13 Outubro 2022
Bergoglio celebra o sexagésimo aniversário da abertura do Concílio Vaticano II por João XXIII na Basílica de São Pedro. A urna de vidro com o corpo do antecessor trazida junto ao altar.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 11-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
60 anos após a abertura do Concílio Vaticano II, o Papa Francisco alertou para o risco de "polarização" que paira na Igreja Católica mundial, com fiéis que se tornam "torcedores de seu próprio grupo", divididos entre "direita" e "esquerda", "guardiões da verdade" e "solistas da novidade", defensores de um "progressismo que segue o mundo" ou de um "tradicionalismo ou ‘indietrismo’ que lamenta o mundo passado".
Em 11 de outubro de 1962, João XXIII abriu a grande assembleia de bispos de todo o mundo em São Pedro, que durante quatro anos atualizou a vida da Igreja Católica e foi concluída em 1965 por Paulo VI. Foi um evento marcante, marcado desde o início por resistências e tensões: "O Papa entrou no carro, sério, e disse: 'não aceitaram bem esse negócio de concílio, ninguém gostou'", teve que contar anos depois o motorista de João XXIII, Guido Gusso, recordando o anúncio surpresa do Concílio feito pelo Pontífice de Bérgamo aos cardeais presentes em Roma.
Para marcar aquele evento, que agora é também a memória litúrgica de São João XXIII, esta tarde o Papa Francisco presidiu uma missa na mesma basílica vaticana. A urna de vidro com o corpo do Papa Roncalli, reexumada por ocasião de sua beatificação em 2000 e depois colocada no altar de São Jerônimo, na nave direita da basílica do Vaticano, foi posta para a ocasião ao lado do altar da confissão. No corpo, que em 2018 foi transferido para Bergamasco, terra natal de João XXIII, foram realizadas algumas intervenções conservadoras, ainda hoje evidentes em particular no rosto e nas mãos, onde foi aplicada uma camada de cera branca. No final da missa, o Papa Francisco, em cadeira de rodas, fez uma pausa em oração diante do corpo de seu antecessor.
“O Concílio nos lembra que a Igreja, à imagem da Trindade, é comunhão”, disse Jorge Mario Bergoglio em sua homilia. "O diabo, por outro lado, quer semear as ervas daninhas da divisão. Não cedamos às suas lisonjas, não cedamos à tentação da polarização. Quantas vezes, depois do Concílio, os cristãos trabalharam duro para escolher uma parte na Igreja, sem perceber que dilacera o coração de sua Mãe! Quantas vezes preferimos ser 'torcedores do nosso próprio grupo' a ser servos de todos, mais progressistas e conservadores do que irmãos e irmãs, 'de direita' ou 'de esquerda' e não de Jesus; 'guardiões da verdade' ou 'solistas da novidade', em vez de se reconhecer como filhos humildes e agradecidos da Santa Madre Igreja", disse o Papa, segundo o qual "tanto o progressismo, que segue o mundo, quanto o tradicionalismo ou 'indietrismo', que lamenta um mundo passado, não são prova de amor, mas de infidelidade".
Tensões, as evocadas pelo papa, que acompanhou seu pontificado desde o início, em particular quando Francisco, em linha com o Concílio, quis abrir o debate sobre temas polêmicos como a pastoral familiar e a sexualidade humana convocando, já em 2014 e em 2015, um duplo sínodo sobre o tema. Em outubro de 2023, para tanto, será realizada uma nova assembleia sinodal que recolherá ideias e propostas de católicos de todo o mundo e que já está gerando algum descontentamento. O sexagésimo aniversário do Concílio, disse a Secretaria do Sínodo em nota alguns dias atrás, "é um momento de particular graça também para o Sínodo, que representa um fruto daquela assembleia ecumênica, aliás, uma de suas 'heranças mais preciosas'".
Em uma homilia toda centrada em torno do papel do bom pastor, Francisco voltou a criticar o clericalismo: "O pastor deve estar diante do povo para marcar a história, no meio do povo para estar entre eles e atrás do povo para estar perto daqueles que estão em atraso. No meio do povo, não acima: esse é o feio pecado do clericalismo que mata as ovelhas, não as guia, não as faz crescer. Como é atual o concílio”, acrescentou. “Ajuda-nos a rejeitar a tentação de nos fecharmos nas cercas de nossos confortos e convicções, para imitar o estilo de Deus".
O Papa Francisco lembrou o famoso discurso de abertura de João XIII ao Concílio - "Parece-nos que devemos discordar resolutamente desses profetas da desgraça...", observando várias vezes a necessidade de uma fé alegre: "No entanto, quantos de nós não são capazes de viver a fé com alegria, sem murmurar e sem criticar?”, perguntou. "Uma Igreja apaixonada por Jesus não tem tempo para confrontos, venenos e polêmicas. Que Deus nos livre de sermos críticos e intolerantes, duros e raivosos. Não é apenas uma questão de estilo, mas de amor, porque", disse Bergoglio, "quem ama, como ensina o apóstolo Paulo, faz tudo sem murmurar".
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Papa Francisco: “Não ao tradicionalismo e ao progressismo na Igreja: os excessos são atos de infidelidade” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU