18 Agosto 2017
“Trump publicamente manifestou uma equivalência moral entre os raivosos que organizaram e lideraram esta manifestação pública e o contingente que se pôs contra a intolerância e o fanatismo. Não é possível analisar de outra forma este erro presidencial se não concluindo que o presidente ou é incapaz ou não está disposto a dar o testemunho moral exigido pelo seu cargo”, denuncia o editorial da revista America, publicação dos jesuítas norte-americanos, publicado no dia 16-08-2017. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Segundo editorial, “cabe ao povo agir. Diante da intolerância, do fanatismo não pode haver ambivalência: devemos denunciar em termos seguros e certos todas as formas de supremacia branca, antissemitismo e violência, que obstinadamente continuam fazendo parte da experiência americana”.
No sábado, 12 de agosto, uma manifestação do movimento “Unite the Right” foi organizada por nacionalistas brancos em Charlottesville, na Virgínia, em oposição à remoção de uma estátua do general confederado Robert E. Lee pela prefeitura da cidade. Os participantes do evento, muitos vindos de longas distâncias, entoavam lemas inspirados no nazismo como “Sangue e Solo” e “Os judeus não nos substituirão!”. Este dia, marcado por momentos de tensão, ficou manchado tragicamente com um derramamento de sangue, quando um motorista – depois identificado como membro de um movimento supremacista branco – lançou o carro que dirigia em direção à multidão de contramanifestantes pacíficos, levando uma pessoa a óbito, enquanto mais de duas dúzias ficaram feridas.
Deveria ser óbvio – um reflexo automático – condenar a supremacia branca, o racismo e o ódio que levaram diretamente a esta violência inconcebível. Certamente o é para os nossos companheiros americanos cujas vidas são diariamente assombradas pelos espectros do racismo e do antissemitismo.
No entanto, não óbvio não foi para o presidente dos Estados Unidos. Por, no mínimo, duas vezes Trump publicamente manifestou uma equivalência moral entre os raivosos que organizaram e lideraram esta manifestação pública e o contingente que se pôs contra a intolerância e o fanatismo. Não é possível analisar de outra forma este erro presidencial se não concluindo que o presidente ou é incapaz ou não está disposto a dar o testemunho moral exigido pelo seu cargo.
Cabe ao povo, portanto, agir. Diante da intolerância, do fanatismo não pode haver ambivalência: devemos denunciar em termos seguros e certos todas as formas de supremacia branca, antissemitismo e violência, que obstinadamente continuam fazendo parte da experiência americana. Devemos também reconhecer que esta herança de racismo e opressão se expressa, hoje, em realidades sociais e econômicas injustas que destroem o tecido social do país e põem vidas, especialmente a vida das pessoas de cor, em risco. “Colocamo-nos contra o mal do racismo, da supremacia branca e do neonazismo”, diz um comunicado divulgado esta semana pela Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos. “Estejamos ao lado dos nossos irmãos e irmãs unidos no sacrifício de Jesus, por quem a vitória do amor sobre toda forma do mal está assegurada”.
Unimo-nos aos bispos na condenação destas ideologias odiosas de opressão e lembremos o apelo à ação feito pelo Dr. Martin Luther King Jr.: “A verdadeira medida de um homem não é como ele se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas como ele se mantém em tempos de crise e desafios”.
Ouçamos as palavras de Santo Inácio de Loyola, segundo as quais “o amor se manifesta mais nas obras do que nas palavras”. Acima de tudo, este é o momento de agir, pacificamente, em nossas igrejas, nas comunidades locais e nos organismos legislativos e, especialmente, nas interações humanas em nossa vida diária.
A todos os católicos, mas em particular os católicos brancos, assumir estas ações pode exigir uma conversão profunda e mesmo dolorosa: “A história, como a oração, importa quando se dirige às raízes profundas do racismo na Igreja Católica e nas famílias católicas”, escrevia Michael Pasquier na revista America em 2016. “[Porém] ao pensar sobre o passado e ao nos ajoelharmos, [como católicos brancos] iremos ter de admitir alguns pecados terríveis, pecados dentro dos quais nascemos e fomos criados, pecados que mantemos vivos naquilo que temos feito e naquilo que não temos feito”.
O caminho a seguir não é o da “lex talionis” [lei de talião], nem devemos combater o ódio com ódio. O caminho a seguir é o trajeto da penitência e do profeta. Devemos agir, com coragem, em nome dos que são perseguidos ou que correm perigo de perseguição.
Mas devemos proceder em humildade, a partir do reconhecimento vívido de que somos os pecadores redimidos em Cristo e que estamos chamados à reconciliação. O dever cristão exige que nomeemos e denunciemos claramente o mal. Exige que ajamos contra o mal em todo lugar. Ele também exige que busquemos amar o perpetrador do mal e não desistir da esperança de que eles possam perceber os erros cometidos e buscar a redenção. Essa talvez seja a obra mais incômoda de todas.
O mundo justo a que somos chamados a criar exige, de cada um de nós, nada menos do que os atos radicais de amor e misericórdia aos quais o Evangelho dá testemunho. Peçamos, pois, pela graça abundante para agir, em paz, por justiça. Oremos, supliquemos, pela coragem para agir já.
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Os católicos precisam combater o racismo e a intolerância em todo lugar, afirma editorial da revista dos jesuítas americanos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU