21 Julho 2021
“Concordo com o motu proprio de Francisco, não apenas baseado em minha própria experiência da divisão crescente em relação à Missa, mas ainda mais em sua consulta a bispos de todo o mundo, que avaliaram as experiências do Povo de Deus. Foi uma espécie de discernimento em que o Papa consultou amplamente, ouviu o Espírito e decidiu”, escreve o jesuíta estadunidense James Martin, em comentário publicado na sua página no Facebook, 17-07-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Primeiro, eu sei que para muitas pessoas que celebraram e participaram da Missa Latina esse foi um documento [Traditionis custodes] difícil de ler, assim como um pouco surpreendente, ou até mesmo chocante.
Segundo, embora eu nunca tenha celebrado uma Missa Latina (eu estou usando uma abreviação das diversas variações da Missa em latim), eu como jesuíta já participei de várias, tanto antes quanto depois da publicação do motu proprio Summorum Pontificum, de Bento XVI, em 2007.
Eu gostei daquelas Missas, mas eu também me sinto mais confortável com a Missa na língua vernácula, a qual eu celebro todos os dias. E eu já estive na Missa em diversos idiomas – em inglês, é claro, mas também em espanhol, na zona leste de Manhattan, em suaíli, no Quênia, em francês, em Lurdes, em italiano, em Roma, e em árabe, na Terra Santa.
Então eu gosto mais quando a Missa é celebrada no idioma vernáculo. Mas, como já havia escrito antes, se alguma coisa me trouxer para perto de Deus (e eu estou falando daqueles que apreciam a Missa Latina) é para ser reverenciada. Então, eu reverencio a devoção que muitos tem pela Missa Latina.
Ao mesmo tempo, nós devemos levar a sério a consulta do Papa Francisco aos bispos de todo o mundo, na qual ele perguntou sobre os resultados da “Summorum Pontificum” nos seus territórios.
Alguns rejubilaram na grande liberdade de celebrar a Missa Latina desde o documento de Bento XVI, mas isso também foi, infelizmente, uma fonte de crescente e algumas vezes acaloradas divisões entre católicos. Pelo menos nos Estados Unidos, alguns católicos agora falam das “paróquias de Missa Latina tradicional”, como se estivessem em oposição às “paróquias do Vaticano II”. Isso não é bom para a unidade.
Desde 2007, muitas pessoas disseram-me que elas não podiam esperar pela “verdadeira Missa” (que é a Missa Latina) para substituir a “Missa Vaticano II” (Missa na língua vernácula), a qual eles viam como banal, superficial ou irreverente. E muitas pessoas criticavam-me (tanto online quando pessoalmente) por não celebrar a Missa em latim, como se isso me fizesse um padre menos devoto.
Para registro, eu tinha dois anos quando o “Sacrosanctum Concilium”, o documento do Vaticano II sobre liturgia, foi publicado. Então eu cresci em uma época onde a Missa sempre foi em idioma vernáculo.
Mas ainda mais importante que essas anedotas, as quais são de um padre em um país, é a resposta dos bispos ao redor do globo. Esse é um exemplo do Papa Francisco escutar o Espírito Santo no trabalho no mundo, e outra instância do seu desejo de “sinodalidade”.
Como um aparte, lembre-se que, como Austen Ivereigh nos lembrou, o Papa Bento XVI disse a repórteres em 2007 que o “Summorum Pontificum” seria revisado se surgissem problemas. O documento de Bento XVI, motivado por um profundo desejo de unidade, estava respondendo a uma necessidade da igreja, ou seja, era uma forma de fazer aqueles que apreciavam a missa em latim se sentirem mais em casa e, assim, promover a unidade.
Como Michael Sean Winters relatou, Bento XVI nunca teve a intenção de iniciar um movimento, e, certamente, tampouco uma ideologia. Essa não era uma via para Bento XVI, para quem a unidade da Igreja era uma meta essencial e duradoura.
Depois de consultar os bispos, no entanto, Francisco concluiu que o documento de Bento XVI, que visava a unidade, causou divisão involuntariamente. O sacramento da unidade estava, em alguns lugares, começando a causar séria desunião.
Acima de tudo está o fato de que a intenção clara do Concílio Vaticano II era que a Missa fosse celebrada em língua vernácula e que esta fosse a principal forma de as pessoas vivenciarem a Missa. Esta foi uma das principais formas que o Vaticano II esperava para promover o que “Sacrosanctum Concilium” chama de participação “plena e ativa” no sacramento.
E, como James Keane relatou na revista America, uma das principais razões pelas quais São Paulo VI fez provisões para manter a missa em latim foi para padres mais velhos e enfermos para os quais as mudanças seriam perturbadoras. Mas para Paulo VI, a missa em idioma vernáculo era o caminho a seguir.
No geral, concordo com o “motu proprio” de Francisco, não apenas baseado em minha própria experiência da divisão crescente em relação à Missa, mas ainda mais em sua consulta a bispos de todo o mundo, que avaliaram as experiências do Povo de Deus. Foi uma espécie de discernimento em que o Papa consultou amplamente, ouviu o Espírito e decidiu.
Espero que mesmo aqueles que apreciam a missa em latim possam receber o motu proprio do Santo Padre dessa forma.
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“Francisco concluiu que o documento de Bento XVI, que visava a unidade, causou divisão”. Artigo de James Martin, s.j. - Instituto Humanitas Unisinos - IHU