29 Novembro 2021
O Papa enviou cinco dos religiosos mais proeminentes do governo do Vaticano à primeira Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe. O significado de algumas ausências.
A reportagem é de Lucas Schaerer, publicada por Religión Digital, 25-11-2021.
A Assembleia eclesial, lançada por Francisco no início do ano, realiza-se no México. O Papa Francisco está atento, hoje mais do que nunca, ao continente onde nasceu e viveu 76 anos. Por isso, em seu sonho de realizar uma transformação popular da estrutura elitista da Igreja, no início deste ano lançou a Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe, que atualmente se realiza no México. Acontece que a liderança da Igreja é episcopal, apenas bispos. E o Jesuíta e Pontífice latino-americano considera que para voltar às raízes do Evangelho, das primeiras comunidades de fé, é inevitável a conversão deste caráter episcopal ao eclesial, isto é, a uma liderança da Igreja colegiada, que incorpora os batizados nas suas grandes diversidades e para tomar decisões nas suas paróquias (bairros ou comunidades), dioceses (províncias ou cidades) e continentes.
Em função deste objetivo de aprofundar seu apoio à primeira assembleia eclesial da Igreja Católica, Bergoglio enviou cinco cardeais vaticanos, o monsenhor encarregado da comunicação da Santa Sé e seu embaixador no México, núncio apostólico cessante, Franco Coppola. O religioso que talvez concentra a maior força de todos os enviados é Marc Ouellet. Desconhecido pela maioria dos católicos, ele é um homem que foi elevado ao posto de cardeal pelo papa polonês João Paulo II; e posteriormente localizado na estratégica Congregação para os Bispos pelo pontífice alemão, Joseph Ratzinger. Este cardeal canadense não só tem peso determinante na nomeação de bispos em todo o mundo, ou seja, na distribuição dos capitães do exército espiritual católico de 1.300 milhões de batizados, mas também dirige a Pontifícia Comissão para a América Latina (PCAL), uma das áreas do governo estava perto dos sentimentos do Papa.
É preciso saber que Ouellet perdeu o conforto que mantinha há alguns anos. Há dois meses, o Papa nomeou dois latino-americanos para a equipe canadense: Emilce Cuda, chefe do escritório do PCAL, que é uma teóloga com extenso trabalho acadêmico tanto nos Estados Unidos quanto na América Latina e vem fortalecendo sua visão de amizade e formação com os Jesuítas, os movimentos populares e os sindicatos da Argentina; e o professor mexicano Rodrigo Guerra, como secretário do PCAL. Outro dos recém-chegados é Mario Grech, o cardeal maltês que está trabalhando naquele que será o evento mais importante do próximo ano, ou seja, o Sínodo da Sinodalidade. O religioso foi nomeado naquele lugar-chave pelo próprio Bergoglio. Nesse contexto, outro enviado papal que chegou hoje à Casa Lago foi o salesiano birmanês Charles Maung Bo, atual arcebispo de Yangon, membro do chamado G-7 (grupo para a reforma da Cúria Romana) e, ao mesmo tempo, presidente da Conferência Episcopal da Ásia. Ontem, quarta-feira, 24 de novembro, a missa da noite na Assembleia eclesial foi oferecida pelo cardeal Jean Claude Hollerich, presidente das Conferências Episcopais da Europa e arcebispo de Luxemburgo.
De todos eles, o primeiro cardeal do Vaticano a chegar ao México foi Oswald Gracias, arcebispo de Bombaim. Sua chegada antecipada foi significativa, considerando que a Índia é um dos países mais populosos do planeta. Também é importante notar que, embora seja uma nação onde o cristianismo é minoria, seu primeiro-ministro convidou recentemente o Papa para uma visita oficial. Além desses dados não menores, o cardeal indiano é membro do pequeno mas decisivo Grupo dos Sete (G-7) para a Reforma de Governança da Cúria Romana. Além dos nomes, uma das questões que falta nos debates é o cuidado com a “casa comum”. Finalmente, outro membro da delegação do menor e mais espiritual estado do mundo é o secretário do Dicastério da Comunicação, Monsenhor Lucio Ruiz, que trabalha com um ouvido na assembleia e os dedos em seu notebook, divulgando as últimas notícias do Papa.
Os religiosos europeus mal se dão conta das ausências significativas dos grandes grupos de batizados latino-americanos e caribenhos. Em apenas quatro dias de desenvolvimento deste encontro excepcional, todas as fraquezas foram expostas, embora seja verdade que ainda faltam alguns dias para pressionar por correções. Chama a atenção a presença e virtual ausência do único cardeal indígena e boliviano da Cúria Romana, o quechua Toribio Ticona Porco. Ainda que alguns justifiquem a situação com base na delicada saúde do religioso, quem conhece sua atuação pública no país multinacional dirá que se trata de um argumento com pouco apoio. Além dos nomes, uma das questões que falta nos debates - pelo menos até hoje, quinta-feira, 25 - é o cuidado com a “casa comum”. Não há reflexão sobre o assunto, exceto em algumas coletivas de imprensa.
No segundo dia de atividades, o cardeal peruano Pedro Barreto referiu-se às calamidades da comunidade yanomani amazônica; o sacerdote colombiano e secretário executivo da Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA), Alfredo Ferro Medina, mencionou “a decepção da cúpula do clima COP26”; e a secretária do PCAL, Emilce Cuda, definiu como “uma pena” que dentro da Igreja e das universidades católicas não se abra um debate profundo sobre o cuidado da casa comum. A este respeito, o oficial do Vaticano e primeiro teólogo da Cúria Romana esclareceu que o mundo secular deve debater, refletir e aplicar a encíclica de Francisco, Laudato Sí. “O Papa nos pede que construamos um diálogo social efetivo, ainda estamos em dívida”, concluiu o autor do livro “Ler Francisco. Teologia, ética e política ”. A comitiva de jovens, todas mulheres, está ausente do diálogo da redação final.
Na enumeração das faltas, também é imprescindível nomear os leigos que fazem parte dos Movimentos Populares, para citar os Missionários de Francisco na Argentina ou o Movimento dos Sem Terra do Brasil, além dos dirigentes dos sindicatos tradicionais agrupados em centrais, federações ou associações. A ausência dos Movimentos Populares é marcante por dois motivos. Por um lado, porque são vitais no ensino de Jorge Bergoglio. É preciso lembrar que, em seu último encontro, os chamou de "samaritanos coletivos", porque eram aqueles que na periferia, em pleno confinamento pelo coronavírus, não paravam de atender os excluídos. Por outro lado, alguns dos presentes na Casa de Lago têm diálogos diários e tarefas concretas com os leigos que atuam em sindicatos ou organizações da chamada economia popular.
Da própria igreja, nas comunidades, com os pés na lama da periferia argentina, estão os chamados padres vilões e os padres em opção pelos pobres. Eles também estavam ausentes. Havia apenas uma conexão online do bispo auxiliar da Cidade de Buenos Aires, Gustavo Carrara. Nem sequer divulgaram documentos dirigidos à Assembleia Eclesial, o que significa que nem sequer cogitaram um debate no seio dos seus grupos, provavelmente pela urgência cotidiana de estar nas trincheiras das comunidades abandonadas. Apesar de estarem organizados em 16 países da região, os padres casados também não foram mencionados nos grupos de trabalho da Assembleia, totalmente omitidos do "documento de discernimento comunitário", que organizou o evento. Estes documentos foram enviados, após as reuniões em fóruns, para a liderança da Assembleia e CELAM, da Conferência Episcopal da América Latina, mas suas iniciativas só aparecem no documento de trabalho "Narrativa Síntese", mais precisamente nas páginas 120 e 121. A última ausência na definição dos lugares da Assembleia Eclesial eram os jovens. Por enquanto eles não aparecem na comissão de redação do documento final.
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Os cardeais de Francisco desembarcaram no México - Instituto Humanitas Unisinos - IHU