14 Janeiro 2022
"Negar os otimismos ilusórios e letais sobre a possibilidade de uma solução futura para a crise da civilização que nos ameaça e atormenta não significa, porém, deixar-se contaminar por pessimismos cínicos e impotentes. De fato, podemos e devemos lutar por justiça, ágape, verdade e beleza, sem repetição obsessiva e permanentemente abertos a novas dúvidas e novos questionamentos", escreve Flavio Lazzarin, padre italiano fidei donum que atua na Diocese de Coroatá, no Maranhão, e agente da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em artigo publicado por Settimana News, 13-01-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Marx diz que as revoluções são a locomotiva da história universal. Mas talvez as coisas sejam bem diferentes. Talvez as revoluções sejam o recurso ao freio de emergência pela humanidade viajando nesse trem[1].
Os romanos resolveram a questão da história, reconstruindo na literatura e na arquitetura a memória monumental dos feitos dos grandes e dos heróis, que se imortalizaram ao longo do tempo. O cristianismo revoluciona essa perspectiva e oferece a todos a ressurreição depois da morte. Assim nasce o indivíduo ocidental, raiz do mais tardio conceito de pessoa, mas também da heresia individualista capitalista e burguesa.
Teria sido melhor se os cristãos, discípulos das cronologias bíblicas e gregas, não tivessem apostado na história da salvação, da Criação até a Segunda Vinda, remetendo a um futuro remoto a definitiva realização do Reino de Jesus.
A história ainda vive parasitando o passado, contando a política, a economia, a sociedade, os costumes, as ciências exatas e humanas, a arte e a literatura, a vida dos grandes e dos pequenos, da casa e do cotidiano, das igrejas e dos estados, das guerras e das revoluções.
Repete-se, com Cícero, que a história é a mestra da vida, mas, normalmente, é simplesmente motivo de entretenimento e diversão, bem inferior à literatura e à poesia, que podem nos estimular crítica e esteticamente. Às vezes, porém, na escola de Walter Benjamin, descobrimos que “articular historicamente o passado não significa conhecê-lo tal como realmente foi”. “Significa tomar posse de uma memória assim como a baleia em um instante de perigo”.
As dificuldades, no entanto, surgem quando temos que pensar historicamente o futuro.
Posso ousar ao dizer que a profecia da terceira era na história de Joaquim de Fiore é o pecado original dos historicismos. O sonho da terceira era, em que supremamente se realizariam liberdade, ágape e justiça, reaparece, religiosamente secularizado, com a expectativa contemporânea da Era de Aquário ou do retorno de nossos protetores extraterrestres.
Alguns séculos depois de Joaquim, a periodização ternária retornará com Vico, que sonha com a era razoável dos homens após as fantasias religiosas e épicas da era dos deuses e dos heróis.
No entanto, será no século XIX que a história assume, com os delírios dialéticos hegelianos e marxistas, um papel hegemônico, ainda não totalmente contestado pela atualidade, apesar de sua crise evidente e definitiva.
Negar os otimismos ilusórios e letais sobre a possibilidade de uma solução futura para a crise da civilização que nos ameaça e atormenta não significa, porém, deixar-se contaminar por pessimismos cínicos e impotentes. De fato, podemos e devemos lutar por justiça, ágape, verdade e beleza, sem repetição obsessiva e permanentemente abertos a novas dúvidas e novos questionamentos.
Retomo, então, a profecia de Walter Benjamin, quando afirma, na tese XVIII sobre o conceito de história, que para os Hebreus é proibido adivinhar e investigar o futuro, mas não por isso o futuro se esvazia, pois, estamos acompanhados pela memória do passado de libertação: "cada segundo é a porta estreita pela qual o Messias pode entrar[2]".
[1] Benjamin Walter, Sul concetto di storia, in Opere complete. VII, cit., P. 497.
[2] Benjamin Walter, Tesi di filosofia della storia, in Id. Angelus novus. Saggi e frammenti, Giulio Einaudi editore, Turim, pp. 75-86.
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A história e o Messias. Artigo de Flavio Lazzarin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU