Publicamos aqui o comentário do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose e da Casa della Madia, sobre o Evangelho deste domingo, 9 de julho de 2023, 14º Domingo do Tempo Comum (Mt 11,25-30).
A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Depois do discurso missionário dirigido por Jesus aos discípulos (cf. Mt 10), no Evangelho segundo Mateus, lemos uma seção narrativa que nos testemunha a existência em torno do próprio Jesus de um clima de tensão e de contradições à sua pessoa (cf. Mt 11-12).
Da prisão, João Batista manda os seus discípulos lhe perguntarem: “És tu aquele que há de vir, ou devemos esperar outro?” (Mt 11,3). Pergunta que expressa não uma falta de fé, mas uma dúvida à qual Jesus responde renovando a fé de João, percebendo também, porém, que, diante da própria palavra e do próprio estilo, há quem se interrogue.
Enquanto isso, Jesus conhece também a rejeição por parte daqueles aos quais ele se sentia enviado como porta-voz de Deus e se pergunta por que aquela geração que rejeitou João, asceta rigoroso, rejeita também a ele, que, em vez disso, mostrou um rosto misericordioso, acolhedor e solidário aos pecadores (Mt 11,16-19). Justamente as cidades em que Jesus tinha feito ações prodigiosas, como Corazim e Betsaida, as “suas cidades”, evangelizadas por ele, não deram sinais de conversão (cf. Mt 11,20-24)...
O contexto, portanto, é pesado, é uma hora de prova no ministério de Jesus, uma hora em que são possíveis ou, melhor, quase fisiológicos o desencorajamento e a sensação de fracasso. Mas Mateus enfatiza que, justamente “naquele tempo” (en ekeíno tô kairô), naquela hora de “crise”, Jesus faz brotar de seu coração um hino de louvor alegre e convicto a Deus: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado”.
Não é um lamento que se eleva de Jesus a Deus, mas sim uma confissão que é louvor e bênção. Jesus se dirige a Deus com uma confiança única: ele o chama de “Pai”, em aramaico “Abba”, porque, nesse nome, estão contidos, para Jesus, a ternura, o amor e a misericórdia. Deus é Criador e Senhor do céu e da terra, é o Altíssimo, mas o fiel o reconhece em uma relação de intimidade paterna, cheia de sentimentos de amor. Por isso, Deus é adorado como Senhor, é invocado e fala-se com ele como com um Pai.
Assim, Jesus o invoca e confessa sua fé nele: “Pai, proclamo o teu louvor, reconheço a tua vontade e o teu agir: aquilo que escondeste àqueles que estavam convencidos de o merecerem, tu revelaste aos pequenos que não ostentavam nenhum mérito”.
Certamente, aqui, a linguagem de Jesus, que traz a marca do estilo semita, deve ser decodificada. Pareceria, de fato, que Deus esconde algo arbitrariamente, a verdade profunda, aos sábios e intelectuais, enquanto se reserva a comunicá-la apenas aos pequenos, aos pobres e aos últimos. Como se houvesse, nas palavras de Jesus, uma condenação da inteligência e uma exaltação da ignorância...
Não! Conhecemos bem os semitismos, expressões linguísticas segundo as quais aquilo que ocorre sempre tem Deus como sujeito, porque se expressa de modo forte e direto a ação de Deus, sem considerar a dinâmica em seu desenvolvimento. É a mesma dinâmica presente no livro do Êxodo: “O Senhor endureceu o coração do faraó, e este não deixou que os filhos de Israel partissem” (Ex 10,20). Como devemos compreender tais palavras? Deus enviou sua palavra de salvação ao faraó, por meio de seus mensageiros, mas ele a rejeitou, de modo que o resultado foi o endurecimento de seu coração. É o faraó, com sua responsabilidade por ter rejeitado a palavra de Deus, que endurece seu coração em plena liberdade e responsabilidade pessoal.
Do mesmo modo, o nosso trecho evangélico não deve ser entendido no sentido de que Deus impede a revelação aos sábios e aos intelectuais deste mundo; por meio de Jesus, Deus se dirige a eles, mas eles não acolhem a sua palavra e, ao fazer isso, endurecem ouvidos e coração. Eis como ocorre o escondimento das coisas de Deus.
Não somos, talvez, também nós testemunhas dessas realidades? Justamente aqueles que são sábios, que mundanamente adquiriram sabedoria, justamente aqueles que são exercitados intelectualmente e alcançaram uma alta qualidade de conhecimento mundano da realidade não são capazes de se abrir à boa notícia do Evangelho e de acolhê-la.
O apóstolo Paulo viu e experimentou esse mesmo insucesso do Evangelho, quando pregou diante dos sábios e dos intelectuais deste mundo, como ele testemunha na Primeira Carta aos Coríntios: “A linguagem da cruz é loucura para aqueles que se perdem. Mas, para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus. (…) Onde está o sábio? Onde está o homem culto? Onde está o argumentador deste mundo?” (1Cor 1,18.20).
O resultado da pregação do Evangelho é uma loucura! Aderem a ele os pobres, os últimos, as vítimas e os descartados da sociedade, aqueles que não importam, enquanto rejeitam esse dom os sábios, os intelectuais, os nobres, as elites e aqueles que importam, “os árchontes deste mundo” (1Cor 2,8).
“Sim, Pai, assim quiseste na tua bondade.” Aquele que olha para a humildade de seus servos, que perscruta e discerne quem é pequeno, que conhece o coração daqueles que, em sua pobreza, esperam somente no Senhor quis que o véu que esconde muitas coisas referentes ao Salvador e à salvação fosse levantado (re-velação) para os pequenos.
Olhando para essas pessoas, Jesus as tinha chamado de bem-aventuradas (cf. Mt 5,1-12), sempre as havia encontrado e acolhido, sempre havia potencializado a confiança e a liberdade delas, e essa era sua experiência: estes pequenos acreditaram, minoria bendita em meio a tantos indiferentes e a outros hostis a Jesus e a seu Evangelho. É paradoxal, mas é assim que ocorre quando o Evangelho é anunciado e chega aos homens e às mulheres!
Mas o que são “estas coisas” que Deus escondeu aos sábios e revelou aos pequenos? Essencialmente, a revelação de que Jesus é aquele que conta e narra Deus (cf. Jo 1,18); e, ao mesmo tempo, a revelação por parte do Pai de Jesus, o Filho, ao fiel. Sobre tal verdade, Jesus voltará novamente no Evangelho segundo Mateus: “A vós foi dado conhecer os mistérios do Reino do Céu, a vós, pequenos, pobres e humildes, a vós, discípulos” (Mt 13,11). A missão de Jesus e, consequentemente, a do discípulo, do enviado, só pode ocorrer assim: no fracasso e no sucesso, descobrem-se as intenções mais profundas com as quais Deus confia uma missão ao próprio discípulo.
E eis-nos diante da grande revelação, que alguns definiram como “um meteorito joanino” que caiu em Mateus. Sem projetar sobre essas palavras noções teológicas que a Igreja soube formular mais tarde, com a ajuda do Espírito Santo, tentemos compreender essa autorrevelação de Jesus em sua luminosa simplicidade: “Tudo me foi entregue por meu Pai, e ninguém conhece o Filho, senão o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar”.
A Jesus foi dado tudo, porque ele é o Filho do Pai, aquele que somente o Pai conhece, a ponto de poder dizer sobre ele: “Tu és o meu Filho, o amado” (cf. Mt 3,17; 17,5). Mas também somente Jesus conhece plenamente o Pai, Deus, porque dele veio ao mundo, e somente Jesus pode dar Deus a conhecer ao seu discípulo, porque ninguém vai ao Pai senão por meio dele (cf. Jo 14,6).
Eis a revelação da identidade de Jesus, de sua relação com Deus, do conhecimento de Deus por parte do discípulo. Estamos no ápice da revelação divina de Jesus segundo o primeiro evangelho. É esse o mistério entregue ao discípulo, mistério a ser adorado, a ser acolhido em silêncio, a ser vivido cotidianamente no fiel seguimento de Jesus que nos leva ao Pai...
Por isso, justamente naquela hora, Jesus se dirige às pessoas com um convite: “Vinde a mim todos vós que estais cansados e fatigados sob o peso dos vossos fardos, e eu vos darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, ‘e vós encontrareis descanso para a vossa vida’ (Jr 6,16). Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”.
Jesus chama a si aqueles que buscam a Deus, desejam ver seu rosto, querem ter comunhão com ele, mas estão sobrecarregados por preceitos humanos, intransigências religiosas, rigidez moral, ensinamentos não traduzíveis em vida... Chama-os a si porque seu “jugo” é doce, leve, simples e requer apenas ser acolhido com alegria, confiando no amor de Deus que é sempre previdente e nunca deve ser merecido.
Jesus é o homem das bem-aventuranças, proclamadas porque são vividas por ele em primeira pessoa: ele é pobre e humilde, capaz de chorar, manso, faminto e sedento de justiça, puro de coração, operador de paz, perseguido. Para quem se encontra nessas condições, ir a Jesus significa encontrar comunhão, consolação, intimidade de um mestre que, com doçura e humildade, acolhe sempre e não exclui ninguém. Quem não consegue suportar os pesos das leis, quem só consegue dizer: “Tem piedade de mim, que sou pecador” (Lc 18,13) pode ir a Jesus que o acolhe em seus braços e nele repousar. Porque repousar, acima de tudo, é poder habitar na quietude entre os braços de quem nos ama sem reservas.
Há um jugo construído pelos seres humanos, que contém mandamentos, preceitos, observâncias, intransigências, e há o jugo de Jesus, que é acolhida do amor, da misericórdia de Deus, do amor de irmãos e irmãs. O jugo de Jesus não é sem esforço: mas uma coisa é se esforçar por ser obrigado por preceitos, outra coisa é se esforçar por amor e recebendo amor. Só os pequenos, porém, entendem essa revelação, hoje como então.