09 Novembro 2022
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comemora com sua esposa Rosângela Silva, à esquerda, e o companheiro de chapa Geraldo Alckmin, à direita, após derrotar o atual presidente Jair Bolsonaro em um segundo turno presidencial para se tornar o próximo presidente do país, 30 de outubro em São Paulo, Brasil.
A reportagem é de Lise Alves, publicada por Global Sisters Report, 08-11-2022.
Em uma das corridas presidenciais mais combativas no Brasil desde o retorno do país à democracia na década de 1980, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva venceu o atual presidente Jair Bolsonaro em 30 de outubro por menos de 1%. Lula, que foi presidente de 2003 a 2010, se tornará o 39º presidente do país ao tomar posse, em 1º de janeiro.
Enquanto Bolsonaro, um candidato de extrema-direita, encontrou apoio entre a agroindústria e os evangélicos para sua posição sobre agricultura e mineração na floresta tropical, bem como suas posições sobre liberdades familiares e individuais, tanto a esquerda quanto o centro político gravitaram em torno de Lula, que apoia uma maior distribuição de riqueza e direitos das minorias.
Bolsonaro fez campanha para acabar com a corrupção, afrouxar o controle de armas e fortalecer os valores familiares tradicionais. Mas depois de quatro anos de redução dos investimentos em programas sociais, afrouxamento das restrições ao desmatamento, ignorando as mudanças climáticas e minando os direitos indígenas, 50,9% dos brasileiros estavam prontos para dar uma chance a Lula.
Entre os milhares de brasileiros que saíram às ruas no dia 30 de outubro para comemorar os resultados das eleições estava Irmã Margareth Nunes Crispim da Silva, das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus.
"Quando fui para a Avenida Paulista no domingo após o resultado [das eleições], consegui gritar 'sem medo de ser feliz'", disse Crispim da Silva ao Global Sisters Report, referindo-se ao lema usado pelo partido de Lula.
“Os quatro anos de Bolsonaro, incluindo esses 2 anos da pandemia, foram um inferno na Terra”, acrescentou.
A irmã trabalha há oito anos com a SEFRAS (Grupo de Ação Social Franciscana), proporcionando aos imigrantes que chegam a São Paulo um lugar decente para morar, além de alimentação, encaminhamentos para serviços de saúde e assistência social. Ela disse que os últimos quatro anos foram particularmente difíceis por causa da pandemia e dos cortes financeiros nos programas sociais.
“Durante a pandemia, a SEFRAS montou uma barraca no Largo São Francisco para distribuir as refeições”, disse ela. "Vimos filas que não eram apenas de moradores de rua, mas de posseiros e famílias inteiras que moram no centro da cidade em busca de algo para comer. Às vezes, eles só comiam uma vez por dia."
Para ela, uma das primeiras coisas que o presidente eleito do Brasil deve fazer é lidar com o crescente número de pessoas que passam fome no país. Lula concorda, declarando em seu primeiro discurso como novo líder do Brasil que uma de suas primeiras ações seria tentar retirar o Brasil mais uma vez do Mapa da Fome das Nações Unidas, que inclui países onde mais de 2,5% da população enfrenta uma carência crônica de comida. Um relatório recente da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação mostrou que, no Brasil, mais de 4% de seus 214 milhões de habitantes vivem com algum tipo de insegurança alimentar.
O país foi retirado do mapa em 2014 principalmente graças aos planos de ação de segurança alimentar implementados durante os dois primeiros mandatos de Lula. O Brasil, no entanto, foi reinserido no mapa em 2018 devido a grandes cortes nas políticas socioeconômicas que reduziram os investimentos em programas de segurança alimentar.
Os resultados das eleições, no entanto, indicam que governar não será uma tarefa fácil para Lula, pois "Bolsonaro tem todo o seu povo [trabalhando] dentro do governo", disse Michael Mary Nolan da Congregação de Santa Cruz.
"Uma coisa é ganhar a eleição, mas ele não ganhou o governo", acrescentou, lembrando que nas eleições gerais deste ano, os partidos de direita ganharam mais representantes do que o partido de Lula, deixando seus aliados com uma confortável maioria no Senado e uma voz expressiva na Câmara dos Deputados.
Mas enquanto Lula provavelmente enfrentará forte resistência dentro do país, líderes mundiais no exterior expressaram apoio ao presidente eleito, incluindo o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, o presidente da França, Emmanuel Macron, e o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak.
"Envio meus parabéns a Luiz Inácio Lula da Silva por sua eleição para ser o próximo presidente do Brasil após eleições livres, justas e confiáveis", disse Biden em comunicado em 30 de outubro, divulgado minutos após o anúncio dos resultados oficiais das eleições. "Estou ansioso para trabalhar juntos para continuar a cooperação entre nossos dois países nos próximos meses e anos." (Bolsonaro foi um dos últimos líderes mundiais a parabenizar Biden em 2020.)
Nolan disse que acredita que Lula será "mais forte em assuntos internacionais", observando como Bolsonaro foi amplamente evitado no cenário mundial ao ameaçar retirar o Brasil da Organização Mundial da Saúde e dos acordos climáticos de Paris e retirar o país da ONU. endossou o Pacto Global para as Migrações, bem como a União das Nações Sul-Americanas.
Embora existam muitas questões urgentes para tratar, Nolan disse acreditar que uma das coisas mais importantes que Lula pode fazer relativamente rápido é reverter a ordem executiva que permite que os cidadãos carreguem armas.
"Acho que ele pode fazer algo sobre o controle de armas que, com o aumento da violência e da violência contra as mulheres, será muito importante", disse Nolan.
Outra questão que está na vanguarda da mente de Nolan são os conselhos sociais que Bolsonaro enfraqueceu ou extinguiu juntos, com Nolan esperançoso de que Lula restabeleça o conselho de Direitos Humanos em particular.
Entre outros desafios que Lula enfrentará, disseram as irmãs católicas, estão educação, saúde e emprego.
“Os desafios para o governo Lula não são poucos”, disse Irmã Rosa Maria Martins Silva, missionária scalabriniana que trabalha com imigrantes e refugiados. "Ele vai liderar um país muito polarizado. Essa polarização vai continuar atrapalhando a vida dos brasileiros. Retomar a harmonia não será fácil."
Martins Silva tem trabalhado incansavelmente com refugiados que buscam um porto seguro no Brasil. A scalabriniana, no entanto, disse que durante o governo Bolsonaro houve um aumento de denúncias de ações violentas contra esses refugiados.
“Nossa expectativa é que o novo presidente combata com veemência a xenofobia e o preconceito contra imigrantes e refugiados”, disse Martins Silva.
Ao todo, Martins Silva disse estar feliz pela saída do atual presidente e esperançosa em relação ao próximo governo: "Defino o período da presidência de Jair Bolsonaro como um pesadelo que parecia nunca ter fim".
Ela está tão esperançosa, de fato, que em um encontro entre Lula e padres e freiras católicos logo antes do segundo turno das eleições, Martins Silva deu a Lula uma cruz que ela recebeu em uma de suas missões.
A cruz foi feita com a madeira de um dos barcos que desembarcaram em Lampedusa, a ilha italiana que se tornou símbolo da tragédia humanitária de milhares de migrantes que tentam se refugiar na Europa.
Quanto ao que as irmãs católicas no Brasil podem fazer para ajudar o novo governo, tanto Nolan quanto Martins Silva concordam: trazer cidadãos para as discussões.
"Precisamos de uma população informada", disse Nolan. "Precisamos fazer o que o Papa Francisco pediu: manter uma consciência social. Precisamos de uma igreja que se envolva com questões sociais. Lula precisará prestar mais atenção ao papel que a população pode ter."
"A democracia nunca foi totalmente concluída no país", acrescentou Martins Silva, querendo dizer que "a população não participa das decisões políticas, muito menos tem opinião sobre elas. O governo precisa se aproximar da sociedade, ouvi-la, ouvi-la às suas opiniões, às suas dores, aos seus gritos, fazem dela protagonista no exercício dos direitos."
No geral, as irmãs no Brasil estão otimistas e ansiosas para ajudar a nova administração.
“Acredito que nós – religiosos que estamos no povo, nas comunidades – se cumprirmos bem o nosso papel, já seremos de grande ajuda para esta nova administração”, disse Crispim da Silva. “Precisamos assumir nosso papel de religiosas, de mulheres de esperança, para que possamos mudar gradualmente esse cenário”.
Martins concordou, lembrando os séculos de experiência que as religiosas têm na gestão da educação e da saúde no Brasil, e como "cabe ao novo presidente trocar ideias conosco sobre como melhorar a educação e a saúde neste país", disse a irmã scalabriniana.
“Como o próprio presidente Lula disse recentemente: 'A Igreja, especialmente a vida religiosa consagrada, tem muito a colaborar com a administração do Brasil'. "
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Eleições 2022. Irmãs Religiosas comemoram eleição de novo presidente, fim do 'pesadelo' de Bolsonaro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU