13 Fevereiro 2018
Um novo livro de Torneilli e Saleri narra o magistério social do Pontificado de Francisco mediante os grandes temas da atualidade: democracia, globalização, finanças, migrantes e Europa.
A reportagem é de Ugo Magri, publicada por Vatican Insider, 10-02-2018. A tradução é de André Langer.
Com seu gosto pelos paradoxos, o político italiano Massimo D'Alema definiu o Papa Francisco como “o melhor líder da esquerda”, certificando, de alguma maneira, as suspeitas dos conservadores (e não apenas dos católicos) que se opõem ao Sucessor de Pedro “demasiado político” e que o acusam abertamente de populismo, “terceiromundismo” e anti-capitalismo. No mundo midiático que banaliza tudo, impôs-se o clichê do Pontífice pouco concentrado nos dogmas de fé e muito dedicado à denúncia dos males terrenos. Poucos fazem um esforço para compreender e indagar profundamente o que é que sustenta verdadeiramente o Papa. Entre os personagens mais icônicos do nosso tempo, Francisco também é, paradoxalmente, um dos menos conhecidos.
Trata de preencher esta lacuna uma pesquisa que estará disponível nas livrarias italianas a partir desta terça-feira, 13 de fevereiro, publicada pela editora Piemme. Os autores são Pier Paolo Saleri, analista político, e Andrea Tornielli, vaticanista do jornal italiano La Stampa, que conhece a fundo a pessoa e o pontífice Jorge Mario Bergoglio. Quatro anos de encíclicas e discursos são minuciosamente analisados, classificados de acordo com grandes argumentos, estudados para encontrar o fio condutor. A característica comum de todos os textos analisados é uma crítica implacável da avidez convertida em sistema. A única força que agora parece governar o mundo é a busca do lucro, de modo que qualquer manifestação humana é submetida ao “deus dinheiro”. O poder da riqueza foge de todas as regras e, expandindo-se sem controle, determina injustiças que já não é possível ver. Bilhões de seres humanos lançados na miséria pelo egoísmo de poucos. Um ecossistema destruído pela exploração selvagem dos recursos naturais. A paz ameaçada em sua raiz pelos mercadores de armas cada vez mais destrutivas. Os povos culturalmente colonizados pelo “pensamento único” liberal e individualista. De acordo com Bergoglio, a única origem desse mal é a tirania do capital.
No entanto, à medida que avançamos na leitura deste livro, descobrimos que o Papa Francisco não é contra o livre mercado, muito menos contra o capitalismo; talvez seja contra seus excessos, evidentes para todos, principalmente na América Latina (de onde vem) e no chamado “Terceiro Mundo”. O Papa argentino não vê com suspeita os empresários, a quem, além disso, em seus discursos opõe positivamente à especulação financeira, esta sim completamente indiferente ao destino de comunidades inteiras.
O Papa chega a sustentar que “trabalhar bem” é um dever dos empregados, não apenas em troca de um salário. Também faz uma distinção entre uma “boa” globalização, que enriquece os laços entre os povos, e uma “má” globalização, impulsionada pelo “mercadismo” sem escrúpulos. Denunciou sem papas na língua a raiz humana da crise ecológica, concebe que é indispensável parar um crescimento baseado na espoliação do planeta, mas “ninguém quer voltar ao tempo das cavernas”, disse o Papa. Se o inimigo é identificado na “soberba do domínio, da posse, da manipulação e da exploração” da Criação, o aliado não pode ser o ambientalismo ideológico que considera o homem como a causa de todos os males e que propõe como remédio o controle de natalidade. Equivocam-se os animalistas quando comparam todos os seres vivos, negando as hierarquias entre eles. E Francisco, que os tradicionalistas recriminam por não condenar suficientemente os homossexuais, é contra a teoria de gênero.
Em síntese: o Papa quer a justiça social, mas não é marxista; critica o liberalismo selvagem sem ser “não global”; teme pelo meio ambiente, mas não seria apropriado defini-lo como “ambientalista”; está perto dos homossexuais enquanto pessoas, mas se recusa a transformá-los em um modelo; participa da modernidade, mas como antítese ao “pensamento único” de matriz individualista. Seja como for, explicam Tornielli e Saleri, as referências culturais deste Pontificado devem ser procuradas onde seria mais lógico encontrá-las: no Magistério da Igreja e em sua doutrina social que começou com Leão XIII (a Rerum Novarum, de 1891) e que cada um de seus sucessores foi enriquecendo ao longo dos tempos. A polêmica vaticana contra a economia dos lucros é antiga, tanto que, em 1949, Giovanni Spadolini cunhou a feliz definição de “Papado Socialista”.
Francisco não é uma exceção. Em seu magistério, aprecia-se uma crítica do sistema mais estrutural, expressada com uma indignação mais explícita em relação aos seus predecessores. Com um impulso que o leva a inverter o lugar comum da “resignação cristã” diante dos erros do mundo. Uma visão cristã, diz Bergoglio, nunca pode ser passiva ou resignada. De onde o “dever” de cada católico entrar na política. Este dever de dar testemunho das próprias ideias subsiste, embora no mundo já não exista mais um único partido de clara inspiração religiosa. Mais do que isso, de acordo com a visão do Papa Francisco, precisamente por esse motivo e com maior razão.
TORNIELLI, Andrea; SALERI, Pier Paolo. Il denaro non goberna. Politica, economia e ambiente nel pensiero social di Papa Francesco. Milano: Piemme, 2018.
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O Papa Francisco e a política: não governe o dinheiro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU