01 Mai 2020
"Neste 1º de maio de 2020, tendo chegado a uma situação-limite de opressão, estamos aptos a enxergar o modo de produção e consumo capitalista sem ilusões. Percebendo que nele a nossa espécie não tem lugar para realizar-se como Humanidade nem como culminância da grande comunidade de vida, vamos pensar grande: um outro mundo, onde reine a Paz com Justiça, é possível e não está tão distante quanto parece!", escreve Pedro A. Ribeiro de Oliveira, sociólogo.
Neste 1º de maio foram publicadas pelo menos duas significativas notas de animação para a luta das classes trabalhadoras: uma, da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Sociotransformadora, da CNBB, e outra da Comissão de Pastoral Operária, da Arquidiocese de Campinas-SP. São manifestações importantes, que retomam os grandes temas do Ensino Social da Igreja e palavras da Escritura para estimular os e as militantes em sua reivindicação dos direitos hoje sequestrados pelo capital. Senti falta, porém, de uma análise da realidade a ser enfrentada, porque o que hoje se delineia é muito desfavorável às classes trabalhadoras.
Como expressão de solidariedade a todos os trabalhadores e trabalhadoras que estão sofrendo a perda de direitos, mas ainda assim arriscam sua vida em defesa de quem mais sofre – penso nos Povos Indígenas, desprotegidos em seu território tradicional e covardemente atacados por grupos acobertados por este governo – trago aqui minha contribuição para percebermos a realidade social e econômica que virá pela frente.
Imersos na pandemia da covid-19, neste ano em nenhum lugar do mundo os trabalhadores e trabalhadoras podem sair às ruas para comemorar o seu dia. Aliás, desde o triunfo do neoliberalismo, há mais de vinte anos, essa festa vinha perdendo força apesar da vitória de Lula em 2002 ter renovado as esperanças por dias melhores. Os últimos cinco anos, porém, foram só sofrimento: direitos corroídos enquanto o desemprego aumentou. O golpe final foi a precarização do trabalho e o esvaziamento dos sindicatos. Passada a pandemia, restará uma crise econômica (queda na produção) e financeira (falências e ausência de investimentos) a ser atravessada. Como ficará a vida de quem só vive do que produz com seu trabalho? Como encarar essa realidade num 1º de maio?
Ainda é cedo para esboçar o cenário que teremos pela frente, mas com certeza o mundo será bem diferente do que foi até agora. A crise econômico-financeira, agravada pelo clima de guerra entre as potências emergentes e decadentes, trará um novo modo de produção e consumo capaz de renovar o capitalismo, provavelmente a partir do planejamento estatal e da informática (como desponta na China). Nesse capitalismo de 5ª geração as classes trabalhadoras serão as grandes perdedoras e dificilmente terão seus direitos assegurados... Nada de otimismo!
Esse cenário, porém, ignora o que a Terra está preparando para a espécie homo sapiens e que tem na atual pandemia um sinal de alerta: a catástrofe climática e ambiental. O modo de produção e consumo capitalista nada pode fazer diante dela, porque para ele o que conta são as empresas – pessoas jurídicas – e não as pessoas reais, com carne, osso e espírito. Seu impulso de sobrevivência vai intensificar o uso de todos os instrumentos da tecnociência mais avançada, mas nem ela conseguirá dobrar a disposição da Terra em livrar-se do mal que nossa espécie lhe tem feito.
Diante dessa catástrofe que já desponta no horizonte, podemos vislumbrar duas possibilidades opostas e extremas:
(i) manter o atual processo econômico impulsionado pela miragem do crescimento sem fim, ou
(ii) operar uma verdadeira conversão da Humanidade em direção a uma civilização planetária, respeitosa dos Direitos da Terra e de toda a comunidade de vida.
A primeira significa dar ainda mais força ao mercado e às empresas, ainda que isto represente a redução da espécie humana a um pequeno número de pessoas vivendo em bolhas tecnológicas.
A segunda implica o retorno à vida frugal, onde a economia baseada na cooperação, solidariedade e reciprocidade, assegure o necessário à vida sem ultrapassar os limites dos recursos ecológicos renováveis de cada território. Para quem vive dos rendimentos de capital, isso é impensável. Mas para as classes trabalhadoras, essa economia que só garante o necessário é parte de sua experiência vivida: não precisa ser rico para ser feliz. Alimentar, na prática diária, a experiência da solidariedade, da cooperação, e do colocar tudo em comum, e preparar o processo de desapropriação privada dos meios de produção é o desafio que os trabalhadores e trabalhadoras têm pela frente, para sairmos da crise pelo caminho da vida.
Neste 1º de maio de 2020, tendo chegado a uma situação-limite de opressão, estamos aptos a enxergar o modo de produção e consumo capitalista sem ilusões. Percebendo que nele a nossa espécie não tem lugar para realizar-se como Humanidade nem como culminância da grande comunidade de vida, vamos pensar grande: um outro mundo, onde reine a Paz com Justiça, é possível e não está tão distante quanto parece! Por isso, como Zé Vicente, cantemos:
“Animados pela Fé e bem certos da vitória,
vamos fincar nosso pé e fazer a nossa história”.
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1º de Maio: dia de olhar pra frente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU