18 Dezembro 2021
O Papa Francisco vive o Evangelho também no seu modo de se relacionar com a vida. É isso que não captam aqueles que falam de “populismo” ou de “esquerdismo” do pontífice. As raízes cristãs para ele estão na vida, não no papel.
O comentário é de Riccardo Cristiano, jornalista italiano, em artigo publicado em Formiche, 17-12-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Anos atrás, vi uma entrevista com o confeiteiro que havia preparado a torta de aniversário para Francisco. É um pequeno exemplo de como o Vaticano, para alguns ou em certos relatos, parece ser o nosso Palácio de Buckingham. Um relato que, com Francisco, tem cada vez menos sentido e que, nas horas do seu aniversário, certamente não significa “tirar humanidade” do papa, que, como todos os outros seres humanos, tem um aniversário, não apenas uma data de início do sacerdócio e depois do pontificado. Está tudo muito bem, portanto, também no caso de Francisco e talvez ainda mais para ele, que certamente tem a ver com a humanização da figura do pontífice, assim como todos os pontífices da era pós-conciliar, alguns mais, outros menos.
Francisco telefona; sabemos disso desde que, pouco depois da sua eleição, ele deixou um recado na secretária eletrônica de um amigo argentino para lhe enviar, veja bem, seus votos de feliz aniversário. Ele, Gustavo Vera, se bem me lembro, colocou acertadamente no site da sua associação o áudio dos votos do bispo de Roma, porque havia entendido muito bem o significado daquele gesto afetuoso.
Francisco, assim como telefona também para desconhecidos, tira selfies, também com desconhecidos, e não dá para imaginar o quanto aqueles selfies, por exemplo com os muitos refugiados com os quais se encontrou durante o seu pontificado, acabaram sendo uma pastoral via WhatsApp sobre a fraternidade.
É fácil presumir que não só os cristãos que se fotografaram com o papa nos campos lamacentos que o papa visitou e onde os encontrou encaminharam aqueles selfies a amigos e parentes, levando um raio de humanidade para um mundo que ninguém pode imaginar como é cheio de sofredores. Um mundo ao qual ninguém mais soube ir ao encontro.
Como qualquer pessoa que telefona ou tira selfies, Francisco também faz aniversário. E é justo falar sobre isso. Mas o seu aniversário não é bem contado como se fosse uma festa dentro do nosso Palácio de Buckingham. Pelo contrário, esse dia parece ser para ele uma festa de fraternidade, já que, no passado, ele decidiu almoçar com os sem-abrigo, acolher grupos de crianças doentes ou presentear respiradores a países que não os têm.
Alguns, equivocando-se, na minha opinião, acreditam que isso seja “populismo”. Antes, é uma reforma, muito delicada: a reforma das formas de exercício do ministério petrino. Essa reforma não se escreve: se faz. Faz-se nos comportamentos, como a renúncia à limusine: seria estranho ver Bergoglio naqueles carrões, mas hoje não seria estranho, depois da surpresa inicial de vê-lo em um carro popular, ver um papa em uma limusine?
E não é o altar da hipocrisia que faria perceber como “curioso” o fato de vê-lo em uma limusine, mas sim o sentido que ele dá a esse ministério, que em linguagem eclesial significa serviço.
O erro de alguns, que veem nisso o “esquerdismo” bergogliano, é um erro, a meu ver, tão evidente quanto o de quem entrevê uma forma de populismo na sua revisitação do “look” que acompanha as aparições do papa. É algo que lhe pertence profundamente, já que era assim também em Buenos Aires, onde ele costumava andar de metrô de bom grado.
E isso também lhe pertence agora: as fotos que o retratam enquanto ele dá a mão ao guarda suíço de plantão na entrada da Aula Nervi podem parecer parte do “look”. Mas aquelas fotos que, tiradas há muito tempo, o retratam ao chegar a pé a Santa Marta, segurando o guarda-chuva em uma mão e a sua pasta preta na outra, o que nos dizem?
Se, por um lado, nos falam de um espírito livre, que não se deixa mudar tanto quanto possível, por outro nos falam do seu modo de viver o Evangelho. Francisco vive o Evangelho na sua vida, também no seu modo de se relacionar com a vida. É isso que não captam aqueles que falam de “populismo” ou de “esquerdismo” do papa.
As raízes cristãs para ele estão na vida, não no papel. E por que isso não deveria dizer respeito também ao seu aniversário, pelo menos para os outros?
Entender isso significa entender como a sua relação com o Evangelho é diferente da nossa. E então chama a atenção, ao ler o relato da sua conversa com os jesuítas que vivem na Grécia, que o terceiro grau de humildade indicado por Santo Inácio nos seus Exercícios Espirituais seja: “Quero e escolho antes pobreza com Cristo pobre que riqueza; desprezos com Cristo cheio deles que honras”.
Isso também explicará, certamente na minha opinião, por que ele considera tão importante o bom humor. E me parece um ótimo motivo, com bom humor, para lhe desejar um feliz aniversário.
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Francisco, um espírito livre que vive o Evangelho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU