Eleições francesas: atacando Francisco, Le Pen tenta uma aproximação com os ultracatólicos

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25 Abril 2017

Francisco entrou na campanha presidencial da França. Não por sua iniciativa, mas habilmente trazido em causa pela líder da Frente Nacional, Marine Le Pen. Terrorismo, imigração, "soberania" são os temas centrais de uma campanha em que Marine Le Pen joga a maior aposta de toda a sua carreira política. E, neste jogo que será disputado no fio da navalha, o voto católico conservador tem seu peso. Mantê-lo de forma compacta do seu lado, motivá-los para ir às urnas e não ceder ao desgosto que leva a abstenção, é de extrema importância.

A reportagem é de Marco Politi, publicada por Il Fatto Quotidiano, 22-04-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.

Nessa perspectiva, as duras palavras contra a hierarquia eclesiástica pronunciadas há poucos dias por Marine durante uma entrevista ao jornal católico La Croix, não foram um desabafo ou uma simples bravata, mas uma peça precisa de sua estratégia para tentar garantir a vitória, pelo menos no primeiro turno.

Marine Le Pen jamais declarou - como relatado pela maioria da imprensa italiana – estar ‘irritada’ com a Igreja. Isso teria sido quase um gesto de descontrole, fato que não condiz com que alguém que esteja envolvida na construção, ano após ano, mês após mês, de uma imagem presidencial. A líder da Frente Nacional foi mais sutil, escolhendo cuidadosamente cada palavra para atrair para si a massa de um "catolicismo profundo", que nutre extrema aversão pela mensagem político-religiosa de Francisco e, mais genericamente, pela doutrina social da Igreja como foi sendo formada após o Concílio Vaticano II. Uma doutrina que, aos olhos dos católicos ultratradicionalistas cheira à “esquerda”.

"Sou extremamente crente", respondeu a candidata presidencial à indagação do La Croix a respeito de sua relação com a religião. Mas, em seguida, acrescentou "e tive sorte de jamais ter duvidado". Essa é a primeira mensagem aos católicos duros e puros, defensores da Tradição imutável e pouco convencidos de todas as reflexões teológicas sobre a dúvida, o discernimento, a atualização de práticas e maneiras de apresentar e viver a doutrina. Depois, Marine jogou sua cartada: “É verdade, estou ofendida com a Igreja, porque eu acho que se ocupa de tudo, exceto do que lhe diz respeito. Parece-me que em determinadas circunstâncias pessoais, faltou-lhe compaixão”. Eis a flecha envenenada. A líder da Frente Nacional declara-se ofendida (não com raiva, ndr), ferida porque a Igreja e seus líderes no episcopado francês e, em sentido mais amplo, na direção impressa pelo atual pontífice, "esta Igreja" fala de tudo, exceto das coisas que deveriam estar em seu âmbito. O subentendido é tácito: não fala de fé. E, ainda por cima, falta-lhe "compaixão", que se pode dizer é justamente um dos traços mais característicos do pontificado de Bergoglio. Note-se que a acusação de falta de "misericórdia" é a mesma utilizada nos cartazes anti-Papa, afixados recentemente no centro de Roma pelos opositores do atual Pontífice. O ataque completa-se com a acusação diretamente direcionada para Francisco de querer impor aos Estados uma atitude de caridade (em relação aos imigrantes) que deve permanecer individual, mas se torna uma ingerência quando obriga a um acolhimento na ausência de condições reais para colocá-la em prática.

Poucas palavras, mas nas quais se condensa toda a oposição da parte mais fechada do catolicismo francês (e não apenas deste) para a mensagem central de Francisco: o testemunho do Bom Samaritano, que, obviamente, tem implicações sociais e políticas.

Existe uma parte da França católica profunda, que se sente afagada, reconhecida e atraída pelas posições expressas por Marine Le Pen e pelo juízo de condenação e aversão, que transparece - além do respeito formal – nos confrontos do papa Bergoglio.

A França é um dos países onde a cisão anticonciliar do monsenhor Lefebvre teve, em alguns círculos, maior eco. Aquele amálgama de entrelaçamentos entre catolicismo, nacionalismo e espírito fortemente reacionário, imbuído de antissemitismo e aversão à democracia, que no início do século XX manifestou-se no movimento Action Française (mais tarde excomungado pelo Papa Pio XI) é um fenômeno que se arrasta nos subterrâneos da história da França.

É verdade que nesta campanha presidencial também outro candidato, François Fillon, com seu manifesto rótulo de "católico praticante" está lutando para trazer para o seu lado o voto do catolicismo conservador. A sua candidatura obteve a importante adesão do movimento "Manif pour tous", que fez oposição com manifestações de massa contra o casamento entre homossexuais.

O jogo ainda está em aberto. Não há dúvida de que projetar-se em uma direção ou em outra do núcleo duro do catolicismo francês terá o seu peso. Nos Estados Unidos - não pode ser esquecido - 55 por cento dos votos dos católicos brancos foram para Donald Trump, que não por acaso anteontem evocou veladamente uma vitória de Marine Le Pen, afirmando que o ataque terrorista em Paris terá um "grande efeito" sobre as eleições presidenciais.

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