07 Novembro 2022
Em tradução inédita, o hunsrück plat tayty ganhou, pela Sociedade Bíblica do Brasil (SBB), o “Naye Testamënt” – o Novo Testamento – disponível para descendentes de alemães que ainda falam essa língua. No Brasil, a maior concentração de “hunsrücker” ocorre na região de Santa Maria do Herval, Nova Hartz e Estância Velha, municípios onde o idioma consta no currículo das escolas municipais.
A reportagem é de Edelberto Behs, jornalista.
O hunsrück plat tayty não é um dialeto, mas uma língua viva nos cinco continentes, frisou a professora Solange Hamester Johann, de Santa Maria do Herval e da equipe tradutora, durante o lançamento do “Naye Testamënt”, em São Leopoldo, na sexta-feira, 4. Ela existe há mais de 1500 anos, era falada inclusive por Carlos Magno. Atualmente, é língua oficial em Luxemburgo, Romênia, leste da Holanda. Nos Estados Unidos, ela está presente em 39 estados da federação e tem espaço inclusive na China.
Naye Testamënt (O Novo Testamento) lançado recentemente pela Sociedade Bíblica do Brasil. (Foto: Reprodução | Redes Sociais)
O livro tem valor espiritual, mas também ajuda a manter viva a cultura e idioma dos descendentes de alemães, arrolou a professora. O presidente da SBB, pastor Erni Seibert, frisou no lançamento que a Bíblia é o único livro no mundo em torno do qual pessoas se reúnem regularmente – em cultos, momentos de estudo – para a leitura de um trecho das Escrituras Sagradas.
Lembrou a dificuldade que representa uma tradução, porque tradutores devem levar em contra o contexto no qual o texto original foi escrito, mas também o contexto para o qual ele está sendo traduzido. “Tem arte na tradução”, destacou. Por isso, terminada qualquer tradução a SBB realiza uma retrotradução para conferir palavra por palavra desse processo.
A professora Mabel Dewes, da equipe tradutora, leu a passagem do evangelista Lucas que narra o nascimento de Jesus. Com um exemplo apenas, ela mostrou no que consistem dificuldades encontradas na hora de traduzir. O texto em português de Lucas 2, versículo 5, conta que [José] “levou consigo Maria, com quem tinha casamento contratado. Ela estava grávida”.
Acontece que no hunsrück não existe uma palavra para grávida. Depois de muito pesquisar, a alternativa encontrada foi traduzir o “estava grávida” por “un sii waar en khin am waarte”. Literalmente seria: e ela estava esperando uma criança.
A tradução do Novo Testamento para o hunsrück levou oito anos e foi realizada por três professoras de Santa Maria do Herval. O projeto foi bancado pela SBB, com apoio de doadores do exterior e do Brasil. A tiragem desta primeira edição é de 1 mil exemplares. Além de São Leopoldo, o Novo Testamento foi lançado também na Feira do Livro em Porto Alegre, na quinta-feira, 3.
Os maiores promotores do hunsrück no Brasil são missionários das Testemunha de Jeová, que visitam casa a casa nas regiões onde a língua é usada, como é o caso em região da Bahia. A língua está presente no Paraguai e na Argentina, também com a participação de pregadores das Testemunhas de Jeová. A professora Solange realizou alguns cursos de Capacitação de Professores para a Língua Hunsrück frequentados por missionários que, por sua vez, são multiplicadores em suas congregações.
Foi através de um pastor batista que atuava em Novo Hamburgo que a Dra. Úrsula Wiesemann, da Sociedade Internacional de Linguística, teve conhecimento do hunsrück usado na região colonizada por alemães. Ela desenvolveu uma ortografia para o idioma falado na América do Sul. Chegou a morar cinco anos em Santa Maria do Herval e motivou a produção de livros em hunsrück, que culminou com a tradução do Novo Testamento.
Para o início do próximo ano letivo a professora Solange pretende lançar um livro de verbos em hunsrück. Já existe disponível no idioma o “Te kleen Prins”, ou seja, o Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry, um livro clássico de contos e fábulas “Mayn lüpste Kexichttcher” (Minhas histórias preferidas), um livro de citações e um livro de contos bíblicos.