17 Dezembro 2018
Foram 13 dias de reuniões para que países chegassem ao conjunto de regras. ONGs condenam a falta de novos compromissos e autoridades falam em consenso possível.
A reportagem é publicada por G1, 16-12-2018.
Há três anos, em 2015, 195 países fizeram promessas voluntárias para limitar o aquecimento global no Acordo de Paris. Agora, na COP 24, na Polônia, o desafio era estipular como cumprir seus próprios objetivos climáticos. Foram 13 dias de encontros e intensas negociações, incluindo um atraso de um dia em relação à expectativa inicial para as negociações, até que um documento final fosse alcançado no sábado (15).
Mas o "livro de regras" e as diretrizes receberam críticas: ambientalistas apontam que falta ambição para cumprir o combinado, consequência da oposição de países como Arábia Saudita, os Estados Unidos, a Rússia e o Kuwait.
A decisão sobre como deveria funcionar um sistema de comércio de emissões de carbono foi adiada para a reunião do próximo ano, que deve acontecer no Chile devido à desistência do Brasil. Os países também concordaram em considerar a questão de elevar as ambições em uma cúpula da ONU em Nova York, prevista para setembro de 2019.
Abaixo, veja os principais pontos do relatório final da COP24 e o posicionamento de autoridades e ambientalistas:
O principal objetivo da COP24 era fechar o "livro de regras" do Acordo de Paris, firmado em 2015, no qual 195 países se comprometeram a limitar o aquecimento da Terra a até 2ºC até o fim do século — com esforços para que a temperatura não subisse mais de 1,5ºC.
Havia dúvidas, no entanto, sobre a influência que um relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado em outubro, teria sobre as negociações. A organização reforçou que o ideal era que a temperatura não subisse mais que 1,5ºC nesse período de tempo. Mesmo esse aumento, afirmaram especialistas, traria maior risco de fome no mundo, principalmente nos locais mais pobres.
Mas os países não concordaram em "acolher" este relatório, devido à oposição de um grupo de nações liderado por Estados Unidos e Arábia Saudita, que descartaram reconhecer essa conclusão do documento.
Por fim, no livro de regras, limitaram-se a "convidar as partes a fazer uso das informações contidas no relatório". Tampouco avançaram no debate para aumentar suas metas de redução de emissões fixadas de forma voluntária em 2015, contentando-se em citar "esforços para elevar as ambições em 2020".
Segundo informações da agência AP, o texto final nas conversações das Nações Unidas omite uma referência anterior a reduções específicas nas emissões de gases com efeito de estufa até 2030, e meramente acolhe a "conclusão oportuna" do relatório do IPCC, e não as suas conclusões.
Mais de 160 países já apresentaram seus objetivos de redução das emissões, e os demais deverão fazê-lo até 2020. As metas de cada um devem ser atualizadas a cada cinco anos.
A COP24 fixou as regras sobre como verificar que estas metas sejam cumpridas a partir de 2024, seguindo as diretrizes do IPCC nesta matéria. A cada dois anos, os países apresentarão um relatório detalhando suas ações climáticas, que será avaliado por especialistas, mas sem a possibilidade de se aplicar sanções.
A cada cinco anos, a partir de 2023, os países farão um balanço mundial de seus esforços coletivos para alcançar o objetivo de limitar a temperatura global.
Em todos estes casos, haverá flexibilidade em relação aos países menos avançados e aos Estados insulares, em função de suas capacidades.
O Acordo de Paris prevê que os países desenvolvidos ajudem financeiramente os países em desenvolvimento a reduzir suas emissões e se adaptar aos impactos das mudanças climáticas. A COP24 insistiu na necessidade de que este financiamento seja "previsível", e convidou os países ricos a elaborarem um relatório sobre esses recursos a cada dois anos, a partir de 2020.
Os países mais pobres esperaram, em vão, gestos fortes envolvendo as promessas das nações ricas de uma ajuda de US$ 100 bilhões anuais (cerca de R$ 392 bilhões) a partir de 2020. Houve, no entanto, alguns anúncios, como US$ 1,5 bilhão (R$ 5,9 bilhões) da Alemanha e US$ 500 milhões (R$ 2 bilhões) da Noruega.
O Banco Mundial também anunciou, no início das discussões, a liberação de 200 bilhões de dólares para apoiar países a tomarem "ações climáticas ambiciosas".
O Acordo de Paris reconhece "a necessidade de se evitar perdas e danos" ligados aos impactos atuais das mudanças climáticas, um ponto que preocupa os Estados Unidos, que temem que isto abra caminho para processos judiciais visando a obter indenizações.
Finalmente, esta menção ficou isolada no acordo, mas sem que esteja sujeita a nenhum tipo de financiamento, como queriam os países vulneráveis.
Em plena revolta popular dos "coletes amarelos" na França, muitos participantes da COP24 haviam defendido assinalar que a transição ecológica deve ser acompanhada de medidas sociais para o conjunto dos cidadãos.
Mas a conferência limitou-se a tomar nota da declaração apresentada pela Polônia, que reconhece a necessidade de se levar em conta esta "transição justa" para com os trabalhadores afetados pelo abandono crescente das energias fósseis.
Para o Fundo Mundial da Natureza (WWF, em inglês), a reunião na Polônia revelou "uma falta de compreensão fundamental" da crise atual vivida pelo planeta por parte de alguns países.
"A ciência deixou claro que só temos 12 anos para reduzir pela metade nossas emissões. Precisamos de que os países se comprometam a aumentar sua ambição antes de 2020", disse Manuel Pulgar-Vidal, porta-voz do fundo.
"Felizmente, o Acordo de Paris está demonstrando ser resistente às tempestades da geopolítica global, por isso que agora precisamos que todos os países se comprometam a aumentar a ambição climática antes de 2020, porque o futuro de todos está em jogo" - Manuel Pulgar, WWF
O Greenpeace assinalou que o acordo de Katowice representa pouco "em relação à necessidade de uma ação mais ambiciosa e urgente, especialmente depois das evidências claras mostradas pela comunidade científica".
A organização ambientalista questionou a "falta de liderança da presidência polonesa (da cúpula)", já que a negociação teve que ser finalmente "salva" pelos negociadores das Nações Unidas.
"Houve uma falta de resposta surpreendente ao relatório do IPCC. Os países não podem se reunir para dizer que não podem fazer mais!", criticou Jennifer Morgan, do Greenpeace International.
Mais crítica foi a coalizão Justiça Climática, que lembrou as palavras da adolescente sueca de 15 anos Greta Thunberg, que durante esta COP24 falou para os delegados, afirmando que "os sofrimentos de muitos vão pagar os luxos de poucos".
O coordenador de Energia Limpa do Movimento Cidadão contra a Mudança Climática, Antonio Zambrano, disse que em Katowice os interesses dos países ricos, "que ignoraram suas obrigações morais e legais, farão com que os países pobres corram sozinhos contra os efeitos da mudança climática".
"Terão que fazer mais e ser mais concretos para convencer os países em desenvolvimento de que seus esforços para a transição ecológica serão apoiados", assinalou David Levai, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais (IDDRI).
"A maior parte do livro de regras para o Acordo de Paris foi criado, o que é algo para se agradecer. Mas o fato de os países terem que ser arrastados e gritados para a linha de chegada mostra que algumas nações não acordaram para o apelo urgente do relatório do IPCC", disse Mohamed Adow, líder internacional em clima da Christian Aid.
O coordenador do programa Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil, André Nahur, ressaltou a importância que o país tem para atingir o grande objetivo do Acordo de Paris e os benefícios diretos que isso pode roporcionar.
"O Brasil tem tudo para se tornar um dos líderes nesse novo mercado de baixo carbono, que já está acontecendo. Com os recursos naturais que nosso país possui, podemos alavancar essa agenda e gerar benefícios econômicos e sociais para toda a população, desde o empresário, que pode investir nessas áreas, até para a população em geral, que terá como resultado uma nova oferta de empregos e mais qualidade de vida", disse.
"Nas circunstâncias atuais, continuar construindo nosso prédio já é um êxito. Até os mais reticentes estão aí", defendeu a ministra espanhola da Transição Ecológica, Teresa Ribera, uma das figuras-chave da negociação.
Riber criticou, no entanto, a falta de ambição dos países, por não se comprometerem a elevar suas metas nacionais de redução dos gases de efeito estufa fixadas em 2015. Segundo o relatório do IPCC, elas não impedirão que a temperatura se eleve em 3°C. "Faltam mensagens que confirmem uma vontade de maior ambição", avaliou a ministra.
Já o presidente da COP24, o polonês Michal Kurtyka, comemorou os resultados. "Foi um longo caminho, não foi uma tarefa fácil. O impacto deste pacote de medidas é positivo para o mundo", afirmou.
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COP 24 elabora regras para Acordo de Paris sob críticas de falta de ambição e impasse sobre recursos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU