24 Abril 2015
É preciso uma colaboração “mais concreta” da Europa. Precisa “criar as condições” nos países de origem para que o êxodo pare e “construir a paz com mais diálogo”, diz o cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado do Vaticano.
A entrevista é de Giacomo Galeazzi e Andrea Tornielli, publicada pelo jornal La Stampa, 22-04-2015. A tradução é de Ivan Pedro Lazzaroto.
Eis a ntrevista.
Qual é a sua primeira reação frente ao drama dos últimos dias?
É uma grande tragédia. Nos últimos anos aconteceram tantos episódios desse tipo, mas de fato este tem uma dimensão que dá arrepios. Quantas pessoas que buscavam a salvação fugindo da situação de pobreza e violência, encontraram a morte no fundo do mar: é algo que realmente assusta. A minha reação é de muita dor.
Quais as esperanças da Santa Sé?
Essa enésima tragédia pede que todos assumam sua responsabilidade, não podemos permanecer indiferentes. Devemos agir: o Papa lembrava no discurso de sábado ao Presidente da República Mattarella, agradecendo a Itália por tudo que tem feito e falando que é preciso realmente de um envolvimento geral, principalmente da Europa.
A União Europeia deve considerar as costas italianas como suas?
Acredito que a Europa deva se encarregar de um problema que não é somente italiano ou que é inicialmente italiano porque somos os mais próximos da costa africana, mas o fenômeno migratório interessa a todos. Um país apenas não será suficiente para dar respostas satisfatórias.
A Europa têm consciência dessa responsabilidade?
Acredito que tenha essa consciência, foram dados passos à frente, mas agora é preciso que a colaboração seja mais precisa e muito mais concreta.
O que é preciso fazer, além da emergência de salvar vidas?
Acredito que nos países de origem devem ser criadas condições que permitam que os migrantes fiquem em seus países e não favoreçam o êxodo. Quebrar toda a rede de traficantes. Este é um dos pontos fundamentais: existem pessoas que ganham especulando sobre a vida de muitos inocentes.
Qual a contribuição que a Igreja pode dar?
Além de toda a obra de promoção social que favoreça as condições das quais eu falava, acredito que a Igreja poderia fazer também uma obra de convencimento maior, conscientizando as pessoas sobre os graves riscos que estes refugiados enfrentam. Fiquei abalado com as entrevistas de alguns sobreviventes: alguns pensavam que o Mediterrâneo fosse apenas um rio. Muitos não sabem o que vão encontrar ou que foram enganados.
Fica o fato de que as pessoas fogem de situações difíceis...
São criadas essas condições para que não se produzam mais tais fluxos migratórios. Existe ainda o grande tema da paz: em muitos casos são pessoas que fogem de zonas de guerra. E então o problema dos migrantes está ligado ao esforço da diplomacia internacional para encontrar soluções pacíficas aos conflitos.
Há quem acuse a Santa Sé de insistir em demasia sobre soluções diplomáticas. Como a Igreja responde?
Estamos convictos: frente aos conflitos que se multiplicam no planeta, precisa-se de mais diálogo, não menos. De fato o diálogo não é uma solução mágica, é preciso ao menos que se tenha vontade de dialogar. Provavelmente essa vontade não está em todos, porém acreditamos que não existam outros caminhos para resolver os problemas do nosso mundo.
A insistência com que o Papa fala do tráfico de armas e dos interesses econômicos por trás das pessoas o surpreende?
Não me surpreende, toca num ponto importante: existem muitos interesses materiais em jogo que seguidamente prevalecem. Me parece que o Papa mostra um grande realismo.
O senhor é de origem Vêneta, nesse ideal também se difundem posições de fechamento para com os imigrantes. Como o senhor vê isso?
Existe um trabalho de regulamentação dos fluxos migratórios que atinge as autoridades, não se pode dizer que sempre irá bem. A legalidade deve ser cultivada e promovida por todos. Não acredito porém que certas soluções de fechamento irão solucionar o problema: a história nos mostrou. Os muros criaram ainda mais ódio, mais contraposições e mais conflitos. Podem parecer eficazes a curto prazo, mas não levam à paz. Eu espero que os vênetos continuem também, nessas situações de emergência, manifestando seu espírito de solidariedade e acolhimento que sempre os caracterizou.
Até porque muitos vênetos emigraram...
Sim, carregam consigo todas as dificuldades das migrações. O problema é que seguidamente esquecemos de nossa história. E talvez depois de sessenta anos de paz e bem-estar muitos não pensem que os seus pais ou seus avós sofreram pelas mesmas razões que hoje movem tantas pessoas à procura de trabalho, de paz, de progresso.
Pela experiência que o senhor tem da Itália, o aspecto de acolhimento prevalece?
Acredito que sim, a Itália tem muitos recursos. Ainda que a secularização avance, existe ainda um sentido de fé. Temos necessidade de sermos mais reflexivos, sem reagir superficialmente, reencontrando os valores que ainda permanecem na sociedade e no coração dos italianos.
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“Por uma Europa mais concreta, somente a paz irá evitar os mortos”, afirma Vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU