Por: Jonas | 31 Outubro 2012
Embora não faça campanha, a ex-presidente socialista Michelle Bachelet continua liderando as pesquisas para um novo período no Palácio de La Moneda. O atual partido do Governo perdeu bastiões emblemáticos para a oposição.
A reportagem é de Christian Palma, publicada no jornal Página/12, 30-10-2012. A tradução é do Cepat.
A expressão dos líderes da direita chilena diziam tudo. Na noite de domingo, nas eleições municipais – consideradas a antessala das presidenciais –, haviam sido vencidos pela oposição em diversas comunas emblemáticas e, desta vez, os temores de perder o governo foram acrescidos com uma base inegável nas urnas. Os olhos vermelhos não puderam ser dissimulados.
Com essa carga nas costas, e embora surrados pelas derrotas, principalmente em Concepción, Providencia e Santiago, ontem, os presidentes dos partidos ligados ao governo de Sebastián Piñera (União Democrática Independente e Renovação Nacional) chegaram a participar de uma reunião política no Palácio de La Moneda. Na saída, o presidente da Renovação Nacional, o senador Carlos Larraín, disse que o quanto antes deve haver, com os candidatos, uma primária partidária. Isto para definir os atuais ministros que poderiam lutar pela presidência, em 2014, e por uma cadeira no Congresso. “Agora, abre-se uma verdadeira temporada política. As municipais são municipais, simples”, disse, tirando o corpo do desastre de domingo.
Em todo caso, assegurou que “agora vem um processo de lamber as feridas. Estou com o metabolismo um pouco baixo, mas fora disso não estamos diante de nenhum desastre. Ou seja, é um retrocesso eleitoral, mas não para perder a compostura”, disse meio na brincadeira e meio sério.
É que na direita o fantasma de Bachelet ganhou mais força, pois sem fazer campanha continua liderando as pesquisas para um novo período no Palácio de La Moneda. Quanto mais o governo cai, mais sobe a sua opção, por mais que ela não tenha declarado publicamente suas intenções de voltar ao Chile.
Outro fenômeno constatado no domingo foi a elevada abstenção na estreia do sistema voluntário no Chile. Simplesmente 57% não foram votar. Nesse sentido, Piñera chamou à reflexão. “Pela primeira vez tivemos inscrição automática e voluntária. A liberdade sempre significa direito, mas também deveres”, disse. Segundo diversos analistas, a elevada abstenção golpeia não apenas a direita, mas a classe política em geral, que não foi capaz de ler a realidade do país e entender as novas demandas da cidadania. Este fato, por mais que a oposição se alegre, mantém em suspenso o que ocorrerá em dois anos.
O que está claro é que a jornada dominical trouxe várias surpresas. Uma delas ocorreu na emblemática comuna de classe média de Santiago: Ñuñoa. Nesta, a neta de Salvador Allende, Maya Fernández, derrotou Pedro Sabat, homem próximo ao regime de Pinochet e que governava há dezessete anos. Filha de Beatriz “Tati” Allende, a filha mais política do ex-presidente, recebeu a ligação de Michelle Bachelet, de Nova York, para felicitá-la pelo triunfo, como fez com as prefeitas eleitas Josefa Errázuriz (Providencia, que derrotou ao ex-militar Cristián Labbé) e Carolina Tohá (Santiago, que derrotou Pablo Zalaquett).
“A ex-presidente Bachelet me ligou. Felicitou-me. Acompanhou com muita atenção nossa campanha e eu também fui super honesta: ‘Presidente, a forma de fazer política mudou’”, destacou Errázuriz. Ela detalhou que durante o diálogo disse a Bachelet que “Providencia deu um exemplo” de como conjugar virtuosamente o papel da sociedade civil com os partidos políticos. Enquanto que Carolina Tohá (cujo pai faleceu por coerções recebidas em plena ditadura) destacou que “foi a primeira ligação que recebi. Muito contente, muito carinhosa. Nós duas estávamos felizes. Foi dessas conversas eufóricas, de maneira que não tivemos tempo de aprofundar em nada a mais do que a sua felicitação”.
Na outra vereda, o vice-presidente da Renovação Nacional, Manuel José Ossandón, insistia em atribuir a derrota aos erros próprios. “Há um ano, eu adverti sobre a calamidade que se via nos municípios. Os resultados foram ruins, apesar de muitos tratarem de justificar o injustificável (...). Eu acredito que demos um bônus para a centro-esquerda, que acredito que não o mereça porque também fizeram muito mal, porém mais do que tudo nos deram um bônus de castigo. Aqui, a Concertación não venceu, nós mesmos perdemos, e há uma tremenda responsabilidade do Governo também”, enfatizou.
O dirigente também fustigou uma das peças do partido, o ministro de Obras Públicas Laurence Golborne (conhecido pelo resgate dos mineiros). “Golberne estava fazendo sua campanha (...), não estava buscando votos para os candidatos, mas criando laços”, disse, abrindo ainda mais as feridas.
A verdade é que a queda da direita começou no ano passado com as mobilizações sociais, principalmente dos estudantes, que puseram em cheque o Governo e seus prefeitos. Frases de Zalaquett e Labbé (o primeiro ameaçou em colocar os militares na rua para frear as marchas, e o segundo acusou um colégio, tomado por mulheres, de “puteiro”) passaram da conta.
Não é tudo. Também obriga os políticos a redobrarem o esforço para entrar em sintonia com as pessoas, pois este governo prometeu mudar as coisas e dedicou-se apenas a manter o que existe. Aqui, mais do que decepção pelo voto em Piñera, há arrependimento. O mal-estar da rua se instalou nas urnas e aí sim bate forte, isto a Concertación já soube, em 2010, quando perdeu a presidência. Agora, a direita também já sabe.
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Quanto mais a direita cai, mais Bachelet sobe - Instituto Humanitas Unisinos - IHU