, que Dorothy não seria freira e estaria, na verdade, “a favor de um projeto de colonização da Amazônia pelos Estados Unidos”, noticiou o G1 à época.
À Amazônia Real, o advogado confirmou que compõe a defesa dos acusados. “A convite da doutora Goreth estamos na causa eu, doutor Gilberto Alves e Lucas Sá”, limitou-se a dizer, quando procurado pela reportagem. A advogada mencionada por Américo Leal é Goreth Rubim.
Os réus “Pelado”, “dos Santos” e “Pelado da Dinha”, conforme denúncia do MPF emboscaram, assassinaram, esquartejaram, enterraram e atearam fogo nos corpos de Bruno Pereira e Dom Phillips, é Américo Leal.
Após várias interrupções, por conta da instabilidade do sinal de internet no município de Tabatinga (AM), as audiências de instrução dos acusados pelos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dominic Phillips foram suspensas, na tarde desta quarta-feira (22), pela Justiça Federal. Só foram ouvidas até agora 4 das 12 testemunhas listadas. As demais testemunhas e os réus, Amarildo da Costa Oliveira (“Pelado”), Oseney da Costa Oliveira (“Dos Santos”) e Jefferson da Silva Lima, (“Pelado da Dinha”), que respondem por duplo homicídio qualificado e ocultação de cadáver, serão ouvidos em data ainda não definida pelo juiz Fabiano Verli, responsável pelo caso.
Manifestação em frente a sede da Funai em Manaus após a notícia da confirmação dos homicídios de Bruno Pereira e Dom Phillips.
(Foto: Alberto César Araújo | Amazônia Real)
Em nota, a Justiça Federal explicou que no primeiro dia de audiência, na última segunda-feira (20), apenas uma pessoa foi ouvida, o indigenista Orlando Possuelo, que trabalha na Equipe de Vigilância da União dos Povos do Vale do Javari (EVU/Univaja). Isso porque a audiência, marcada para começar às 8h (hora local), só teve início cinco horas depois, por conta da instabilidade de sinal de internet nos presídios de Catanduvas (PR) e Campo Grande (MT), onde os réus se encontram presos.
Já no segundo dia (21), três testemunhas foram ouvidas – uma delas na condição de informante. Nesta quarta-feira, “os trabalhos foram retomados às 8 horas e durante a oitiva da segunda testemunha do dia, mais uma vez, o ato precisou ser suspenso, por ausência de internet nos presídios. Após 2 horas de aguardo, sem que tenha havido a solução do problema de internet nos presídios, o magistrado encerrou a audiência”, informou a Justiça Federal.
À Amazônia Real, o advogado João Calmon, que atua como assistente de acusação em favor dos familiares de Bruno e Dom, disse que a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) é sólida e que acredita que o desdobramento das audiências de instrução levará os réus ao júri popular. As audiências são uma das etapas processuais e não julgam o mérito do caso, mas apenas se haverá um julgamento público ou não.
“A acusação espera que a produção de provas sob o crivo do contraditório reitere aquilo que foi apurado nas investigações, de forma a fundamentar a pronúncia dos acusados”, pontuou o advogado Calmon.
A reportagem ouviu queixas de testemunhas, que disseram ter se sentido “abandonadas” durante as audiências. Elas se sentiram acuadas durante a sabatina dos advogados dos réus sem que alguém pudesse defendê-las. “Não veio ninguém orientar a gente em nada. A gente veio para cá sem saber o que esperar”, relatou uma das testemunhas, que terão suas identidades preservadas pela Amazônia Real.
O advogado João Calmon não viu dessa forma. Disse que as testemunhas “não foram sabatinadas, mas inquiridas pela defesa dos acusados, pelos procuradores do MPF e pela assistência à acusação, o que é normal em um processo criminal”. Ele afirmou também que os representantes legais das vítimas e familiares estiveram presentes em todas as audiências e durante todos os testemunhos.
Bruno e Dom foram mortos no rio Itacoaí, no Amazonas, tríplice fronteira do Brasil, com o Peru e a Colômbia, no dia 5 de junho do ano passado. Eles foram vítimas de uma emboscada promovida pelos réus e encabeçada por Amarildo da Costa Oliveira, mais conhecido como “Pelado”, pescador ilegal que atuava na Terra Indígena do Vale do Javari. O caso, que chocou o mundo, expôs também a situação de vulnerabilidade e ameaças a que estão expostos os povos indígenas que habitam a região.
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Advogado que culpou Dorothy Stang defende assassinos de Bruno e Dom - Instituto Humanitas Unisinos - IHU