25 Julho 2020
Principal hospital do estado tem 84% dos leitos de UTI ocupados; capital Boa Vista reabre comércio.
A reportagem é de Martha Raquel, publicada por Brasil de Fato, 23-07-2020.
Com apenas 600 mil habitantes, Roraima é o estado que registra mais casos de coronavírus para cada 100 mil habitantes – atualmente são 4,5 mil para cada 100 mil pessoas, totalizando 26.954 infectados pelo vírus. Se comparado com São Paulo, estado com maior número de casos no país, hoje com 422.669 casos, a diferença dos números totais é enorme. Mas São Paulo tem cerca de 3.470 infectados para cada 100 mil pessoas.
Boa Vista, capital do estado, concentra 400 mil pessoas, ou seja, 70% de toda a população roraimense. Dos casos confirmados, 20.796 foram registrados na cidade. O médico sanitarista Pedro Tourinho avalia que o cenário de Roraima, do ponto de vista estatístico, está entre os mais graves do país.
“Sem dúvida nenhuma, isso é determinado primeiro pela alta disseminação do vírus, pela baixa capacidade de realização de medidas de isolamento social que o estado vivenciou, mas também pela oferta de serviços de saúde que é relativamente escassa quando comparada com outros lugares”, explica ele.
Segundo dados do último boletim epidemiológico divulgado pela secretaria estadual de saúde, o Hospital Geral de Roraima tem hoje apenas 4 dos 29 leitos de UTI vagos, ou seja, 86% de ocupação. Quando se trata de leitos clínicos a situação também não é animadora. Dos 99 leitos há apenas 16 disponíveis, chegando assim a 94% de ocupação.
Para Tourinho, a alta taxa de ocupação do hospital pode ter contribuído para o número de óbitos – 451 até esta quarta-feira (22). “Quando você não tem assistência médica, quando o sistema entra em colapso, a mortalidade acaba aumentando porque você tem casos que poderiam ser tratados com medidas um pouco mais invasivas, de cuidado intensivo mais estruturado. Elas acabam falecendo pela ausência desse tipo de serviço.”
O Hospital de Campanha foi entregue há pouco mais de um mês, no último 19 de junho, depois de cinco adiamentos. Ele conta hoje com 30 leitos de UTI e 254 leitos clínicos.
Teresa Surita (MDB), prefeita de Boa Vista, diz que o diálogo entre prefeitura e governo do estado é muito difícil. Ela explica que as informações sobre a situação dos leitos e equipamentos de tratamento estão sempre desencontradas. “O Hospital Geral, que é o único hospital oficial do Estado que trabalha com a covid-19, mas a gente não tem informações claras. Sempre vêm números diferentes.”
Uma outra reclamação da prefeitura é que o governo não tem repassado os testes para a cidade de Boa Vista, mas os que “mandaram para a gente do Ministério da Saúde não chegaram para o município. Os que nós compramos, adquirimos com o nosso recurso”, completou a prefeita.
Segundo Pedro Tourinho, o estado esteve diante de um cenário muito difícil em relação ao coronavírus. “Pelos dados dá para dizer que Roraima enfrentou, eu diria, uma das piores situações do Brasil do ponto de vista de taxa de óbito por habitante, número de contaminados por habitantes. Enfrentaram uma situação muito grave mesmo e que, no momento, tudo indica que está diminuindo, se resolvendo, provavelmente pelo próprio ciclo do processo da doença”. Ele destaca que, passado os piores momentos, o comportamento do vírus tem mudado não só em Roraima mas também em outros estados do norte do país.
Administrado pela Operação Acolhida, do Exército Brasileiro, o Hospital de Campanha tem um protocolo mais estruturado de repasse de informações. “Abrimos uma Unidade Básica de Saúde dentro da área do Hospital de Campanha, o que ajuda muito o processo todo. No Hospital de Campanha tem 30 leitos de UTI prontos para funcionar, mas tem 20 em funcionamento porque ainda não tem necessidade de preencher os outros. Você deixar todos em funcionamento, custa dinheiro, mas se precisar, tem 30 prontos para atender”, explicou Surita.
O número de casos notificados na cidade de Boa Vista caiu drasticamente no último mês e, segundo a prefeitura, já é possível retomar as atividades comerciais na cidade. Na última segunda-feira, 20, entrou em vigor a primeira fase do plano de reabertura.
Informativo (Divulgação Prefeitura de Boa Vista)
Equipes da Guarda Civil Municipal, da Empresa de Desenvolvimento Urbano e Habitacional (Emhur) e da Secretaria Municipal de Gestão Social (Smges) percorreram as ruas e avenidas para garantir o cumprimento das medidas recomendadas pela prefeitura (controle de entrada, medição de temperatura, número limitado de pessoas dentro dos estabelecimentos, obrigatoriedade de equipamentos de proteção individual e uso de máscara nas ruas).
Teresa Surita explica que o governo estadual de Antônio Denaruim (sem partido), seguidor de Jair Bolsonaro, nunca se pronunciou sobre o fechamento do comércio. Segundo ela, o município tomou a frente e fechou, logo em março, por causa da fragilidade do sistema de saúde.
“Na hora em que fechamos (o comércio) as pessoas reagiram contrárias, acho que muito em função dos diferentes posicionamentos entre governo estadual e prefeitura. Mas na hora que você fala ‘pode abrir’, percebe que as pessoas têm receio, medo do aumento dos casos, de um número maior de óbitos, porque é contra um desconhecido que você luta”, explicou a prefeita.
O uso da máscara é obrigatório em toda a cidade. Quem descumprir a regra será multado em R$ 50,00 e, em caso de reincidência, em R$ 100,00. A prefeita de Boa Vista disse que o valor foi decidido de acordo com outras cidades que adotaram a medida, mas também levando em consideração a realidade local. Toda pessoa multada recebe uma máscara da prefeitura, que está em campanha de distribuição do equipamento de segurança. Desde o início da campanha mais de 200 mil máscaras já foram distribuídas de forma gratuita em Boa Vista.
Fiscalização e distribuição de máscaras na reabertura do comércio em Boa Vista (Foto: Andrezza Mariot/Divulgação Prefeitura de Boa Vista)
O retorno das aulas na rede municipal ainda não é uma pauta para a prefeitura de Boa Vista. “Somente depois das três etapas é que a gente vai falar sobre escola, porque escola é o que tem mais aglomeração e as crianças são os vetores que, comprovadamente, mais espalham os vírus”, explicou Surita.
Nesta segunda-feira (20), as praças de Boa Vista tiveram as luzes acesas novamente depois de 4 meses. A decisão de apagá-las foi tomada pela prefeita ainda em março, já que a população tem o costume de se encontrar nesses espaços públicos durante a noite. Para evitar aglomeração, durante o período de isolamento tudo ficou apagado. As fontes interativas, adoradas pelas crianças, ainda não foram religadas pelo mesmo motivo: evitar aglomeração.
Depois de Boa Vista, as cidades com os maiores números de casos confirmados de coronavírus são Pacaraima (1.043), Rorainópolis (1.012) e Cantá (616). Entre os registrados, a maioria tem entre 30 e 39 anos e é do sexo feminino.
Já em relação aos óbitos por covid-19 no estado, hoje há a confirmação de 451 mortes e outras 95 seguem em investigação. As cidades mais atingidas são Boa Vista (361), Pacaraima (19) e Rorainópolis (14). Diferente das estatísticas dos casos confirmados, 66,3% das mortes foram do sexo masculino e mais da metade das mortes foram de pessoas com mais de 60 anos.
Das mortes confirmadas, 293 pessoas eram pardas, 70 brancas, 54 indígenas, e 18 pretas. Até o momento são 415 óbitos de brasileiros, 28 de venezuelanos e existem registros de cidadãos de Cuba, Peru e Guiana Inglesa mortos no estado. Os dados são do Sistema de Informação de Mortalidade da Secretaria de Saúde do Estado de Roraima.
Segundo a Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania, a covid-19 chegou ao sistema carcerário de Roraima e já registrou 86 infectados e 7 óbitos entre os reeducandos. A Cadeia Pública Masculina de Boa Vista lidera com 42 casos confirmados e 6 mortes; seguido pela Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, com 28 infectados e 1 morte.
Os servidores das Unidades do Sistema Prisional também foram impactados pelo vírus. Até o momento são 93 casos confirmados entre as cinco unidades prisionais.
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Roraima tem maior índice de mortes por covid-19 para cada 100 mil habitantes do país - Instituto Humanitas Unisinos - IHU