17 Fevereiro 2022
"Sobre a entrevista do Papa na TV, em um contexto popular inédito para um Pontífice, tive algumas perplexidades e, em vez disso, ele literalmente me conquistou”. Assim se expressa Vito Mancuso, teólogo e filósofo católico (além disso considerado por grande parte da galáxia eclesial um "herege"), depois de acompanhar a histórica conversa de Fabio Fazio em conexão com o Papa no "Che Tempo Che Fa", na noite do último domingo, na Rai 3.
Após as primeiras perguntas e respostas, Mancuso ficou temeroso que se detivessem apenas em temas horizontais, ainda que candentes e decisivos, como migrantes, guerra, o Mediterrâneo visto como cemitério, a exploração do planeta. Então a conversa assumiu também uma dimensão vertical comovente e esclarecedora”.
A entrevista é de Domenico Agasso, publicada por La Stampa, 07-02-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Você pode nos explicar?
Francisco e Fazio passaram para temas como o sentido da dor, o sofrimento das crianças, a oração, o problema do mal, a confiança, a liberdade. E naquele ponto atingiram um nível de completude máxima, como pode ser feito na televisão. Fábio Fazio foi excelente. E o Papa Francisco revelou toda a sua espontaneidade, sinceridade e profundidade humana. Houve reflexão e impulso evangelizador, não espetacularização.
Qual passagem você escolhe?
Foi maravilhoso quando Bergoglio falou sobre o senso de humor, muito ligado à dimensão espiritual: ser espirituoso também significa viver a espiritualidade. Uma ressalva muito preciosa para estes tempos sombrios: hoje há uma imensa necessidade de espiritualidade, que não pode prescindir da solidão, do recolhimento, mas também do humor.
Qual era o objetivo comunicativo do Papa?
Creio que o espírito que animou o Pontífice ao aceitar ser convidado de um programa de TV como aquele apresentado por Fazio possa ser expresso nestas palavras do apóstolo Paulo: “Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns" (1Cor 9,22). Nessa passagem, São Paulo diz que "se fez judeu para os judeus para ganhar os judeus" (versículo 20), "para os que estão sem lei, tornei-me como sem lei a fim de ganhar os que não têm a lei" (21). E mostra como a sua intenção evangelizadora o levou a dialogar com todos, encontrando-os onde quer que estivessem.
Você acha que a Igreja deveria seguir esse caminho?
Aparecendo depois de sua ressurreição, Jesus ordenou aos apóstolos que fossem “até os confins da Terra” e toda a história da Igreja mostra perfeitamente que está impregnada de entusiasmo. Hoje, a Terra, geograficamente falando, já não tem mais limites extremos, é toda perfeitamente conhecida, é toda centro e periferia, costuma-se defini-la como uma "aldeia global", mas antropologicamente falando ainda existem limites extremos e o mundo do espetáculo e do entretenimento é certamente um deles.
Portanto, está na ordem das coisas que a Igreja também participe de programas "leves" como o de Fazio, sem contar que essa atmosfera de leveza pode se tornar uma daquelas virtudes necessárias do novo milênio de que falava Italo Calvino, em Lições Americanas, ou seja, o contrário do clima pesado e de seriedade.
Porém, na galáxia católica há quem desaprovou esta escolha de Bergoglio...
Havia um perigo. Não se tratava da Igreja, se tratava do Papa. Se o desejo de se fazer tudo para todos apaga sua diferença em relação a qualquer outro apóstolo ou missionário, é o supremo ofício da Igreja Católica que sofre as consequências. Esse era o grande risco.
Mas Francisco foi excelente em superá-lo, e Fazio, com suas perguntas e com o tom da voz, teve o cuidado de não desrespeitar a sacralidade do Santo Padre. E assim Francisco em um programa de televisão para o grande público soube ser o Chefe Supremo da Igreja Católica e, ao mesmo tempo, o Papa das pessoas, que sabe falar ao coração das pessoas de uma forma extraordinária, com uma empatia envolvente e encorajadora.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Francisco na TV: “sabe falar ao coração das pessoas, com uma empatia envolvente e encorajadora”. Entrevista com Vito Mancuso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU