28 Abril 2020
Religiosa franciscana, nesta época de pandemia, suas traduções simultâneas são vistas por milhões de pessoas. "Quando Francisco se encontra com pessoas com deficiência fica feliz, fala delas como mestres, amigos, lugares teológicos".
"Durante a celebração da Páscoa, tive que traduzir o som dos sinos para a língua de sinais. As pessoas surdas obviamente não os ouvem. Mas eu tinha que dizer a elas: ouçam! Jesus ressuscitou! E então imitei um sineiro que puxa as cordas dos sinos, tanto que também me transformaram num gif animado com o gesto. Eu traduzo para a língua de sinais, acompanhando as palavras do Papa também com meu corpo, com minha postura".
A irmã Veronica Donatello, franciscana alcantarina, 45 anos, do Abruzzo, responsável pelo Serviço CEI para a pastoral das pessoas com deficiência, é a religiosa que, para o Vatican media e a TV2000, traduz para a língua dos sinais as palavras do Papa durante as celebrações, encontros públicos e todos os momentos de oração. Neste período de pandemia, suas traduções simultâneas são vistas por milhões de pessoas. Nos últimos dias a Tv2000 dobrou sua audiência média, alcançando 1,43% de participação, com 5 milhões de contatos. "Estamos todos nas mãos uns dos outros - fala citando José Tolentino -: neste momento poder rezar juntos, todos, torna essa consciência ainda mais plástica e concreta".
A entrevista é de Paolo Rodari, publicada por La Repubblica, 22-04-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
De onde acompanha as celebrações do Papa?
De uma sala de controle da TV2000, que reproduz o sinal de vídeo do Vatican media. Ouço o Papa e de lá traduzo e participo. Simultaneamente, traduzo a missa, os cantos, inclusive o gregoriano. Isso para permitir uma participação ativa na liturgia, acompanhando até as palavras em latim mais difíceis.
Nós vimos você ficar comovida durante uma função.
É assim. Para mim, não é um trabalho. É a minha vida, expressa a minha vocação. Enquanto faço os sinais, também rezo e participo. Imagino do outro lado da tela as famílias com os filhos com deficiência assistindo e todas as pessoas que têm déficits de comunicação. Neste momento também para pessoas com outras deficiências foram desenvolvidos auxílios e ferramentas que permitem uma participação ativa. Essa atenção da Igreja na Itália nasceu desde o primeiro momento do isolamento: a CEI fez a escolha de tornar acessíveis todos os eventos e os momentos de oração. Incluindo os subsídios. A inclusão não é um slogan, mas acontece. No site da CEI está disponível todo o material gratuito em várias línguas para permitir a participação de famílias e pessoas com deficiência. A liturgia, nesse sentido, também tem uma grande capacidade performativa. Estou lá e sim, fico emocionada. Durante algumas estações da Via Crucis, arregalei os olhos, assim também durante o sermão do padre Raniero Cantalamessa no rito da sexta-feira santa.
O que aconteceu nesses dias de pandemia?
Desde a primeira fase de fechamento na Itália, a escolha da CEI foi de acompanhar todos, ninguém excluído, a viver esse tempo na perspectiva da proximidade e da inclusão. Com grande surpresa, a web nos ajudou a 'conectar-se' fora de nossa casa! E foi isso também o que aconteceu na colaboração com a Santa Sé. O momento de oração presidido pelo Papa na Praça São Pedro, em 27 de março, foi o primeiro evento tornado acessível, transmitido para todo o mundo. Foi um dom para todos verem pessoas que enviaram fotos da África, América, Austrália e vários países da Europa, especialmente da Europa Oriental. Foi muito comovente a imagem tirada por um profissional de saúde que trabalha, no setor Covid de um hospital, com surdos: ele me enviou uma foto com uma sala montada com um tablet para permitir a participação. Um dos desafios, hoje mais do que nunca, é acolher o apelo de Deus para construir pontes. Cada um, além disso, como disse Agostinho, ‘tem uma porta através da qual Cristo entra'. Cada pessoa com deficiência, apesar de ter um sentido a menos, tem os outros sentidos que suprem e apoiam. Nosso trabalho é arar o terreno e facilitar as oportunidades, cada uma com as competências e possibilidades que Deus lhe deu.
Foto: Vatican News
O que o Papa lhe transmite?
O Papa Francisco, quando se encontra com pessoas com deficiência é feliz, fala delas como mestres, amigos, lugares teológicos. Quando encontra surdos, sempre sabe como cumprimentá-los. Ele levanta as duas mãos e depois tem uma expressão facial notável. Com o rosto, ele comunica muito.
Você disse que a língua de sinais também tem uma postura própria no âmbito religioso?
É claro. O gestual é acompanhado também pelo corpo para levar o outro a compreender. Durante a liturgia, se a cabeça se abaixa ou se o olhar for levantado, significa que coisas diferentes estão acontecendo. O olhar acompanha. Na língua dos sinais não se usam apenas as mãos, mas todo o corpo e, em particular, o rosto. Nossa postura e nossa maneira de sinalizar constituem a ponte, nos ajudam a entrar na liturgia.
Criar pontes, esse é o seu trabalho?
Claro. Jim Sinclair, uma pessoa com transtorno do espectro autista, disse: 'Vocês não nos consertam, mas trabalham conosco para construir pontes entre nós e vocês.
Como você chegou a esse trabalho?
A língua dos sinais é minha primeira língua. Meus pais e alguns parentes são surdos. A deficiência faz parte da minha vida desde o primeiro momento e é uma característica minha. Penso e oro com a língua dos sinais. A língua italiana é a segunda língua para mim. Estudei tanto nesse âmbito quanto na área pedagógico-pastoral para poder servir a vocação que o Senhor me deu. Atualmente, sou especializada na língua de sinais religiosa e com um grupo de pessoas competentes, nesses últimos anos, estamos tratando da tradução de textos sagrados e de apoio pastoral em vídeo para acompanhar pessoas com deficiência comunicativa, tudo disponível no site da CEI.
Por que você se consagrou a Deus?
Na adolescência, me afastei da Igreja, estava escandalizada. O Senhor, como bom pretendente, soube como encontrar caminhos para me alcançar, e certamente a deficiência foi um 'gancho'. Pediram minha ajuda por minhas competências em um serviço em uma paróquia onde havia um grupo de pessoas com deficiência ... e como acontece no amor, através do encontro, do conhecimento, acabei me apaixonando. O caminho do discernimento foi longo e sério e terminou com o ingresso na minha congregação, as Irmãs Franciscanas Alcantarinas: assim experimentei e continuo experimentando que Deus é fiel em tornar frutuosos os talentos de cada um.
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Coronavírus, os sinos da irmã Veronica viraram cult: “Assim, traduzo as palavras do Papa para a língua dos sinais” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU