11 Julho 2024
"Portanto, precisamos de proteções éticas: precisamos de algorética. Mas isso deve ser feito com a contribuição concorrente da grande tradição de sabedoria humana que as religiões reúnem e transmitem. O evento AI Ethics for Peace (Ética da IA para a Paz) em Hiroshima reuniu líderes da maioria das religiões do mundo para assinar o Rome Call for AI Ethics. O evento foi promovido pela Academia Pontifícia para a Vida, pela Religions for Peace Japan, pelo Fórum Abu Dhabi para a Paz e pela Comissão para as Relações Inter-religiosas do Grão-Rabinato de Israel", escreve Paolo Benanti, frei franciscano da Terceira Ordem Regular, professor da Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma, e acadêmico da Pontifícia Academia para a Vida, em artigo publicado por Avvenire, 10-07-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Hiroshima é um lugar profundamente simbólico, pois testemunha as consequências de uma tecnologia destrutiva e a necessidade de uma busca duradoura pela paz. À tragédia da bomba atômica é associada a figura de Sadako Sasako, uma criança japonesa que tinha apenas dois anos de idade quando a bomba atômica foi lançada sobre Hiroshima em 06-08-1945. Após a explosão, Sadako não sofreu imediatamente nenhum ferimento visível, mas dez anos depois, em 1954, foi diagnosticada com leucemia induzida por radiação.
Durante sua hospitalização, Sadako começou a fazer cegonhas de papel usando a técnica do origami. Ela se inspirava em uma lenda japonesa segundo a qual aquele que dobrar mil cegonhas teria seu desejo atendido. Apesar da doença e da dor constante, Sadako conseguiu dobrar 1.300 cegonhas antes de morrer em 25-10-1955.
Seu desejo não foi atendido, mas sua determinação e esperança desde então têm servido de inspiração para inúmeras pessoas em todo o mundo. Após sua morte, amigos e colegas de escola iniciaram uma campanha de arrecadação de fundos para construir um monumento em homenagem a Sadako e a todas as crianças vítimas da bomba atômica.
Em 1958, foi inaugurado o Monumento pela Paz das Crianças no Parque do Memorial da Paz de Hiroshima, que retrata Sadako segurando uma cegonha dourada em direção ao céu. O gesto de dobrar cegonhas de papel se tornou um símbolo internacional de paz. Todos os anos, milhões de cegonhas de papel são enviados ao monumento de todo o mundo como um tributo e uma oração pela paz.
Nenhuma outra cidade encarna de forma tão vívida a urgência de garantir que a tecnologia seja uma força para o bem. Essa é uma mensagem central no Rome Call for AI Ethics. Cada um de nós conhece sua própria fragilidade e fraqueza diante dos grandes males que hoje assolam o mundo: somos como folhas de papel, dobradas pela história e pelos eventos das guerras que ainda hoje abalam o mundo. Tecnologias como as inteligências artificiais não fundam nem reduzem a cinzas as estruturas de concreto e tijolos em que vivemos, mas têm potencialmente a capacidade de destruir a própria cola da nossa convivência. As inteligências artificiais generativas podem fundir a nossa capacidade de convivência, podem corroer a nossa confiança no outro e nos transformar em inimigos: fora de qualquer controle ético, as IAs generativas têm o poder de “hackear” o nosso sistema operacional cultural.
Portanto, precisamos de proteções éticas: precisamos de algorética. Mas isso deve ser feito com a contribuição concorrente da grande tradição de sabedoria humana que as religiões reúnem e transmitem. O evento AI Ethics for Peace (Ética da IA para a Paz) em Hiroshima reuniu líderes da maioria das religiões do mundo para assinar o Rome Call for AI Ethics. O evento foi promovido pela Academia Pontifícia para a Vida, pela Religions for Peace Japan, pelo Fórum Abu Dhabi para a Paz e pela Comissão para as Relações Inter-religiosas do Grão-Rabinato de Israel.
Ele contou com a participação de figuras proeminentes, como o Rev. Yoshiharu Tomatsu, presidente da Religions for Peace Japan, Dom Vincenzo Paglia, presidente da Pontifícia Academia para a Vida, Sheikh Abdallah Bin Bayyah, presidente do Fórum Abu Dhabi para a Paz, e do rabino Eliezer Simha Weisz, membro da Comissão para as Relações Inter-religiosas do Grão-Rabinato de Israel. Além dos líderes religiosos, estiveram presentes representantes de grandes empresas de tecnologia, como Microsoft, IBM e Cisco. Amandeep Singh Gill, enviado do secretário geral da ONU para a Tecnologia, e Eriko Hibi, a diretora do escritório de ligação da FAO no Japão, também participaram do evento.
Ao assinar o Rome Call nesse histórico evento multirreligioso, os líderes religiosos reafirmaram seu compromisso de garantir que a inteligência artificial seja usada para o bem da humanidade.
O evento enfatiza a ideia de que enfrentar os desafios postos pela IA exige um esforço coletivo e um trabalho contínuo de todas as partes interessadas, incluindo organizações, governos, empresas de tecnologia e instituições religiosas. Agora, depois da assinatura dos líderes das principais religiões do mundo, o Rome Call for AI Ethics representa simplesmente a maioria das pessoas no planeta. A Call baseia-se em seis princípios fundamentais: transparência, inclusão, responsabilidade, imparcialidade, confiabilidade, segurança e privacidade. Esses princípios são particularmente relevantes no contexto da IA generativa, um campo em rápido desenvolvimento com o potencial de revolucionar muitos aspectos da vida.
O Adendo de Hiroshima, apresentado durante o evento, destaca a importância de aplicar os princípios da Rome Call à IA generativa para garantir sua utilização responsável e ética. Entre outros aspectos, o Adendo enfatiza a necessidade de transparência, afirmando que o que é gerado pela máquina deve ser imediatamente reconhecível como tal. Enfatiza a inclusão, destacando que os instrumentos de inteligência artificial devem respeitar a diversidade das culturas, das tradições e dos idiomas humanos. O compromisso dos signatários da Call vai além da simples declaração de princípios éticos; se estende à responsabilidade para o desenvolvimento e a implementação da IA. Isso inclui a consideração do impacto de longo prazo dessas tecnologias sobre o meio ambiente e a sociedade. Hiroshima reuniu homens de boa vontade de todas as partes do mundo para realizar uma efetiva algorética. Agora cabe a cada um de nós responder a esse empenho global apresentando sua própria contribuição.
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Religiões pela paz. Artigo de Paolo Benanti - Instituto Humanitas Unisinos - IHU