21 Setembro 2022
"Levar em conta o que alertam os cientistas sobre o ponto de não retorno quando se trata da devastação a que está sendo submetida a Amazônia e seus povos é questão fundamental. Os propósitos governamentais-empresariais não podem se sobrepor, como ora ocorre, devem ser vigiados e questionados com maior incidência e, se se tornam ameaças, combatidos pela cidadania e as instituições restauradas. A luta nesse campo, travada há décadas por segmentos sociais e pelos povos indígenas, pede da sociedade presença ampliada e posicionamento crítico que assegurem a ruptura com o que oprime, destrói e mata", escreve Ivânia Vieira, jornalista, professora da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), doutora em Comunicação, articulista no jornal A Crítica de Manaus, cofundadora do Fórum de Mulheres Afroameríndias e Caribenhas e do Movimento de Mulheres Solidárias do Amazonas (Musas).
As campanhas eleitorais à Presidência da República e aos governos estaduais revelam dificuldades na inserção, pelo critério de importância decisiva, a pauta Natureza. A ausência do tema e ou o tratamento dele nos programas pretendidos pelos candidatos demonstra o tipo de percepção, repetitiva e viciada, no trato da matéria e o quanto, de fato, estamos na imensa maioria da sociedade distantes de fazer funcionar no Brasil uma política pública forte nessa área.
Dos programas - onde alguns delineiam o que candidatos, se eleitos, prometem realizar – aos acordos devastadores, na maioria das experiências acumuladas, prevalece a lógica de explorar ao máximo os recursos naturais, a obtenção de lucros em larga escala e a corrida dos grupos da ganância para encontrar novos espaços de saqueamento.
São esses acordos determinantes, uns já firmados, outros colocados como parte do pacote de apoio, que precisamos querer conhecer, olhar com lupa e nos posicionarmos sobre eles. A maneira pela qual compreendermos enquanto cidadãos e cidadãs o valor da Natureza em nossas vidas é o pequenino e valioso dado estratégico no processo de formação de pessoas que possam participar, interferir e alterar o modelo vigente, de destruição ambiental como opção de desenvolvimento.
Até agora as marcas evidenciadas são as da atuação em separado ainda que os discursos feitos pelos representantes das estruturas governamentais apontem à conduta interdisciplinar na gestão. Na prática, esta feição expõe dificuldade profunda na vivência e no respeito à complexidade. Sobressai, no âmbito governamental, o entendimento de propriedade de área enquanto encolhe o de gerenciar em formato compartilhado, o que implica em estabelecer atitudes outras, contrárias ao que tem sido a prática administrativa de loteamento e privatização das áreas do serviço público.
A decisão governamental pela imposição de determinada representação econômico-financeira como instrumento determinante da vida gera prejuízos ao Brasil, aprofunda o nível de desigualdade entre os brasileiros, alimenta e espalha a discriminação e o racismo, fortalece a violência de gênero e insiste, por meio da composição brutalidade/manipulação dos mais vulneráveis na naturalização dos seus efeitos destrutivos.
Na Amazônia, a Natureza é pauta da vida. Pensar nas formas de uso das águas, da floresta, das terras, da fauna permanece como tarefa a ser realizada e aprendida. Não de um segmento e sim do conjunto da sociedade. Economia, Educação, Saúde, Transportes, Moradia, fontes de energia, produção de alimentos, de fármacos e a Cultura necessitam ser, nesse perspectivismo, interligados de fato e esses elos conhecidos, reconhecidos e respeitados na construção das políticas públicas e no perfil de desenvolvimento que se quer ter no País.
Levar em conta o que alertam os cientistas sobre o ponto de não retorno quando se trata da devastação a que está sendo submetida a Amazônia e seus povos é questão fundamental. Os propósitos governamentais-empresariais não podem se sobrepor, como ora ocorre, devem ser vigiados e questionados com maior incidência e, se se tornam ameaças, combatidos pela cidadania e as instituições restauradas. A luta nesse campo, travada há décadas por segmentos sociais e pelos povos indígenas, pede da sociedade presença ampliada e posicionamento crítico que assegurem a ruptura com o que oprime, destrói e mata.
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A pauta da Natureza nas eleições 2022. Artigo de Ivânia Vieira - Instituto Humanitas Unisinos - IHU