Subsídio elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana - ESTEF:
Dr. Bruno Glaab
Me. Carlos Rodrigo Dutra
Dr. Humberto Maiztegui
Me. Rita de Cácia Ló
1ª Leitura: Eclo 3,19-21.30-31
Salmo: 67,4-7ab.10-11
2ª Leitura: Hb 12,18-19.22-24ª
Evangelho: Lc 14,1.7-14
Os chamados “sinais” que aparecem com frequência no Evangelho segundo a Comunidade de João, correspondem ao termo grego “seméon” como aparece no texto deste domingo ou “seméia” que também pode ser traduzido como “milagre” (Jo 2,18.23; 3,2;4,8.54; 6,2.14.26.30;7,31; 9,16; 10,41; 11,47; 12,18.37; 20,30), indo além da parte onde esse tema é mais focado, no chamado “Livro dos Sinais” (Jo 2,1-11,54). De fato, o sentido do “milagre” neste Evangelho escrito na virada do primeiro para o segundo século da Era Cristã, vai muito além de demonstrar o poder de Deus como algo extraordinário. Em João o projeto de Jesus é sinalizado desta forma. É um modelo que a vida e a prática da Comunidade da Palavra Encarnada de Jesus, é chamada a fazer ecoar em todos os tempos e todos os lugares.
O texto abre afirmando “três dias depois”, isto é, o tempo da ressurreição, o tempo em que Jesus reerguerá o Templo, isto é, inaugurará o novo projeto de vida e paz (cf. Jo 2,19). Ao encerrar se afirma: “este é o primeiro sinal” onde “manifestou sua glória” e “os discípulos creram”, isto é, onde ficou evidente o sentido de sua encarnação, da sua cruz e da sua ressurreição.
A narrativa das chamadas “Bodas” (festa de casamento) de Caná da Galiléia, abre, ou introduz, como um pequeno prólogo, o “Livro dos Sinais”. Até hoje no “Levante” ou “Oriente Médio”, as festas de casamento são, de longe, a maior de todas as festas! Jesus, os discípulos e a Mãe dele, Maria, são convidados à festa. Esta é a primeira parte do sinal: a festa em si. O projeto de Jesus é de comunhão, amor, alegria, é a autêntica Shalom hebraica. A paz que emerge da alegria, da fartura, da liberdade de se manifestar através da comensalidade, da dança o canto e a cultura.
O assunto do “vinho” na festa, preenche o centro da narrativa: vinho é a bebida fermentada que é sinônimo da shalom. Jesus escolherá o vinho para sinalizar seu “sangue”, isto é, sua entrega total ao projeto da vida, do amor e da paz. Neste mesmo Evangelho, no chamado “grande discurso eucarístico”, em 6,53; se afirma: “Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos”. Mas, a festa, isto é, o projeto de vida em Jesus, não é possível sem Ele, pois faltará vinho. Para que a festa seja completa e a shalom se realize plenamente. Caná fica na fronteira entre a Galiléia e a Samaria, e as talhas serviam para a purificação de quem tinha passado pela terra impura do povo samaritano. Portanto, este vinho novo purifica todas as pessoas que podem ser incluídas na festa.
Maria é uma figura central nesta narrativa. João não inclui a narrativa das origens familiares de Jesus como em Mateus e Lucas, mas, neste prólogo da apresentação de seu projeto, mostra que sem Maria não teria sido possível! Maria é mãe profética, não apenas mãe biológica! Ela marca a hora em que o projeto de Deus em Cristo começará a se manifestar, embora ainda deva ser consumado, como indica a frase: “Minha hora ainda não chegou” (2,4b). Ela, representando todas as mulheres que organizam e cuidam da festa da vida, percebe que a festa está ameaçada, e conhece o poder divino presente em seu Filho para garantir sua plena realização. Maria, mãe e profetisa, dá a ordem para que o projeto da vida comece a se realizar: “façam o que eles lhes dizer” (2,5b).
O Trito Isaías (56-66) é uma maravilhosa peça literária de caráter utópico-escatológico, composta pela comunidade que retorna do exílio babilônico depois de ter visto tudo o que amava ser destruído e seu povo ser levado cativo. Para esta comunidade, tão marcada pelo sofrimento e a destruição, o projeto de Deus também é comparado como uma festa de casamento que une profundamente e permanentemente Deus ao seu povo e traz grande alegria (cf. Is 62,5).
Festa, como afirma 1 Cor 12, é unidade na diversidade, onde todos os dons do Espírito colaboram para a mesma finalidade de viver o amor e a paz.