06 Fevereiro 2018
De acordo com pesquisa do IBGE, o número de pessoas na informalidade cresceu em mais de 500 mil no último ano.
A reportagem é de Júlia Dolce, publicada por Brasil de Fato, 05-02-2018.
Ao subir a rampa de entrada da estação de metrô Barra Funda, na zona oeste de São Paulo, o passageiro se sente em uma feira livre, passando por um túnel de ambulantes gritando promoções de uma grande variedade de produtos. De fones de ouvidos, chinelos de dedo, até diferentes marcas de doces, o fenômeno, conhecido como "shopping-trem", vem crescendo cada vez mais, principalmente dentro dos próprios vagões do metrô e da CPTM na cidade.
É o caso do vendedor ambulante de balas e chocolates Alexsander de Souza, de 40 anos, que já está no ramo há quatro anos, mas vê, a cada dia, a concorrência aumentar. Ele conta que, além das vendas, continua tentando arranjar um emprego formal, mas está pessimista.
"Já trabalhei um mês com carteira assinada, como ajudante geral. Mas está cada vez mais complicado achar emprego com carteira assinada, sem dúvida. Cada vez mais está aumentando o número de ambulantes. Tem um colega meu que era médico antigamente, há dois anos, hoje em dia ele é vendedor ambulante", contou.
A situação dos ambulantes no transporte público de São Paulo reflete os dados divulgados nesta semana pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De acordo com a pesquisa, o trabalho informal representou grande parte dos empregos gerados no país em 2017.
De 1,846 milhão de postos de trabalho gerados no último trimestre do ano passado, 589 mil vagas surgiram no setor privado sem carteira de trabalho assinada. A esse número, somam-se 1,07 milhão de pessoas que passaram a atuar como trabalhadores autônomos.
Esse número é preenchido, por exemplo, por um grupo relativamente novo no mercado: os motoristas de aplicativo. Segundo a empresa Uber, já são 500 mil motoristas contabilizados no país. Embora parte dos motoristas de aplicativo utilizem o serviço como complemento de outra renda fixa, um grupo significativo deles são representados por pessoas que perderam seus empregos nos últimos anos.
O motorista Alexsandro Costa Damaceno, que vive em Alagoinhas, no interior da Bahia, trabalha por meio do aplicativo de celular há sete meses. Técnico em eletrônica industrial, ele prestou serviço para a Petrobras por 14 anos, mas com a crise política e econômica no país, teve seu contrato encerrado em maio do ano passado.
"A gente que tem filho não pode se dar ao luxo de ficar parado, tem que ter uma renda no final do mês, até mesmo porque as contas não esperam. Eu fico triste porque a gente investe tanto, tem curso técnico, se qualifica, e hoje todo mundo parado", lamentou.
Os dados da PNAD mostram também que o número de pessoas inseridas no mercado de trabalho com carteira de trabalho assinada encolheu em 2%, o que representa um total de 685 mil pessoas. Apesar do quadro negativo, o governo golpista de Michel Temer vem anunciando com otimismo a queda no desemprego do país, que terminou o ano em 11,8%.
Para a economista e pesquisadora do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Adriana Marcolino, o crescimento do trabalho informal está sendo usado pelo governo para maquiar os impactos da crise econômica no país.
"Vi o governo divulgando esse dado como se fosse positivo, como se fossem pessoas indo empreender. Mas na verdade os trabalhadores por conta própria são pessoas que não veem oportunidades de emprego. Se a gente olha com cuidado para os dados e vê que tipo de emprego está sendo gerado. São empregos que você tem menos acesso a benefícios e proteção social, benefícios que compõem a renda também", explicou.
O motorista Alexsandro opina que não tem sentido o crescimento econômico divulgado pelo governo, e que sente falta de ter seu registro na carteira. "Temer está abrindo a boca e dizendo que tudo está melhorando, eu não estou vendo isso, meus colegas continuam todos parados", relatou.
A jovem Karen de Macedo, moradora do Jardim Eliane, na zona leste de São Paulo, começou em um novo emprego na semana passada, na cantina de uma escola estadual no bairro do Butantã. Antes desempregada, após trabalhar informalmente por meses em um posto de gasolina, ela conta que o atual emprego também não será registrado na carteira de trabalho, e sim por meio do que ela chama de "contrato de boca".
"Está quase impossível, ninguém está querendo registrar mais. Mas a gente acaba aceitando por necessidade, né, eu tenho um filho de oito anos para criar. É complicado, todo mundo fica inseguro, se você sofre um acidente você não tem o recurso de ficar tranquila porque vai ter um dinheiro para pagar as contas e alimentar a família. Você também acaba aceitando horários exorbitantes. No posto de gasolina eu não tinha horário, tinha dia que entrava às 6 da manhã, saía às 14h, voltava às 18h e saía às 3h da manhã. Não tem horário para se alimentar, porque não tem uma hora de almoço garantida", denunciou.
Ao longo dos seus 26 anos, Karen já trabalhou em diversos lugares, mas apenas dois deles a registraram. Acostumada, ela explica que pretende começar um curso de pedagogia a partir do segundo semestre deste ano, na expectativa de seguir o sonho de ser professora e conseguir escapar da informalidade. O diploma universitário, no entanto, não tem sido a garantia de um emprego formal para muitos jovens.
É o caso da jornalista Carolina Ellmann, que se formou no fim de 2017, e já vinha procurando emprego ao longo do ano, também na capital paulista. Na falta de vagas que cumprem os direitos trabalhistas, ela vem juntando dinheiro por meio da venda de cosméticos e terapias naturais.
"Eu encontro vagas absurdas que estão me fazendo desistir de procurar trabalho na área do jornalismo. Nenhuma vaga é CLT que eu encontrei e todas tem salário de R$400 reais para trabalhar 6, 8 horas, ou um salário de R$1.000, igual o que eu ganhava quando estagiava, para trabalhar "até o trabalho acabar"", afirmou.
Com as novas regras da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que entraram em vigor em novembro do ano passado, a expectativa é que as vagas de trabalho precarizadas aumentem ainda mais. É o que opina a pesquisadora do Dieese.
"A reforma trabalhista primeiro deixa o trabalhador mais vulnerável, porque o empregador ganhou mais poder nas relações de trabalho, e por outro lado você criou uma série de contratos de trabalho que maquiam situações precárias no mercado de trabalho, como o trabalho intermitente, que você contrata uma pessoa em uma situação praticamente de bico", afirmou.
Desde o início de vigência da nova lei, em novembro do ano passado, mais de 3 mil postos de trabalho intermitente foram gerados. Em dezembro, foram mais de 2.500 admissões por meio desse tipo de contrato.
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Trabalhadores informais denunciam dificuldade em encontrar vagas registradas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU