05 Agosto 2014
“Em princípio não há nenhuma demanda da sociedade brasileira para este tipo de atividade. Os interesses nesse ramo estão ligados a grandes grupos internacionais, tanto mineradoras quanto empresas que fabricam máquinas para o setor. Trata-se, portanto, da busca de maior lucratividade para essas empresas”, adverte o pesquisador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – Ibase.
Foto: marsemfim.com.br |
Com o lançamento das bases para a extração de minérios no fundo do mar, em 2013, pela Autoridade Internacional do Leito Oceânico, órgão da ONU responsável pelo controle da mineração nos oceanos, o Brasil pediu autorização para iniciar pesquisas relativas à extração no subsolo do Oceano Atlântico. De acordo com Carlos Bittencourt, em entrevista concedida à IHU On-Line, por email, o Serviço Geológico do Brasil - CPRM “conseguiu autorização para pesquisar e explorar uma área de três mil quilômetros quadrados em águas internacionais. Trata-se de uma região conhecida como Elevação do Rio Grande, localizada a 1,5 mil quilômetros da costa do estado do Rio de Janeiro”.
As extrações de minério no subsolo dos oceanos estão previstas para iniciar em 2016, mas, por enquanto, “as informações sobre os verdadeiros potenciais dessa área ainda são limitadas e encontram-se sob controle do CPRM”. Nos últimos quatro anos, o Brasil já investiu R$ 60 milhões em pesquisas no Atlântico Sul e para este ano estão previstos mais de R$ 20 milhões. Bittencourt explica que “um dos interesses mais importantes nesse novo ramo são as terras raras, minerais de alto valor no mercado. Sabe-se que pode haver terras raras nessa região que o Brasil pretende explorar. Trata-se de um complexo de montanhas de até 3.200 metros de rochas continentais, em uma profundidade de 4.200 metros”.
Entretanto, pontua, “ainda há muita incerteza sobre isso. Não há atualmente em curso mineração de grande escala sendo realizada. É uma fronteira muito nova e o desconhecido ainda prepondera. A pesquisa feita em 2013, da Elevação do Rio Grande, foi feita por um submarino japonês. Apesar dos investimentos no setor, acredito que o Brasil ainda não detenha as condições para realizar este tipo de mineração”.
Carlos Bittencourt é historiador e pesquisador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – Ibase.
Confira a entrevista.
Foto: mundogeo.com |
IHU On-Line - Em que consiste a permissão que o Brasil obteve da ONU para explorar minério em fundo do oceano Atlântico?
Carlos Bittencourt - Em 2013, a Autoridade Internacional do Leito Oceânico (ISA, na sigla em inglês), o órgão da ONU que controla a mineração nos oceanos, realizou um estudo técnico no qual lançava as bases para o início da mineração no fundo do mar. O estudo prevê que em 2016 já seria possível iniciar os processos de extração de uma grande gama de minerais do subsolo dos oceanos.
Diante disso, diversos países já iniciaram os pedidos de pesquisa à entidade. O Brasil está entre estes países. O Serviço Geológico do Brasil - CPRM conseguiu autorização para pesquisar e explorar uma área de três mil quilômetros quadrados em águas internacionais. Trata-se de uma região conhecida como Elevação do Rio Grande, localizada a 1,5 mil quilômetros da costa do estado do Rio de Janeiro.
Como se trata de área internacional e de atividade de fronteira tecnológica, com riscos significativos, reconhecidos pelo estudo elaborado pela ISA, a regulação será feita pelo órgão internacional.
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“Possivelmente, a variedade de minérios existentes no oceano seja tão extensa quanto a que existe no subsolo de nosso continente.” |
IHU On-Line - De acordo com a imprensa, o país terá o direito de atuar por 15 anos em uma área de três mil quilômetros quadrados na região do Atlântico conhecida como Elevação do Rio Grande, localizada a cerca de 1,5 mil km do Rio de Janeiro. Quais são as características dessa região em relação a minérios?
Carlos Bittencourt - As informações sobre os verdadeiros potenciais dessa área ainda são limitadas e encontram-se sob controle do CPRM. Houve investimento específico do Plano de Aceleração do Crescimento relacionado com o desenvolvimento dessa pesquisa, e o Brasil vem buscando construir parcerias com outros países para aprofundar esse Know-how. Nos últimos quatro anos foram investidos cerca de R$ 60 milhões em pesquisas no Atlântico Sul. Para este ano estão previstos mais de R$ 20 milhões.
Um dos interesses mais importantes nesse novo ramo são as terras raras, minerais de alto valor no mercado. Sabe-se que pode haver terras raras nessa região que o Brasil pretende explorar. Trata-se de um complexo de montanhas de até 3.200 metros de rochas continentais, em uma profundidade de 4.200 metros.
IHU On-Line - Como será feito o processo de mineração submarina no país? Já é possível estimar quais são os órgãos e empresas envolvidos neste processo?
Carlos Bittencourt - Ainda há muita incerteza sobre isso. Não há atualmente em curso mineração de grande escala sendo realizada. É uma fronteira muito nova e o desconhecido ainda prepondera. A pesquisa feita em 2013, da Elevação do Rio Grande, foi feita por um submarino japonês. Apesar dos investimentos no setor, acredito que o Brasil ainda não detenha as condições para realizar este tipo de mineração.
Na minha opinião, é necessário iniciar todo um processo de regulamentação da atividade. Portanto, a primeira iniciativa a ser tomada é a construção de um debate público sobre o tema. A sociedade brasileira deve ser convidada a decidir sobre a necessidade ou não de mergulharmos nessa arriscada empreitada. Em seguida, deve haver um processo de regulamentação dos resultados desse debate, através de legislação própria, especialmente relativa às questões ambientais.
IHU On-Line - O Brasil já desenvolve mineração submarina? Como e em que consiste esse processo de extração? Pode nos dar alguns exemplos de países que atuam nessa área?
Carlos Bittencourt – Não, o Brasil ainda não desenvolve essa prática. Não sou especialista nesta questão, mas, pelo que tenho lido, trata-se da retirada de nódulos de rocha do fundo do oceano para serem beneficiados, separando os minérios dos rejeitos, na superfície.
O primeiro e, até agora, único país que assinou com uma empresa um contrato para o início da extração de minérios do fundo do mar foi a Papua Nova Guiné. O projeto visa extrair minérios de cobre, ouro e outros metais valiosos a partir de uma profundidade de 1.500 metros, em parceria com uma empresa canadense.
A mina "Solwara-1" será escavada por máquinas robóticas controladas por um navio. A maior máquina, um cortador de massa pesando 310 toneladas, foi finalizada em abril deste ano. O plano consiste em romper a camada superior do fundo do mar de modo que o minério possa ser bombeado para cima como uma lama. A extração está prevista para começar em 2019.
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“A sociedade brasileira deve ser convidada a decidir sobre a necessidade ou não de mergulharmos nessa arriscada empreitada.” |
IHU On-Line - Quais os interesses do Brasil com esse tipo de extração? Que minérios se pretende encontrar no oceano Atlântico?
Carlos Bittencourt - Em princípio não há nenhuma demanda da sociedade brasileira para este tipo de atividade. Os interesses nesse ramo estão ligados a grandes grupos internacionais, tanto mineradoras quanto empresas que fabricam máquinas para o setor. Trata-se, portanto, da busca de maior lucratividade para essas empresas.
Possivelmente, a variedade de minérios existentes no oceano seja tão extensa quanto a que existe no subsolo de nosso continente.
IHU On-Line - Quais são as vantagens econômicas desse tipo de extração para o Brasil?
Carlos Bittencourt - Em princípio, pesando os custos, os riscos e os possíveis benefícios, eu não consigo ver qualquer vantagem. No momento em que vários países do mundo avançam no sentido de impor limites à atividade extrativa mineral por conta de seus graves impactos socioambientais; quando, mesmo no Brasil, a sociedade civil cada vez mais busca discutir maneiras de melhor planejar e controlar o setor, me parece que abrir uma nova e tão controversa fronteira não traz vantagem alguma.
IHU On-Line - Há implicações ambientais nesse tipo de extração submarina de minérios?
Carlos Bittencourt - Claro que há. Trata-se de revolver o fundo dos oceanos, de destruir a superfície dos fundos dos mares afetando um conjunto de ecossistemas frágeis e pouco estudados, como complexos de corais, fluxos de águas hidrotermais e ainda toda uma gama de espécies marinhas que ali vivem. Mas como tanto o fundo do mar quanto as tecnologias para explorá-lo são bastante desconhecidos, é preciso aplicar o princípio da precaução e impedir a realização destes empreendimentos, pelo menos até que se tenha clareza sobre seus possíveis impactos, o que pode demorar muito tempo.
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Extração de minério no Atlântico: “Abrir uma nova e tão controversa fronteira não traz vantagem alguma”. Entrevista especial com Carlos Bittencourt - Instituto Humanitas Unisinos - IHU