12 Setembro 2016
"É difícil imaginar que, neste momento, a Igreja possa mudar de rota em relação a Francisco, que está se revelando como um pontífice de notabilíssima qualidade: conservador na substância naquilo que diz respeito à doutrina e à organização da Igreja, mas capaz de testemunhar uma empática proximidade a todos os seus semelhantes (católicos ou não) e de praticar uma política de inclusão que mantém precisamente todos dentro."
A opinião é do sociólogo italiano Marco Marzano, professor da Universidade de Bérgamo, em artigo publicado no jornal Il Fatto Quotidiano, 13-05-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A um papa "bom", tão compreensivo e cheio de misericórdia pelos pecadores como Francisco, sucederá um pontífice severo e tradicionalista como o que nasceu da imaginação artística de Paolo Sorrentino?
O pontificado de Bergoglio poderia produzir como reação uma reviravolta conservadora tão profunda a ponto de nos reportar a um sucessor de Pedro que se moverá mais para a direita do que Ratzinger e escolherá para si o nome (Pio) predileto pelos papas reacionários da era pré-conciliar?
É sempre complicado fazer previsões confiáveis nesse campo: quer pela intervenção do Espírito Santo, para aqueles que nele acreditam, quer pela inquietante clarividência de uma elite que governa com sabedoria há milênios, quer porque a história está cheia de "efeitos perversos", ou seja, de papas eleitos para reformar e que se revelaram conservadores e, ao contrário, de reacionários no papel que, depois, demonstraram ser corajosos inovadores.
De fato, é tão ampla a disparidade de poder e de iniciativa entre um alto dignitário – digamos, o arcebispo de Milão (Montini) ou o de Cracóvia (Wojtyla) – e o pontífice máximo, que muitos pretendentes ao trono vaticano revelam o próprio programa de governo apenas depois de terem sido eleitos.
O caso exemplar na história recente é o de João XXIII: quem esperava que aquele idoso ex-diplomata eleito para uma transição rápida convocasse um grande Concílio Ecumênico?
Logicamente, a orientação do novo papa deveria ser decidida pelas nomeações cardinalícias feitas pelo anterior. Se funcionassem assim, quanto maior fosse o comprimento de um pontificado, mais elevadas seriam as probabilidades de ter um sucessor alinhado com o antecessor. Mas essa regra também foi muitas vezes violada. De modo surpreendente no último conclave, onde prevaleceu Bergoglio.
Em 1978, à distância de poucos dias, o mesmo colégio eleitoral elegeu, primeiro, o reformista Luciani e, depois, o conservador Wojtyla. Mas o exemplo de Bergoglio sugere uma chave de leitura claramente diversa da alternância entre os pontífices, na qual o confronto entre facções é substituído pela designação (consensual) do melhor candidato, isto é, do mais apto às contingências da época.
Nessa perspectiva, as reuniões do conclave se assemelhariam mais às de um conselho de administração que deve escolher o novo diretor-executivo do que a um Parlamento democrático onde direita e esquerda se contrapõem.
A Igreja não é uma estrutura democrática, mas sim uma organização oligárquica liderada por um monarca eleito. O interesse dos hierarcas é o interesse, comum e compartilhado, de perpetuar no tempo as fortunas (mesmo as materiais), o poder e a glória da instituição à qual todos pertencem.
O sucessor de Pedro tem esta tarefa e, portanto, não importa tanto se ele é, por si só, conservador ou reformista, mas se pode garantir a continuidade e o bem-estar da organização e, especialmente, de quem a dirige. Se fosse assim, é difícil imaginar que, neste momento, a Igreja possa mudar de rota em relação a Francisco, que está se revelando como um pontífice de notabilíssima qualidade: conservador na substância naquilo que diz respeito à doutrina e à organização da Igreja, mas capaz de testemunhar uma empática proximidade a todos os seus semelhantes (católicos ou não) e de praticar uma política de inclusão que mantém precisamente todos dentro.
É razoável imaginar que esse estilo de governança não será jogado às traças e que, ao contrário, poderia ser relançado pela eleição como sucessor de Francisco de um papa com características semelhantes ao papa argentino, mas mais jovem e, portanto, capaz de governar por mais tempo. Admitindo-se que ele seja encontrado. No Norte ou, sobretudo, no Sul e no Leste do mundo, longe de um Ocidente espiritualmente inquieto demais e saciado de recursos.
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As incertezas sobre o próximo papa: quem poderá substituir Francisco? Artigo de Marco Marzano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU