08 Novembro 2017
O Supremo Tribunal Federal, mais alta instância do poder judiciário brasileiro, vai decidir, nesta semana, se leis e medidas que alteram áreas de preservação ambiental da Amazônia e do restante do Brasil vão contra o que determina a Constituição Federal.
A reportagem é publicada por Terra de Direitos, 07-11-2017.
Na próxima quarta-feira (8), os ministros darão continuidade ao julgamento de quatro ações que apontam que a legislação ambiental conhecida como Código Florestal é inconstitucional.
Na quinta-feira (9), o STF vai avaliar a Medida Provisória 558, que reduz as áreas de proteção da Amazônia. O julgamento já foi iniciado no dia 16 de agosto, mas foi suspenso após o ministro Alexandre de Moraes pedir mais tempo para analisar o processo. Até o momento, apenas a ministra e relatora da matéria, Cármen Lúcia, proferiu seu voto, favorável à inconstitucionalidade da MP 558.
Entenda cada caso:
Código Florestal
Especialistas apontam que o Código Florestal, aprovado em 2012 permite que se deixe de recuperar mais de 29 milhões de hectares que foram desmatados até julho de 2008, e autoriza que outros 88 milhões de hectares sejam desmatados – área que equivale ao tamanho dos países Itália e França, somados. A Constituição Federal do Brasil determina, no entanto, que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado [...] impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
A lei florestal também mudou as regras para a área mínima de reserva ambiental obrigatória para cada propriedade. Além disso, a lei permite que áreas desmatadas podem ser reflorestadas em diferentes estados do país. O advogado Carlos Marés, que faz parte do Conselho da Terra de Direitos, explica que isso é um problema.
O Brasil, pelo seu tamanho, tem regiões com vegetações diferentes, e recuperar uma área não vai ajudar na preservação dos animais e plantas que vivem em outro bioma. Metade das reservas de preservação também podem ter até metade do espaço usado por plantas exóticas, ou seja, que não são naturais do local. O advogado questiona isso. “A Constituição Federal determina a preservação da biodiversidade. E isso só se faz com essências nativas”, fala.
A lei também é criticada por incentivar a financeirização da natureza, já que a preservação ambiental é agora também objeto de valor monetário, como através do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Exemplo disso são a criação de mecanismos de compensação, como Créditos de Carbono e a Cota de Reserva Ambiental, que permite a compra de outra área num mesmo bioma para compensar o desmatamento ou degradação irregular da reserva legal.
Redução de proteção da Amazônia
A MP 558 foi criada em 2012 para alterar o tamanho de três parques nacionais, uma área de proteção e três florestas nacionais. As alterações seriam justificadas para que pudessem ser construídas cinco usinas hidrelétricas que integram o projeto de Aproveitamento Hidrelétrico Tabajara, no Rio Machado, em Rondônia (RO). A MP diminui os limites dos Parques Nacionais da Amazônia, dos Campos Amazônicos e Mapinguari, das Florestas Nacionais de Itaituba I, Itaituba II e do Crepori e da Área de Proteção Ambiental do Tapajós
Tramitando em regime de urgência, a Medida Provisória foi transformada em uma Lei Federal no mesmo ano.
Ainda em 2012, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com o pedido liminar para a suspensão da eficácia e pela declaração da inconstitucionalidade, através da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4717, que será julgada no dia 18.
A Terra de Direitos – organização de Direitos Humanos requereu, então, habilitação na qualidade de Amicus Curiae para informar as condições das disputas territoriais nas Unidades de Conservação objeto da MP 558, e para apresentar as inconstitucionalidades evidentes na tramitação da Medida, além de solicitar a realização de audiência pública para ouvir técnicos e moradores das regiões das Unidades de Conservação para instruir o processo de maneira adequada.
Assessor jurídico da Terra de Direitos e responsável pela sustentação oral na condição de Amicus Curiae na defesa da ADI no julgamento, o advogado Pedro Martins afirma que a proposta de redução das áreas de preservação e a forma com que foi conduzido o processo de aprovação em lei ferem o que está previsto na Constituição Federal, já que a Carta Magna prevê que alterações nos espaços de proteção ambiental devem ser feitas somente através de lei.
O advogado aponta, ainda, que a lei foi proposta e aprovada antes mesmo que houvesse o estudo de impacto ambiental das hidrelétricas do Rio Tapajós e do Rio Machado. As usinas também não chegaram a ser construídas. “Era uma medida que iria envolver áreas atingidas por diversos projetos hidrelétricos, mas a Usina de Tabajara, por exemplo, não saiu do papel. Tramitou em caráter de urgência algo que nem teve o licenciamento concluído”, avalia.
Leia mais
- Amazônia. Verdades e Mitos. Revista IHU On-Line, Nº. 211
- Preservar a Mata Atlântica é melhorar a qualidade de vida da população. Entrevista especial com Mário Mantovani. Revista IHU On-Line, Nº. 505
- Biomas brasileiros e a teia da vida. Revista IHU On-Line, Nº. 500
- A Mata perto de nós e o ativismo ambiental na revolução 4.0
- Código Florestal anistiou 41 milhões de hectares. Entrevista especial com Luis Fernando Pinto
- MP nas mãos de Temer beneficia latifundiários e até prefeito
- Semana do Meio Ambiente: Trump e Ruralistas estragam a festa
- Temer vs. Trump: quem é o maior vilão ambiental global?
- Retrocesso ambiental: urgência em desmatar
- Desmatamento na Mata Atlântica, entre 2015 e 2016, cresce quase 60%, atingindo 29.075 hectares
- Ministério do Meio Ambiente recomenda veto às MP’s 756 e 758
- Senado votará nesta terça Mps que recortam Ucs na Amazônia
- MPs de Temer contra florestas beneficiarão garimpo, grilagem e madeira ilegal
- Congresso abre portas para ampliar desmatamento na Amazônia
- Câmara libera área para exploração na Amazônia equivalente a 3 vezes a cidade de SP
- Congressistas colocam em risco 1 milhão de hectares de floresta no oeste do Pará
- O desmonte da legislação de agrotóxicos e as ameaças para o campo
- Governo Temer quer destruir as conquistas ambientais
- Projeto de lei quer afrouxar licenciamento ambiental no Brasil
- Nova legislação de licenciamento ambiental vai instaurar uma guerra fiscal. Entrevista especial com Mauricio Guetta
- Lei Geral de Licenciamento – PL 3729/2004: propostas de ruralistas são inconstitucionais
- PL do licenciamento enfraquece atuação de órgãos ambientais e pode trazer danos irreversíveis, diz MPF
- A legislação ambiental sob muitos atropelos
- Legislação ambiental está sob forte ataque no Brasil, adverte promotor
- O Brasil está entregando a Amazônia às mineradoras e ao agronegócio
- Atlas revela que latifúndio supera as áreas protegidas
- Agronegócio é o dono das terras do Brasil
- Novo código é retrocesso, dizem ambientalistas
- Filme ‘A Lei da Água – Novo Código Florestal’ está disponível gratuitamente nas plataformas youtube e vimeo
- O novo Código Florestal e o impacto na água. Entrevista especial com José Galizia Tundisi
- Especialista diz que novo Código Florestal retrocedeu na proteção de nascentes
- Código Florestal permite redução de áreas nativas. Entrevista especial com Ricardo Machado
- Desmistificando o Cadastro Ambiental Rural (CAR)
- As falhas e inconsistências do Cadastro Ambiental Rural
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
STF retoma julgamentos que definem rumos da preservação ambiental na Amazônia e no Brasil - Instituto Humanitas Unisinos - IHU