17 Fevereiro 2022
“Os casos do passado são casos do presente (…). A dor das vítimas não prescreve. É preciso denunciar possíveis casos de abuso”. O Arcebispado de Madri, através do Projeto Repara, quebrou a dinâmica do silêncio e da recusa em investigar os abusos de menores na Igreja no passado, uma lamentável constante na Igreja espanhola.
A reportagem é de Jesús Bastante, publicada por Religión Digital, 14-02-2022. A tradução é do Cepat.
A arquidiocese, liderada pelo cardeal Carlos Osoro Sierra, divulgou um vídeo para “refutar falsas crenças sobre abusos e suas consequências”. E o faz em meio a uma profunda divisão dentro da Conferência Episcopal sobre como agir diante das comissões de investigação que foram propostas tanto no Congresso quanto na Defensoria. E, isso não é trivial, poucos dias antes do Arcebispo de Madri ser recebido pelo Papa Francisco, conforme anunciado com exclusividade pelo Religión Digital.
É que a Arquidiocese de Madri é uma das poucas que atende, investiga e acompanha as vítimas. De seu território, e de outras dioceses. Sob a premissa de que “um único caso de abuso já é demais”, o Projeto Repara denuncia que “os preconceitos da sociedade e a estigmatização das vítimas dificultam as ações necessárias e urgentes”.
“Para deixar para trás as falsas crenças, são necessárias informações verdadeiras, comunicação e transparência”, confirma o escritório, que em 2021 atendeu 103 vítimas de abusos, na Igreja e em outras situações. Diante daqueles que sustentam que as denúncias prejudicam a Igreja, ou que há uma espécie de ‘causa geral’ contra a instituição (posição defendida, entre outros, pelo secretário-geral da CEE, Luis Argüello), o Arcebispado de Madri destaca que “na realidade, as denúncias de possíveis abusos ajudam a enfrentar e prevenir a ocorrência deste tipo de situação”.
“O que realmente é prejudicial é o silêncio e a desconfiança das vítimas”. Ou, como comentou o cardeal Osoro mais recentemente em círculos restritos, “as denúncias são uma oportunidade para a Igreja melhorar e apoiar as vítimas”. “A denúncia ajuda”, confirma o vídeo do Projeto Repara.
“O fato de que não haja denúncias não significa que não haja casos”, salientam os responsáveis pela luta contra os abusos da Arquidiocese de Madri, que sublinham que “os casos do passado são casos do presente, sobretudo quando a ferida das vítimas ainda está aberta e mesmo que o agressor tenha falecido”. Por isso, afirmam que “é preciso denunciar possíveis casos de abusos”.
Os dados do projeto Repara
O Repara, com a proteção do cardeal Osoro, sustenta que defender que “a porcentagem de abusos na Igreja é mínima” não é justificável, pois “quando ocorre na Igreja é ainda mais grave e escandaloso porque contrasta com sua autoridade e sua credibilidade ética. Se um único caso de abuso é descoberto na Igreja, já representa uma verdadeira monstruosidade em si mesmo”.
Diante da dinâmica da ocultação e da não informação dos denunciantes, o Repara sustenta que “não acreditar nas vítimas implica uma dupla dor”. “Não há acusações falsas, mas difíceis de provar, porque quem se declara vítima de abusos e denuncia tem pouco a ganhar e muito a perder”, já que significa dar a volta por cima e ressuscitar a dor. “(As vítimas) raramente inventam histórias relacionadas à sua intimidade”.
E mais: o Arcebispado de Madri nega que as vítimas queiram prejudicar a Igreja, mas “curar feridas” tão profundas que tornam muito difícil “dar o nome de quem as abusou” ou “nomear o que sofreram “até 30 ou 40 anos depois”. Apesar do que os negadores da pederastia afirmam, “o passar do tempo não cura as feridas. A dor não prescreve”.
“Não há idade mínima ou máxima para as vítimas” porque “numa relação assimétrica baseada no abuso de poder, e que termina em abuso sexual, não há consentimento”, uma vez que “a liberdade da vítima foi comprometida pelo tipo de relação que ela tem com quem a maltrata”, conclui o Projeto Repara.
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Igreja de Madri é a favor da investigação de todos os casos de abuso: “A dor das vítimas não prescreve” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU