01 Julho 2019
Nas frenéticas manifestações contra Carrie Lam, a chefe de governo de Hong Kong considerada próximo a Pequim, as multidões escolhem a canção “Sing Hallelujah to the Lord”, que se tornou um grito de guerra pacífico.
A reportagem é de Henrik Lindell, publicada por La Vie, 24-06-2019. A tradução é de André Langer.
As manifestações de Hong Kong, que vem acontecendo desde 9 de junho, são muitas vezes constituídas de grandes multidões que se sentam na rua. E muitos vídeos que circulam na internet mostram-nas cantando a música “Cante Aleluia ao Senhor” (em francês, “Chante alléluia au Seigneur”) na presença da polícia.
As razões para essa escolha surpreendente seriam primeiramente de ordem pragmática. Encontros de oração, mesmo que espontâneas, são legais neste território independente do sudeste da China, e não constam da definição de reuniões que o governo poderia ser tentado a proibir. Enquanto as forças de segurança começaram a reprimir os manifestantes gritando palavras de ordem políticas, alegando “motins”, elas deixam no momento tranquilos aqueles que se parecem com cristãos piedosos. Além disso, os vídeos dessas manifestações se tornaram virais na internet e estão atraindo uma atenção embaraçosa da mídia internacional e, portanto, exercem uma pressão adicional sobre o governo, coisa que ele não previu.
Mas a escolha de uma música cristã também está ligada ao fato de que os cidadãos de Hong Kong identificam com o cristianismo valores positivos, como a liberdade de expressão. A reivindicação de fundo dos manifestantes é preservar o Estado de direito e o estatuto semi-autônomo da ex-colônia britânica devolvida à China Popular em 1997. Além disso, muitos dos manifestantes são simplesmente cristãos (religião de 10% da população de Hong Kong), e estão particularmente preocupados com qualquer reaproximação com a China Popular, o que leva a uma verdadeira repressão contra seus correligionários, cujo número está em crescimento muito forte.
Assim, as Igrejas de Hong Kong estão profundamente envolvidas no movimento, incluindo a diocese católica local. Seu bispo emérito, o cardeal Joseph Zen, conhecido por suas posições contra o regime de Pequim, convocou todos os habitantes de Hong Kong para se juntarem ao movimento. Muitas igrejas evangélicas fizeram o mesmo. O pastor batista Chu Yiu-ming, que já havia participado de um movimento pelo direito de voto em 2017, é um dos líderes religiosos conhecidos que se manifestam diariamente.
Quanto ao hino usado, ilustra também uma forma de globalização do cristianismo. Em Hong Kong, os grupos de estudantes católicos foram os primeiros a cantá-lo. No entanto, “Cante Aleluia ao Senhor” – hit frequentemente cantado em missas e cultos em todo o mundo, inclusive a França – vem dos Estados Unidos e tem origens protestantes. Canto de louvor por excelência, previsto para a Páscoa, evoca, pela sua melodia sóbria em menor e um texto que se sustenta numa só frase, o estilo neoclássico e ecumênico de Taizé. Na verdade, foi escrito em 1974 por uma certa Linda Stassen, que fazia parte do movimento hippie evangélico, os Jesus People. Inspirada pela liturgia dos primeiros cristãos, ela teria encontrado a melodia um certo dia... no chuveiro, explicou ela.
Primeiramente muito popular nos círculos evangélicos, a canção foi traduzida para outros idiomas nos anos 1980, quando também foi adotada pela Igreja Católica. Na França, ela é encontrada pela primeira vez, em 1986, nos cadernos da Juventude em Missão, uma organização missionária evangélica. E no lado católico, a Comunidade Emanuel é a primeira a incorporá-la aos seus livrinhos de canto, antes de se tornar uma música de massa muito popular. Destino engraçado, em suma, para um cântico que nasceu na Califórnia em uma assembleia pentecostal de zelosos convertidos.
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O canto cristão que serve de grito de guerra para os manifestantes de Hong Kong - Instituto Humanitas Unisinos - IHU