06 Março 2018
Para ir de uma residência de Matamoros, no norte do México, a outra de Brownsville, no sul dos Estados Unidos, podem bastar menos de cinco minutos caminhando. São duas cidades tão coladas que quase poderiam ser uma só. E, claro, compartilham o mesmo clima e entre elas está tão somente o rio Bravo. Em um estudo sobre dengue feito nas duas, o município texano tinha uma incidência de 4%; o mexicano tinha sete vezes mais.
A reportagem é de Pablo Linde, publicada por El País, 05-03-2018.
Os mosquitos não são racistas, mas parece que entendem de classes sociais. As baixas levam a pior com suas picadas e as doenças que transmitem. A forma de armazenar a água, de tratar (ou não) os resíduos, o uso de ar-condicionado são determinantes para que se criem, vivam, reproduzam e alimentem em um ou outro lugar.
“O comportamento e os fatores socioeconômicos influem mais que nenhum outro na propagação de doenças causadas por vetores”, afirmou Jaime Torres, diretor do departamento de Medicina Tropical da Universidade Central da Venezuela, na XVIII Conferência Internacional de Doenças Infecciosas, que se realizou nos primeiros dias de março em Buenos Aires.
Em seu país, por exemplo, observou que as pessoas que vivem em barracos, ou ranchos, como lá são chamados esses tipos de assentamentos informais, têm 13 vezes mais probabilidade de serem infectadas por dengue do que alguém que more em um apartamento ou casa. Várias pesquisas de Torres mostram como a incidência dessa doença está diretamente relacionada com os níveis de renda.
O aedes aegypti, a espécie de mosquito que, além da dengue, transmite zika, febre amarela e chikungunya, vive comodamente quando as temperaturas beiram os 25 graus. E deixa suas larvas na água, por isso, os lugares onde fica parada depois das chuvas, seja em baldes que muitas comunidades de poucos recursos usam para armazená-la ou em pneus, plásticos e demais objetos descartados, são ideais para ele.
Em condições iguais, evidentemente, não diferencia entre classes sociais. Mas faz isso em função de outros padrões. Existem pesquisas nas quais gêmeos idênticos eram expostos ao inseto e recebiam em média o mesmo número de picadas. No entanto, se isso se fazia com gêmeos fraternos, a coisa variava. As diferenças genéticas entre pessoas podem fazer com que algumas sejam mais picadas que outras. “Por alguma razão que desconhecemos preferem as que têm mais colesterol ou esteroides na pele.
Também se inclinam para aquelas que emitem mais dióxido de carbono, o que inclui as grávidas; as que fazem exercícios, as que transpiram mais; as que produzem mais calor corporal; as do grupo sanguíneo O; e as que bebem álcool, especialmente cerveja”, relatou Torres. Também é preciso levar em conta que há indivíduos cuja reação à saliva do inseto é maior, por isso são mais conscientes das picadas, embora não necessariamente sejam mais picados que os outros.
Em sua palestra explicou que essa espécie de mosquito não costuma se deslocar mais de 50 ou 100 metros. Portanto, utiliza os veículos do ser humano para se locomover. A febre amarela, por exemplo, chegou da África para a América, com o tráfico de escravos. E foi se espalhando pela região no mesmo ritmo em que as pessoas se deslocavam. Porque esses insetos são “muito leais ao ser humano”, nas palavras de Torres; “Andam sempre com a gente”.
A globalização e os deslocamentos em massa de pessoas por todo o mundo estão fazendo com que essa espécie, e também as doenças que transmite, esteja se expandindo. Isso pode incrementar-se ainda mais com as mudanças climáticas, já que as variações de temperatura provavelmente os levarão a se adaptar melhor a lugares que agora são frios demais para eles. Também fugirão daqueles que se tornaram extremamente quentes, já que não suporta muito mais que 30 graus.
Todos esses fenômenos estiveram presentes nos recentes surtos de zika, chikungunya, dengue e febre amarela em vários países da América Latina nos últimos anos.
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Por que os mosquitos picam mais os mais pobres - Instituto Humanitas Unisinos - IHU