01 Agosto 2018
“O bloco BRICS, ao qual diversos analistas davam por morto, não apenas segue vivo: propõe agenda para o futuro e busca se ampliar”, escreve o cientista político e analista internacional Juan Manuel Karg, da Universidade de Buenos Aires, em artigo publicado por Página/12, 31-07-2018. A tradução é do Cepat.
A recente Cúpula dos BRICS, na África do Sul, foi significativa por várias questões, ainda que a imprensa hegemônica de nossos países tenha lhe dado pouca cobertura, só destacando as reuniões bilaterais. Tratou-se da décima cúpula do bloco de países integrados por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul: falamos de economias que, principalmente China e Índia, seguem sendo as locomotivas de crescimento de um mundo que ainda não se recupera totalmente da crise aberta em 2008.
Por outro lado, os BRICS tomaram nota das mudanças produzidas na governança global, após a ascensão de Donald Trump à Casa Branca. A guerra comercial China-Estados Unidos esteve onipresente na Cúpula, com Xi Jinping ressaltando a necessária revolução industrial para que os países BRICS e aliados possam ter uma melhor inserção em um mundo convulsionado. Em definitivo, dois planos: industrialização portas adentro – sobretudo na geração de produtos de alto valor agregado e transferência de conhecimento, algo que a China foi conquistando nos últimos anos, particularmente no plano tecnológico – e o fomento ao “livre comércio” frente a outros mercados, como resposta ao protecionismo de Trump. Não por acaso, o documento final menciona a OMC como reguladora do mercado internacional, organização na qual a China ingressou apenas em 2001.
Vladimir Putin, por sua vez, ressaltou sua visão sobre o conteúdo político do bloco, contestando aqueles que só destacam a faceta econômica do mesmo. Nesse sentido, é significativa a valorização do bloco sobre o acordo nuclear com o Irã, do qual Trump saiu meses atrás. No político, também se acrescenta algo vital: a ideia de Xi de ampliar a esfera de ação dos BRICS, em um BRICS Plus, com a presença de Argentina, México, Turquia e diversos países africanos que se reuniram em Joanesburgo. O próprio Macri chegou a falar de “Sul Global”, uma ideia alheia a sua visão da política exterior, de acordo com o que o auditório queria escutar (e a uma medida defensiva do Chefe de Estado, que teme a retirada de capitais chineses, após o cessar das represas no sul do país). O brasileiro Temer, ao contrário, nem sequer dissimulou sua orientação: falou do acordo Mercosul-União Europeia e saudou a Aliança do Pacífico, mandando também uma mensagem aos ouvidos de Washington.
Dez anos depois de sua criação, e com um crescimento de seus países menor ao daquele momento, mas igualmente maior do que a média mundial, os países BRICS seguem tendo um papel importante em termos geopolíticos. Contam com o Banco de Desenvolvimento criado em 2014, em Fortaleza, Brasil, quando a região era outra e da cúpula participavam Cristina Fernández de Kirchner e Dilma Rousseff. E discutem uma nova revolução industrial e uma ampliação em seu marco de alianças – Organização para a Cooperação de Xangai e Foro Valdai incluídos, além dos países da América Latina e África –, em momentos nos quais Estados Unidos e Europa decidem olhar apenas portas adentro, a tal ponto que intensificam as políticas anti-imigração.
A China, cabeça do bloco, optou em ser cautelosa durante as últimas décadas, sob o guarda-chuva do win-win (“ganham vocês e nós”, diziam de Pequim) e o não intervencionismo. Mas, agora parece, finalmente, levantar a cabeça para disputar com maior clareza o cenário internacional. O bloco BRICS, ao qual diversos analistas davam por morto, não apenas segue vivo: propõe agenda para o futuro e busca se ampliar. A América Latina deve tomar nota da importante reunião de Joanesburgo e atuar em consequência.
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Os BRICS e a quarta revolução industrial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU