28 Outubro 2022
O secretário geral do Sínodo apresenta na Sala de Imprensa do vaticano o Documento para a etapa continental do caminho sinodal. Com ele, entre os relatores, o teólogo Coda, o jesuíta Costa e a especialista Anna Rowlands; também coligado do Japão o cardeal Hollerich. Sobre a questão de mais espaço para as mulheres: "Sua presença não deve ser a cereja no bolo, mas deve ser constitutiva".
A reportagem é de Salvatore Cernuzio, publicada por Vatican News, 28-10-2022.
"Não estamos empurrando nenhuma agenda. Era nossa responsabilidade devolver ao povo de Deus o que nos foi entregue. Meu colega, o cardeal Hollerich, disse uma vez: temos uma carta branca, nada está escrito nela. Nosso dever é acompanhar a Igreja até quando chegar o momento do Sínodo dos Bispos. Mas, se quisermos cumprir nossa missão, devemos escutar. Escutar a todos sem excluir ninguém".
O processo que acaba de ser concluído e as perspectivas para o futuro, o cardeal Mario Grech, secretário geral do Sínodo, as enquadra nestas poucas linhas em resposta aos jornalistas reunidos nestga quinta-feira, dia 27, na Sala de Imprensa do Vaticano para a apresentação do Documento para a etapa continental, a segunda fase do caminho iniciado pelo Papa em outubro de 2021 que terminará com a assembleia dos bispos no Vaticano em 2023 e 2024.
Um documento que é "fruto de uma sinodalidade vivida" por parte das Igrejas dos cinco continentes e de "muito trabalho" por parte da Secretaria Geral do Sínodo, das comissões e do grupo de especialistas que se reuniram durante quinze dias em Frascati (perto de Roma) para redigir o texto. A guiar o trabalho estava o conceito de "restituição", que dom Grech fez questão de enfatizar, para dissipar quaisquer dúvidas que houvesse acréscimos ou que tivesse sido dado mais espaço a um tema do que a outro: "O Documento é uma restituição fiel das sínteses" enviadas pelas diversas dioceses durante a fase consultiva. "O trabalho do grupo de especialistas foi caracterizado pela honestidade intelectual: não há reflexões teóricas sobre a sinodalidade, mas sim a retomada da voz das Igrejas. Para todos nós foi uma surpresa ouvir como, apesar da diferença de sensibilidades, o Povo santo de Deus converge no apelo para uma renovação profunda da Igreja".
A resposta foi ampla e participativa, destacaram os relatores na Sala de Imprensa do Vaticano: além de dom Grech, também o teólogo Piero Coda, o jesuíta Giacomo Costa, a especialista Anna Rowlands, e coligado do Japão o cardeal Jean-Claude Hollerich, relator geral do Sínodo. Com exceção de duas conferências episcopais que não participaram do processo sinodal ("não sei por que, acho que há razões objetivas", disse dom Grech brevemente), todos os episcopados do mundo, alguns após resistências iniciais ou dificuldades, enviaram suas respostas. E o que é evidente a partir destes feedbacks é que em cada latitude do mundo há "uma fome" de nova confiança na Igreja, em sua capacidade de proclamar o Evangelho a "um mundo profundamente necessitado".
As tensões e situações internas, no entanto, desafiam a própria missão da Igreja. Em primeiro lugar, o escândalo dos abusos por parte do clero, como evidenciado no Documento e reiterado na coletiva de imprensa por Rowlands, professora de pensamento e prática social católica na Universidade de Durham, na Inglaterra.
No texto de 45 páginas, que traz vozes de Igrejas dos EUA, Bolívia, Lesoto, Terra Santa e muitas outras, fala-se também de exclusão, clericalismo, discriminação e falta de escuta mútua: "Os relatórios dizem que há aspectos de nossas relações, de nossa capacidade de autêntica unidade na diversidade" que impedem "caminhar juntos", disse a professora. Dificilmente poderemos recuperar a confiança e a credibilidade "se nós mesmos não formos irmãos e irmãs, para curar nossas divisões e suspeitas mútuas".
O que é necessário é ampliar o espaço da "tenda", uma imagem bíblica que lembra o mandamento do Senhor ao povo de Israel no livro de Isaías, um conceito orientador na elaboração do Documento para a etapa continental. Desta tenda muitas pessoas dizem que se sentem excluídas, como lemos no Documento, que também lista algumas categorias de grupos e pessoas que hoje se sentem "exiladas" ou "discriminadas": jovens, pessoas com deficiência, pobres, divorciados casados novamente, pais solteiros, membros da comunidade LGBTQ. E sobretudo as mulheres, que "não pedem funções de poder", mas um reconhecimento de sua própria presença, na sociedade e na comunidade cristã.
Há limites para quem pode ser deixado entrar nesta 'tenda'? Existem aqueles que, mesmo entre os católicos, querem que esta tenda não seja ampliada? Estas foram algumas das perguntas feitas ao cardeal Hollerich na coletiva. O arcebispo de Luxemburgo respondeu: "Haverá grupos sentados na tenda que não estão muito felizes por algumas pessoas estarem em um canto". No entanto, todos estão convidados a entrar neste espaço: "Todas as pessoas criadas e amadas por Deus". Todas.... nosso amor não é tão grande quanto o amor de Deus. Assim, criamos segregações". Recordemos, porém, acrescentou o cardeal, que "devemos olhar cada pessoa como uma pessoa amada por Deus... Cristo morreu por cada pessoa na cruz, portanto, se eu não sou capaz de dar espaço a essa pessoa na tenda, eu tenho um problema com Deus".
Não é uma questão de colocar para dentro e para fora", disse padre Costa: "Muitos se sentem exilados na Igreja: desde aqueles que gostariam de celebrar a Missa com o rito pré-conciliar até os homossexuais". Enquanto não houver maneira de avançarmos juntos, ninguém pode estar confortável, nem mesmo aqueles que estão dentro. Um dos frutos de caminhar juntos é perceber como crescer como Igreja sinodal", acrescentou o jesuíta.
Em meio a uma menção de preocupação com a casa comum, especialmente das "comunidades que estão indo para debaixo d'água", e críticas à escolha de usar uma palavra como "discernimento", descrita pelos jornalistas na sala como difícil de entender, o tema das mulheres foi central na coletiva de imprensa. De seu papel e vocação, de seu desejo de se serem reconhecidas e valorizadas. No Documento, surge um apelo que é compartilhado nos diversos países. Surpreendente, observaram os relatores, que estas questões "foram levantadas em todos os relatórios, é um tema comum".
A perspectiva é a de uma "grande conversão", disse Costa, enfatizando "o desejo das mulheres de terem a Igreja como aliada em serem capazes de levar avante um reconhecimento da dignidade num sentido muito mais amplo em todas as sociedades em que elas vivem". O apelo é para que a Igreja garanta "que metade da humanidade seja respeitada e valorizada".
"A participação das mulheres na Igreja é também um desafio para a reflexão teológica", acrescentou dom Grech. "Meu convite aos teólogos é que se coloquem a serviço da Igreja e do povo de Deus, para que, à luz da Palavra de Deus, da tradição e do Magistério, possamos encontrar outras formas de participação para todos". Um desafio que foi imediatamente acolhido por dom Coda, secretário geral da Comissão Teológica Internacional, que disse: "a teologia até agora pouco se desenvolveu e deu palavra a essa voz, porque ela foi feita principalmente por homens. Somente quando a voz teológica for de mulheres e homens juntos, em uma relação de reciprocidade, no reconhecimento de sua diferença, a contribuição insubstituível das mulheres virá à luz". "Francisco", recordou Coda, "disse a nós da Comissão Teológica Internacional que a presença de mulheres não seja a cereja no bolo, mas seja constitutiva". É por isso que devemos alcançar a paridade, pois enquanto a teologia for uma prerrogativa do clero, não será possível fazer esta evolução".
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Sínodo, Grech: não pressionamos agendas, ouvimos sem exclusões - Instituto Humanitas Unisinos - IHU